Segunda Leitura

Gestão de Marilza Maynard à frente do TJ-SE é exemplar

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

29 de setembro de 2013, 8h01

Spacca
Conheci Marilza Maynard nos anos 1990. Não me recordo onde nem quando. Nem mesmo se ela era juíza ou desembargadora da Justiça de Sergipe. Provavelmente foi em algum evento da Associação dos Magistrados Brasileiros. Ou, quem sabe, em evento promovido pelo Conselho da Justiça Federal, que realizava grandes congressos sobre administração da Justiça.

Nunca conversei com ela mais do que três minutos e sempre sobre generalidades. Mas me chamava a atenção o seu interesse por tudo relacionado com a Justiça. Sua vontade de aprender e fazer era flagrante. Sem nada falarmos, percebi que tínhamos os mesmos ideais. Mas, por pertencermos a ramos diversos do Poder Judiciário e residirmos em locais distantes, os encontros foram esporádicos.

Passa o tempo. Fiquei sabendo que ela assumiu a presidência do Tribunal de Justiça de Sergipe, de 2005 a 2007. Também, que entrou em uma lista tríplice para o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça, não tendo sido a escolhida. Mais tarde, foi convocada para prestar serviços naquela corte, até o provimento de um cargo vago de ministro. Fiquei feliz. De certa forma, fez-se justiça. Mas sequer mandei um cartão com cumprimentos.

Entram e saem os anos, rapidamente. Tal qual naqueles antigos filmes de Hollywood, em que o calendário ia mudando suas folhas impulsionado pelo vento, simbolizando o tempo que se vai inclemente.

Junho de 2013. Vou a Aracaju dar aulas em um curso de mestrado que a minha universidade promove com uma local, a Unit. Aproveito a oportunidade para saber do que ocorre na cidade, economia, política e principalmente na área do Direito nos setores acadêmico e forense. E aí me falam daquela magistrada com quem por anos, à distância, partilhava do mesmo sonho, qual seja, de uma Justiça respeitada e eficiente.

Encanto-me com o que ouço sobre ela. Referências elogiosas, iniciativas ousadas, oportunas e, principalmente, o exercício da presidência de forma exemplar, conduzindo a Justiça do seu estado a um grau de respeitabilidade nunca antes existente. Fico feliz e estimulo as narrativas.

Formado um contexto da atuação da desembargadora Marilza Maynard, repito, sinteticamente, o que ouvi. Pelo único motivo de que tenho a crença de que os bons exemplos, as coisas boas, devem ser divulgadas. Não só da Justiça, evidentemente, De tudo. Abrindo-nos os olhos para ver que o bem existe, está ao nosso lado, mas nunca é exaltado. Já o mal recebe divulgação extrema e quem tiver dúvida ligue qualquer canal da TV brasileira neste momento.

A presidência de um tribunal no Brasil tem prazo de dois anos. Passa depressa. Na manhã do dia seguinte à posse já devem ser tomadas as primeiras medidas. E, na maioria das vezes, elas são simples. Assim fez Mariza Maynard.

Preocupada com o gasto de dinheiro público, elaborou uma cartilha virtual de boas práticas, com medidas que implicavam em economia de despesas com telefone, impressão, consumo de água, de energia elétrica, xerox, serviços terceirizados. Estas providências não se limitaram ao tribunal, mas a todas as comarcas. Por exemplo, definindo-se o número necessário de computadores, impressoras, linhas telefônicas e ramais por vara. Quanto às ligações telefônicas, estabeleceu-se o limite máximo de cinco minutos, evitando-se as conversas intermináveis que não significam apenas gasto inútil de dinheiro público, como menos tempo de serviço prestado pelo servidor.

Concluiu projeto iniciado anteriormente, ainda como corregedora, denominado “Todo município com Justiça”. Para promover o atendimento direto e próximo à população do interior do estado, foram instalados, de pronto, 26 fóruns regionais. A estas unidades da Justiça, vinculadas à sede da comarca, o juiz e os servidores se dirigem regularmente e atendem a população, solucionando os conflitos. É algo semelhante ao que faz a Justiça de Rondônia e a Justiça Federal da 4ª Região.

Na área da informática, os avanços foram tantos que o Conselho Nacional de Justiça indicou o TJ-SE para presidir o “Comitê Gerencial de Informática dos Tribunais de Justiça da Região Nordeste”.

