Arrecadar não basta

A tributação deve ser instrumento de desenvolvimento

Autores

  • Andreia Scapin

    é advogada doutora em Direito Tributário pela USP professora convidada da pós-graduação da Universidade Mackenzie e pesquisadora do Centro Didático Euro-Americano sobre Políticas Constitucionais da Università del Salento Itália/Furb (Brasil).

  • Ariel Kövesi

    é graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e estagiário do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas (NEF/Direito GV).

14 de novembro de 2013, 14h10

Artigo produzido no âmbito das pesquisas desenvolvidas no NEF/Direito GV. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores. 

Em 28 de outubro de 2013, o NEF/Direito GV realizou o Seminário Internacional “Tributação e Desenvolvimento na América Latina” para discutir o estudo “Não basta arrecadar: a tributação como instrumento do desenvolvimento”, que foi elaborado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) com o propósito de identificar as razões da ineficiência do sistema tributário da América Latina e do Caribe, apontando soluções para converter a arrecadação fiscal desses países numa forte aliada de seu crescimento econômico.[1]

Segundo a obra, após os anos 1990, a região manifestou um progresso notável na qualidade e eficácia das políticas fiscais, além de um recente crescimento da arrecadação, o qual foi considerado o mais rápido do mundo. No entanto, a sua estrutura tributária padece de graves deficiências que criam um círculo vicioso, obstruindo a atividade fiscal eficiente, a exemplo da: debilidade da administração tributária, impostos com pouca progressividade e evasão fiscal.

Representantes de órgãos públicos, universidades, empresas privadas e instituições financeiras estiveram presentes no seminário internacional para comentar o estudo. Discutiram, em especial, os problemas evidenciados na pesquisa e seus impactos em relação ao Brasil.

Embora as divergências entre o setor público e privado sejam corriqueiras, chamou atenção o consenso entre os técnicos sobre a imprescindibilidade de alterar o foco da tributação, reforçando sua aptidão como poderoso instrumento que estimula o crescimento do país. De fato, hoje, o tributo não pode atuar apenas como fonte de geração de receita para pagar contas do governo e estufar os cofres públicos, deve ser uma ferramenta que gera desenvolvimento.

Para Isaías Coelho, Pesquisador Sênior do NEF/Direito GV, construiu-se um sistema facilitador de desigualdades, com isenções e privilégios fiscais concedidos a atividades, setores ou grupos de contribuintes, sem justificativa plausível; e com a distribuição desigual de recursos de caráter nacional em prol de poucos municípios.

Luigi Nese, presidente da Confederação Nacional de Serviços, também destacou os casuísmos da substituição da contribuição sobre a folha de salários pela nova alíquota baseada no faturamento, em que a inclusão ou exclusão de setores da economia não atendem a qualquer racionalidade específica, sujeitando-se a lobbies e a interesses não explicitados publicamente.

Segundo Lucilene Prado, Diretora Jurídica da Natura Cosméticos S.A., em vez de alavancar a economia, a atual tributação brasileira age como uma trava, impactando a geração de empregos, a competitividade das fábricas e a inovação das empresas, pois os altos níveis da tributação desestimulam os avanços econômicos.

Nos países em desenvolvimento, tal como os latino-americanos, dado o crescimento rápido e desordenado, o sistema tributário é um relevante pilar na estrutura da economia capaz de encorajar ou desencorajar os atores no cenário econômico, por isso não pode atua como freio na sua evolução.[2]

O estudo propõe a criação de um sistema tributário simples que incentive a inovação das empresas e de um imposto sobre a renda com poucas isenções e capacidade redistributiva real para que seja preservada a renda de famílias mais pobres. Recomenda o fortalecimento da administração tributária para reduzir práticas evasivas, a criação de incentivos que impulsionem o uso eficiente de recursos naturais finitos e a realização de acordos institucionais produzindo receita para que governos locais possam atuar como agentes de desenvolvimento.

Os países da América Latina e do Caribe não exercem uma tributação eficiente e equitativa, obstruindo o progresso ao invés de impulsioná-lo. Seus sistemas fiscais distorcidos e regressivos precisam ser convertidos em aliados do crescimento econômico, da mobilidade e equidade sociais.

O Seminário Internacional demonstrou que o paradigma da tributação está mudando no sentido de maior eficiência econômica e melhor distribuição do ônus fiscal. A pesquisa reforça que, nos dias de hoje, “não basta mais arrecadar” e “não basta arrecadar mais”, o tributo deve estar a serviço do desenvolvimento, da sustentabilidade e da inclusão. A arrecadação fiscal maior necessariamente exige um país melhor. 


[1] O acesso à obra “Não basta arrecadar: a tributação como instrumento de desenvolvimento” pode ser feito pelo link http://www.iadb.org/es/investigacion-y-datos/publicacion-dia,3185.html?id=2013#.UkMi1xukrIs

[2] BIRD, Richard. Taxation and Development. In: Economic Premise. October 2010, number 34, p. 1-5. Disponível em http://siteresources.worldbank.org/INTPREMNET/Resources/EP34.pdf. Último acesso em 06 de novembro de 2013.

Autores

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    é pesquisadora do Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Doutoranda em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

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    é graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e estagiário do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas (NEF/Direito GV).

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