Exercício de direito

Representação negada contra policial não motiva indenização

Autor

15 de outubro de 2013, 13h12

Advogado que representa contra policial no Ministério Público não comete ilegalidade, mesmo que o suposto abuso de autoridade não tenha sido reconhecido administrativamente. Trata-se, na verdade, de regular exercício de direito, consubstanciado nas prerrogativas funcionais da advocacia, além da defesa da cidadania.

O entendimento levou a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a confirmar, na íntegra, sentença que negou pedido de indenização ajuizado contra um advogado da Comarca de Soledade. O policial, escrivão, se sentiu ofendido com a representação por abuso de autoridade porque estava em estágio probatório.

O relator da Apelação, desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, afirmou no acórdão que o advogado nada mais fez do que apresentar justificativas que, ao menos em tese, poderiam caracterizar delito cometido pelo policial. E que este não fez prova da alegada má-fé do advogado.

‘‘Impende sublinhar que os argumentos de que o demandado, ao narrar os fatos objeto da representação, teria feito ataques desnecessários à pessoa do demandante, usando linguajar inadequado, ofendendo o autor, é circunstância que não veio descrita como causa de pedir na presente demanda, pelo que não se há de considerar, pois avança sobre os limites objetivos da lide’’, disse o relator em seu voto. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 26 de setembro.

O caso
O escrivão Diego Milani contou à Justiça que sofreu uma representação no Ministério Público, por suposto abuso de autoridade, manejada pelo advogado Waldeni Borges de Oliveira. Segundo ele, isso lhe causou transtornos psíquicos, como sofrimento, tristeza, preocupação e angústia. À época dos fatos, o autor estava em estágio probatório na Polícia Civil da Comarca de Soledade.

A ‘‘desinteligência’’ teria ocorrido porque o servidor público impediu o advogado de acompanhar o depoimento de uma vítima de estupro, conforme solicitado pela própria depoente.

O advogado apresentou contestação. Preliminarmente, pediu a suspensão do processo até o julgamento da queixa-crime ajuizada pelo autor. No mérito, afastou a prática de ilícito, já que exerceu prerrogativa da advocacia.

A sentença
O juiz José Pedro Guimarães, da 2ª Vara Cível da Comarca de Soledade, afirmou na sentença que os detentores de cargos público devem prestar contas à cidadania. E, nesse sentido, o acionamento das instâncias correcionais é uma materialização do regime de Estado Democrático de Direito e dos superiores princípios republicanos.

Entretanto, advertiu, a ofensa leve, especialmente no âmbito de proteção da garantia de inviolabilidade do advogado, cujo destinatário final é a cidadania, não gera direito a reparabilidade alguma. Antes, deve ser assimilada como adversidade natural da vida de relação.

Assim, no caso concreto, o juiz entendeu que a representação feita pelo advogado não consubstancia ato ilícito de qualquer natureza ou mesmo abuso de direito, conforme dispõe do artigo 187 do Código Civil. Muito menos justifica sancionamento de natureza pecuniária.

‘‘Sabendo-se da especial circunstância de o policial estar na linha de frente da criminalidade e, de resto, agir expeditamente, sem tempo às vezes para refletir, tomar-se pela razão, pessoalmente entendo que pequenos excessos devem ser assimilados pela consciência geral. Mas, repita-se, no plano civil ou mesmo ético, a dúvida deve sempre e sempre ser dirimida em favor da cidadania’’, registrou.

Tal postura deve-se ao fato, segundo a visão do julgador, de que a Polícia, não raro, age no limite da arbitrariedade.

‘‘A simbologia do porte constante de arma de fogo e, de resto, a sua inequívoca potencialidade lesiva, aliada a absoluta necessidade de imposição da ordem, instabilizada e agravada pela emoção natural que se concretiza em grau enorme logo após aos conflitos humanos, compromete a racionalidade e urbanidade dos agentes de polícia’’, considerou o magistrado, julgando improcedente a demanda.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!