Terceira geração

Constituição brasileira é das mais avançadas do mundo

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16 de outubro de 2013, 14h43

Se a característica comum das constituições modernas é elevar os direitos sociais à característica de direitos constitucionais, a brasileira deu um passo adiante ao criar garantias de efetivação desses direitos. Essa característica faz da Constituição Federal brasileira de 1988 uma das mais avançadas do mundo, segundo análise do jurista italiano Luigi Ferrajoli, grande estudioso de Direito Constitucional e o principal responsável pelo desenvolvimento da chamada teoria do garantismo penal.

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Em palestra feita na noite da terça-feira (15/10) na sede do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), Ferrajoli classifica o momento constitucional em que os Estados ocidentais vivem como "constitucionalismo da terceira geração". É justamente a geração que transformou os direitos sociais em direitos fundamentais. "Se as constituições do século XIX, dos Estados liberais, eram um freio ao poder do Estado, as constituições atuais são um passo à frente. São textos que criam, além de limites para ao poder estatal, obrigações políticas em relação aos cidadãos", resumiu o jurista.

Ferrajoli avisou que não analisaria princípios constitucionais brasileiros para uma plateia de estudantes brasileiros de Direito. “Falarei do ponto de vista de um europeu.” E dessa forma definiu as três gerações constitucionais. A primeira é a dos estados liberais do século XIX e tem como momento fundador a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, assinada na França em 1789, ainda no contexto da Revolução Francesa.

Só que esse tipo de texto constitucional funcionava mais como pacto social para garantir que os poderes do Estado não seriam absolutos, já que todos os homens e cidadãos agora tinham direitos. A segunda geração, segundo o jurista, surge a partir da segunda metade do século XIX, mas ainda não como princípios fundamentais positivados. Funcionavam como leis ordinárias, e, portanto, estavam no mesmo patamar das demais leis. Era o que Ferrajoli chamou de época do poder dos parlamentos, em que todo poder estava nas mãos da maioria.

E, na leitura do professor italiano, foi essa construção social que permitiu o surgimento dos regimes totalitários no início do século XX. “O fascismo destroçou a democracia, mas não se pode dizer que foi um golpe de Estado. A Constituição não era rígida, era uma lei ordinária”, analisou.

Hoje, ainda segundo o que Ferrajoli explicou na palestra, vive-se o chamado constitucionalismo da terceira geração. Com o fim das ditaduras que acabaram com as liberdades individuais e relativizaram até mesmo o direito à vida, os direitos fundamentais e sociais foram elevados ao patamar de direitos constitucionais.

E as constituições passaram a estar acima das leis, funcionando como régua para a atuação dos Estados. Nesse sentido é que são “um passo à frente” ao Estado. “Os direitos fundamentais são de todos e de cada um, e não da maioria. São direitos pré-políticos, e portanto não estão à disposição da maioria para que decidam sobre eles.”

O garantismo e a política
Segundo o professor explicou à revista Consultor Jurídico, essa é a base da teoria do garantismo penal. Segundo ele, mais do que uma teoria do Direito, o garantismo é uma construção que faz parte da filosofia política. “A garantia de uma ação penal contra arbitrariedades é o direito do mais fraco diante do Estado, porque sem as garantias, o direito perece. Se os direitos não são garantidos, são construções de retórica”, resume.

Ferrajoli lembra que sua teoria se desenvolveu na esfera penal porque essa é “a forma mais terrível e mais violenta de ação estatal”.

O livro em que explica sua tese pela primeira vez, Direito e Razão, a Teoria do Garantismo Penal, foi publicado na Itália em 1989. O contexto do desenvolvimento dessa teoria, conta, foram as décadas de 1970 e 1980. Os governos europeus desenvolviam políticas que reduziam direitos sob o pretexto do antiterrorismo. Na Itália, eram uma resposta à Máfia.

“Era uma época em que o Estado de Direito se encontrava num momento de difícil. E por isso a teoria se desenvolveu no âmbito penal”, lembra. Mas ressalva que o modelo pode se estender a todos os poderes. “É mais que uma filosofia política. É um instrumento de garantias de vida”, defende.

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