Judicialização da vida

"Só tema chinfrim não pode ser levado ao Supremo", critica Barroso

Autor

9 de agosto de 2014, 4h11

Gervásio Baptista/SCO/STF
“A Constituição brasileira só não traz a pessoa amada em três dias, mas, fora isso, quase tudo está lá”, brincou o ministro Luís Roberto Barroso (foto) diante de uma jovem plateia de estudantes no pátio da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Em pé, com parábolas e piadas, o integrante do Supremo Tribunal Federal abordou a judicialização da política e da vida em debate promovido nesta sexta-feira (8/8) pelo Centro Acadêmico XI de Agosto.

O ministro afirmou que a “Constituição excessivamente abrangente” do Brasil amplificou a procura pelo Judiciário e permitiu que quase qualquer assunto seja levado ao STF. “É preciso que um tema seja muito ordinário, muito ‘chinfrim’, para não se conseguir que um dos muitos legitimados do artigo 103 queira levar a matéria ao Supremo”, disse, em referência ao dispositivo que enumera quem pode apresentar Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória de Constitucionalidade na corte.

Diante disso, Barroso defendeu que o STF deve estabelecer critérios qualitativos e quantitativos para avaliar o que vai julgar de forma mais célere, e propôs que a corte adote uma agenda pública semestral, com os casos mais relevantes que serão colocados em pauta.

Também disse que o Supremo deve, como linha de princípio, manter as normas do Executivo e do Legislativo, mas atuar diretamente para proteger direitos fundamentais e valores constitucionais em caso de omissões ou brechas, como quando proibiu o nepotismo, legitimou uniões homoafetivas e deu aval para a interrupção da gestação de fetos anencefálicos. Para ele, o ativismo judicial “é um modo pró-ativo de interpretar a Constituição para levar os seus princípios às situações que não foram expressamente previstas pelo legislador ordinário” — ato que, "como o colesterol", disse o ministro, pode ser bom ou ruim.

Sobre conflitos judiciais que tentam obrigar o poder público a custear remédios e tratamentos, o ministro afirmou que a Justiça, em geral, deve adotar apenas decisões que possam ser universalizadas, valendo para todas as pessoas que em igual situação. Ainda segundo ele, juízes não podem se pautar pela própria vontade, nem temer quando contrariam multidões.

Barroso disse ainda ser contrário à eleição de juízes em qualquer instância. “Não consigo imaginar o que um juiz pode oferecer de diferente além de ser honesto, trabalhador e célere na medida do possível. Seria uma catástrofe no Brasil”, afirmou, apontando que os candidatos dependeriam de nichos ideológicos e financiadores. Também afirmou não ver problema na escolha de ministros do Supremo pela Presidência da República.

Nova direção
Às vésperas da oficialização do ministro Roberto Lewandowski como presidente da corte, Barroso disse à revista Consultor Jurídico que o colega é uma “pessoa preparada” e “vai fazer uma boa gestão”. Afirmou ainda que a presidência do ministro Joaquim Barbosa foi “muito atípica”, por ter sido marcada pelo julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão.

Na saída da palestra, já fora do Largo de São Francisco, um cidadão que o reconheceu questionou por que ele havia autorizado, na véspera, que José Genoino cumprisse pena em regime aberto. “Fiz o justo, com base em parecer do Ministério Público e informação da juíza da Vara de Execução Penal. O direito desse réu e de outros à progressão de regime não é uma criação minha. Cumpri a lei”, afirmou.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!