Propriedade do povo

Concessionária de rodovia não pode cobrar por uso de faixas de domínio

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23 de agosto de 2014, 10h31

As faixas de domínio público das rodovias, embora sejam propriedade da União, são bens de uso comum do povo. Assim, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal, é proibido cobrar qualquer valor por sua utilização. O entendimento levou a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a manter sentença que declarou nulo o contrato de exploração onerosa da faixa de domínio entabulado entre a permissionária da rodovia BR-290 e uma empresa de telecomunicações.

Embora a ação trate de rodovia sob concessão federal, a competência foi atraída para a Justiça comum estadual em face da falta de manifestação da União.

Para o relator da Apelação, desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, como a utilização da faixa de domínio, neste caso, reverte em favor da coletividade, por se tratar de serviço público de telecomunicação, não cabe a cobrança de qualquer valor. É que a concessionária da rodovia não tem o ‘‘poder de polícia’’, como a Administração Pública, tal como define o artigo 78 do Código Tributário Nacional (CTN).

Assim como o juízo de primeiro grau, o relator concordou que, em se tratando de servidão administrativa, para instalação de equipamentos no subsolo, o pagamento de indenização a particular só seria admitido em caso de efetivo prejuízo ao seu proprietário — o que não ocorreu no caso concreto. A decisão monocrática foi proferida na sessão de julgamento ocorrida dia 3 de julho.

O caso
A TNL PCS S/A informou na inicial da ação ordinária que presta serviços de telecomunicações nos municípios de Osório, Santo Antônio da Patrulha, Glorinha, Gravataí, Cachoeirinha e Porto Alegre. Para interligá-los com as demais redes de comunicação, se vale de cabos que passam pelas margens da rodovia BR-290, administrada pela Concessionária da Rodovia Porto Alegre-Osório (Concepa).

Em função desta necessidade, a autora teve de firmar contrato com a permissionária da rodovia, prevendo remuneração pelo seu uso, já que era a única alternativa para exploração do serviço de telefonia. Pediu a declaração de nulidade do contrato de permissão onerosa de uso e da cláusula arbitral, bem como a declaração de direito ao acesso às faixas da rodovia.

Na contestação, a Concepa requereu a extinção da ação, já que o contrato entre ambos contém cláusula que prevê a arbitragem como forma de resolução do conflito, destacando ser insuperável a via arbitral. Em síntese, discorreu sobre pacta sun servanda — brocardo latino que significa, em tradução livre, ‘‘os contratos devem ser respeitados’’.

Sentença
A juíza Elisabete Maria Kirschke, da 2ª Vara de Santo Antônio da Patrulha, derrubou a alegação de incompetência da Justiça para dirimir o conflito em função de existência de cláusula arbitral. Para ela, o caso versa sobre bem de uso comum do povo — serviços de telecomunicações —; logo, de interesse difuso. Além disso, o árbitro só poderia solucionar eventual litígio nos termos do contrato entre particulares, nunca eventual nulidade.

Conforme registrou na sentença, o Supremo Tribunal Federal já assentou entendimento, em repercussão geral (Recurso Extraordinário 581.947), de que é proibida a cobrança de taxa ou qualquer contrapartida, pelo uso e ocupação do solo e do espaço aéreo em faixas de domínio de vias públicas, de equipamentos necessários à prestação de serviço público. Assim, reconheceu o direito da autora de acessar as faixas de domínio da rodovia, no trecho administrado pela ré, para instalar e realizar manutenção dos equipamentos, sem o ônus de pagar qualquer tipo de remuneração.

‘‘Segundo ainda o citado precedente, a cobrança de retribuição pela instalação ou utilização de equipamentos, necessários à prestação do serviço público de telefonia nas faixas de domínio de vias públicas, usurpa a competência exclusiva da União para explorar o serviço de telecomunicações (art. 21, XI, CF) e privativa para legislar sobre a matéria (art. 22, inciso IV, CF)’’, escreveu na sentença.

Assim, a juíza deu total procedência à demanda, declarando nulo o contrato de permissão onerosa e reconhecendo o direito de uso as faixas de domínio daquela rodovia para os trabalhos de telefonia, sem o pagamento de qualquer valor. Também deferiu o pedido de antecipação de tutela, para impedir que a Concepa crie embaraços ou venha a exigir qualquer importância que onere ou impeça os trabalhos de telefonia naquele trecho.

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