Blindagem patrimonial

Lei que regula a recuperação judicial apresenta sérias falhas

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23 de abril de 2014, 11h36

A lei 11.101/05, quase prestes a completar uma década, segundo entendimento comum, apresenta sérias falhas, as quais comprometem, e muito, o sucesso do plano de recuperação, mantendo estatística de menos de 10% em torno das empresas efetivamente recuperadas.

Coube ao legislador, cuja comissão participamos por mais de uma década, sob ingerência do governo, e de órgãos internacionais, o saudoso Osvaldo Biolchi, mapear as coordenadas para votação e aprovação da lei.

Naquele cenário no qual se desenvolvia a economia e se gestava sua forma globalizada, já não mais tinha serventia o diploma, Decreto-lei 7.661/45, ousando-se, com alguma timidez, por mais paradoxal que possa parecer, na concepção de uma lei de recuperação sensível à atividade empresarial nacional.

Dias atrás, chegou-nos interessante caso, cujo juízo de origem sobrestou, sine die, o andamento da execução singular contra devedores solidários avalistas.

Ao ser julgado, por primeiro, monocraticamente, o agravo de instrumento da casa bancária, a ele foi dado parcial provimento, limitando a suspensão das ações e execuções pelo prazo de 180 dias, abrangendo os sócios da sociedade empresária.

Evidentemente, toda a jurisprudência nova que busca radiografar o modelo e incursionar pela realidade recebe críticas, o julgamento monocrático favoreceu a recorrente, no propósito de retirar a suspensão indeterminada por aquela determinada.

Diversos tribunais estaduais também sustentam, inclusive em maior extensão, a impossibilidade de se promover ações contra os sócios da sociedade empresária.

E qual a ratio essendi do sobrestamento contra os sócios?

Em primeiro lugar deve se aguardar a elaboração do plano, sua aprovação ou rejeição, para a isonomia entre os credores, caracterizar o estado falimentar, conforme artigo 83 da Lei 11.101/05.

Num segundo momento, não se descarta a novação da obrigação e por ela não teria o menor sentido o devedor principal pagar pro solvendo e os sócios garantes solidários pro soluto, entrechoque inadmissível.

Não é sem razão também que, ao tempo das execuções singulares, diversos bancos se permitem excutir patrimônio dos sócios, o que sugere e suscita não apenas concurso entre eles, mas, eventualmente, de garantias.

A jurisprudência séria é aspergida mediante o conhecimento e o discernimento da pluralidade de casos e da realidade do modelo de recuperação, cuja desconstrução somente é performatada por aqueles que, ao agirem em nome da ciência, defendem interesses corporativos e econômicos ocultados.

O modelo de salvamento empresarial nacional é atípico e sui generis, no exterior, no sistema norte-americano, e naquele europeu, qualquer plano já passa pelo aporte financeiro de grandes conglomerados bancários.

No Brasil, ao contrário, além dos bancos não injetarem recursos, indo de encontro contra a maré da recuperação, descapitalizam as próprias empresas, sorvendo os recursos dos sócios, criando a perversa lei de Gerson, recuperando créditos e não protegendo a preservação da empresa.

Cabe-nos indagar, por fim, se queremos uma legislação séria, uma interpretação coerente, ou apenas preferiremos os interesses egoísticos e superficiais de grupos econômicos, na recuperação de seus créditos, em detrimento do salvamento de empresas, com a palavra a sociedade brasileira.

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