Ausência de vítima

Beber durante a gravidez não é crime, decide Corte de Apelação da Inglaterra

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4 de dezembro de 2014, 11h30

A Corte de Apelação da Inglaterra decidiu que a gestante que consome álcool e provoca sequelas graves no seu bebê não comete nenhum crime. É que, pelas leis inglesas, o feto não é uma pessoa separada da sua mãe. Enquanto está na barriga, ele é parte da grávida e não pode ser considerado vítima de algo feito por ela. A decisão evita que seja aberto um precedente capaz de responsabilizar todas as mulheres que bebem, fumam e consomem drogas durante a gravidez e prejudicam o desenvolvimento do feto.

O julgamento foi anunciado nesta quinta-feira (4/12) e, provavelmente, não deve encerrar a questão. O caso ainda deve chegar à Suprema Corte do Reino Unido e, com grandes chances, à Corte Europeia de Direitos Humanos.

A Corte de Apelação julgou o recurso de uma menina de sete anos, representada pelo Conselho Tutelar da cidade onde mora. O caso tramita na esfera cível, já que trata-se apenas do reconhecimento da criança como vítima de crime e do seu direito à indenização, mas poderia levar a mãe a sentar no banco dos réus.

A criança, que teve sua identidade preservada, nasceu em 10 de junho de 2007 e foi diagnosticada com a chamada síndrome alcoólica fetal. A doença provoca má-formação na face, em órgãos como rim e pulmão e dados cerebrais permanentes. A causa é o consumo excessivo de álcool pela gestante. Hoje, a menor vive sob tutela do Estado.

Segundo o processo, a mãe era usuária de drogas, mas largou o vício durante a gestação. Manteve, no entanto, o consumo de álcool, mesmo sendo advertida por médicos e até assistentes sociais de que a bebida provocaria danos irreversíveis no seu bebê. Ela chegou a frequentar um programa público para ajudar a largar a bebida, mas não teve resultado.

Em 2011, um tribunal administrativo reconheceu que a menor tinha sido vítima de violência e tinha direito de receber indenização do fundo estatal destinado a indenizar vítimas de crimes. A decisão, no entanto, foi derrubada em dezembro do ano passado pela segunda instância administrativa (clique aqui para ler, em inglês).

A discussão principal gira em torno de estabelecer se um feto pode ser considerado uma pessoa e, portanto, ser vítima de violência. Na primeira instância, o juiz considerou que sim e enquadrou o caso no crime de envenenamento. Mas, para o tribunal de segunda instância, a jurisprudência no país é clara no sentido de que feto não é indivíduo e não pode ser vítima de crime. Por esse entendimento, a menor só teria direito à indenização se tivesse sofrido algum dano após o seu nascimento, e não antes disso. Foi essa a posição adotada pela Corte de Apelação nesta quinta-feira (4/12).

Clique aqui para ler a decisão em inglês.

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