Associação criminosa

Em audiência, advogados de ativistas reclamam de violações às prerrogativas

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16 de dezembro de 2014, 21h28

Giselle Souza
A primeira audiência de instrução e julgamento  do processo contra 23 ativistas acusados de planejar ações criminosas em protestos no Rio de Janeiro foi marcada pela troca de farpas entre a defesa, a acusação e até o juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal da Capital, onde tramita a ação.

A delegada Renata Araújo dos Santos, responsável pelo inquérito que deu origem ao processo, foi a primeira das 10 testemunhas de acusação arroladas a prestar depoimento.

Ela reiterou a culpa do grupo pelo crime de associação para a prática criminosa. A delegada afirmou que a as ações criminosas eram deliberadas por um grupo restrito, liderado por Elisa Quadros Pinto Sanzi, a Sininho. Ela está foragida. “Nem todas as pessoas que iam para as manifestações sabiam que iriam ocorrer atos criminosos”, afirmou a delegada.

Renata acusou Elisa de incitar os manifestantes a praticarem atos violentos durante os protestos — inclusive ela teria estimulado os ativistas a atearem fogo na Câmara dos Vereadores no ato que ficou conhecido como Ocupa Câmara, no ano passado. Não houve, no entanto, qualquer incêndio no ato.

A delegada relatou ainda a mobilização do grupo para “o grande evento” do “junho negro” — uma manifestação marcada para ocorrer na final da Copa do Mundo.  Antes da data para a qual o ato estava marcado, investigações da Polícia levaram à prisão preventiva dos suspeitos, assim como a apreensão de bombas e coquetéis molotovs, preparados pelo grupo e que seriam utilizados no protesto.

Segundo a delegada, os manifestantes evitavam falar sobre a manifestação por telefone e quando o faziam, usavam códigos tais como “livros, canetas e paradas” para se referirem a artefatos explosivos. Mas isso mudou quando o material foi apreendido. De acordo com a delegada, a partir desse momento, Elisa passou a ser clara nas ligações.

Ânimos elevados
A inquirição da testemunha de acusação pela defesa elevou os ânimos da audiência de instrução e julgamento dos ativistas. O advogado Marino D'Icarahy, que defende o filho Igor D'Icarahy, um dos réus do processo por associação criminosa, questionou a delegada sobre o motivo de o resultado das investigações referentes ao ato que ocorreria na Copa do Mundo ter sido incluído no mesmo inquérito que apurava as depredações e atos violentos ocorridos na manifestação de julho do ano passado.

“O crime é de associação criminosa é permanente. Não tenho culpa se o senhor não conhece o Direito Penal”, respondeu a delegada, indignada por outra afirmação do advogado de que a Polícia teria em curso outro inquérito, oculto para a defesa.

À sequência do depoimento de Renata ouviam-se as risadas dos acusados e familiares que acompanhavam à audiência. O juiz os advertiu, mas os risos continuaram. Itabaiana irritou-se e determinou a retirada de todos. Autorizou apenas a presença da imprensa. “Aqui não tem palhaço. Não podem ficar rindo”, afirmou o juiz. O grupo saiu fazendo protesto e afirmando que não autorizava o uso de sua imagem.

A defesa prosseguiu a inquirição sustentando que a Polícia tentara transformar “uma associação de pessoas por uma ideologia política em uma associação criminosa”. Diante das longas e inúmeras perguntas, feitas quase que ao mesmo tempo, a delegada disparou: “O senhor pode ficar quieto?”.

Nesse momento, os advogados suscitaram questão de ordem ao juiz para que intercedesse a favor do advogado. Mas ele apenas respondeu: “O senhor não está deixando que ela termine de falar”.

Os protestos continuaram, os advogados alegaram violação às suas prerrogativas, mas o magistrado encerrou a questão: “Quem preside a audiência aqui sou eu. Ela irá respeitá-lo, se o senhor respeitá-la”.

D'Icarahy finalizou sua intervenção perguntado a delegada se era crime um grupo querer desestabilizar um governo por não concordar com ele. A testemunha respondeu: “É crime querer tacar bomba”.

A primeira audiência dos ativistas foi marcada por manifestações. Na porta do fórum, aproximadamente 30 pessoas, acompanhadas pela Polícia Militar, faziam uma manifestação a favor da absolvição do grupo.

Pouco antes de a sessão começar, Caio Silva, Fábio Raposo e Igor Mendes, únicos ativistas que se encontram presos, entraram na sala exibindo as algemas e gritando “não passarão”. O juiz exigiu o fim da gritaria.

Habeas Corpus
Enquanto a primeira audiência do processo por associação criminosa acontecia na 27ª Vara Criminal, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro julgava um Habeas Corpus impetrado pela defesa de Elisa, Karlayne Moraes e Igor Mendes para revogar a prisão preventiva imposta a eles por terem participado de uma manifestação na Cinelândia, em desobediência a uma determinação anterior da Justiça. As duas acusadas estão foragidas. Mendes está preso. Por maioria, o colegiado negou liberdade ao trio. Ficou vencido o desembargador Siro Darlan.

Processo na 27ª Vara Criminal: 0229018-26.2013.8.19.0001.

Clique aqui para ler o voto do desembargador Siro Darlan na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

 

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