Preocupada com a população, padronizou o atendimento aos usuários nas 97 comarcas do estado, com ambiente climatizado, espaços adequados e mobiliário confortável.

Estimulou as licitações na modalidade de pregões eletrônicos, sob o sistema de registro de preços. Eles chegaram a ser feitos em 90% das licitações do TJ, resultando em uma economia de 30% em cada aquisição feita pelo tribunal.

Mas, sabemos todos, que a administração judiciária não se resolve apenas com boas iniciativas a partir do gabinete da presidência. É preciso atuar junto, envolver-se, estar presente, mostrar interesse. E nisto a desembargadora Marilza foi exemplar.

Conta-se que, certa feita, esteve em uma madrugada na Rodoviária de Aracaju, para saber as reais condições de atendimento às crianças em situação de risco no posto avançado do Juizado da Infância e Juventude. Da sua visita resultou uma melhor estrutura do local, de modo a oferecer mais conforto aos pais e crianças em trânsito.

Segundo o relato de um juiz de Direito, certa vez, em um feriado da Independência do Brasil que caíra em uma quinta-feira, estava ele em casa repousando quando, por volta das 8h, recebe um telefonema do juiz auxiliar da Corregedoria. Ele informava sobre uma demanda administrativa de seu interesse, relacionada com a realização de um mutirão de Sessões do Tribunal de Júri em uma Comarca do interior. Ele agradeceu e respondeu que por ser feriado, no dia seguinte faria o contato com a presidência. Dez minutos depois recebe um telefonema direto da desembargadora Marilza, presidente do TJ. Surpreso e intimidado, porque era à época um juiz substituto com menos de 30 dias no cargo, recebeu todas as informações. E a presidente ainda perguntou-lhe por que não a procurou diretamente. Ele respondeu que não queria incomodá-la no feriado. Ela retrucou, delicadamente: "Meu filho, para a presidente do tribunal não tem feriado! Estou aqui trabalhando em meu gabinete desde cedo para atender as solicitações de todos!”

Narra o mesmo magistrado que, em outra oportunidade, estava em um sábado realizando diversas audiências de instrução em um Juizado Especial Cível, por sugestão e solicitação da presidência do tribunal. O mutirão no sábado compreendia cinco juízes e o objetivo era agilizar os julgamentos. Eis que, por volta das 12h30, aparece no fórum a desembargadora  Marilza, presidente do tribunal. O juiz quis interromper a audiência para recebê-la, mas ela disse fosse até o fim dos julgamentos. Aguardou sentada, pacientemente, sem dizer uma só palavra. Por volta das 13h chegou, de surpresa, um almoço para os juízes e funcionários, enviado pelo tribunal. Aí a presidente foi conversar com o juiz e explicou. Reconhecia o esforço dos servidores e dos magistrados que estavam a trabalhar em um sábado e, por isso, viera certificar-se, pessoalmente, se haviam recebido a refeição e se eles consideravam a comida de boa qualidade.

Graças a iniciativas como as relatadas, a Justiça do Estado de Sergipe apresenta-se hoje como uma das mais rápidas e respeitadas do Brasil. Evidentemente, este mérito não é apenas da desembargadora Marisa Maynard. É, da mesma forma, de muitos outros colegas do seu tribunal, de juízes de primeira instância e dos funcionários. Não se constroem sonhos isoladamente, sempre são muitos os responsáveis pelo sucesso. Mas não se constroem sonhos, também, sem que haja uma pessoa conduzindo o grupo, uma liderança do bem. E é aí que o papel de Marisa Maynard se torna mais palpável e digno de elogios.

Alguém, com uma ponta de ciúmes, dirá, que tudo isto não é vantagem alguma, pois Sergipe tem um território de apenas 21.910 km² e uma população de 2.110.867 habitantes — ou seja, inferior às capitais de muitos estados brasileiros. Esta é uma afirmativa equivocada. Óbvio que ser menor facilita a administração. Mas, óbvio da mesma forma, que mesmo sendo pequeno ou pouco populoso o estado, a Justiça pode ir muito mal se não for bem administrada.

Em suma, o mérito da desembargadora Mariza Maynard e da Justiça de Sergipe existe e deve ser reconhecido e proclamado. E que outros sigam o exemplo desta mulher que dedicou sua vida à Justiça, evidentemente, adaptando-se às peculiaridades de seus estados ou regiões.

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