Cerco ao dinheiro

País usa cooperação internacional contra corrupção

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9 de novembro de 2013, 5h56

Pilar na luta contra a corrupção, a cooperação internacional está sendo bem explorada pelo governo, que nos últimos anos assinou mais de 15 acordos bilaterais e aderiu a convenções como a das Nações Unidas e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. A avaliação é de Ricardo Andrade Saadi, diretor do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça.

Durante o Latin American Regulatory Summit, evento que ocorreu em São Paulo nesta semana, Saadi afirmou que o crime, atualmente, é transnacional, e mesmo a empresa que atua apenas em um país costuma levar seus bens para outra nação. Para ele, que foi delegado da Polícia Federal, a cooperação deve ser utilizada antes de qualquer operação policial ou de órgãos como a Receita Federal, para garantir o bloqueio simultâneo de verbas e bens no Brasil e no exterior e impedir que as provas sejam transferidas.

Por essa razão, a união entre policiais e governos de todo o mundo é fundamental, disse ele, que apontou a importância e a velocidade da cooperação informal, feita diretamente entre os órgãos. O ponto ruim desse mecanismo, segundo ele, é que a cooperação informal dificilmente resulta em documentos que possam ser utilizados em processos judiciais. A opção formal, definida por ele como cooperação jurídica, produz documentos aceitos em julgamento, mas é marcada pela demora. De acordo com Saadi, o mecanismo ganhou celeridade nos últimos anos, mas ainda são necessários cerca de seis meses para que o pedido feito por um país seja atendido pela segunda nação.

Presente ao mesmo evento, Richard Cavalieros, adido do Federal Bureau of Investigation no Brasil, elogiou a eficiente colaboração entre Brasil e Estados Unidos. Segundo ele, há constante troca de informações entre as polícias ou entre representantes de órgãos como Ministério Público e Receita Federal. Isso permite o monitoramento de cidadãos investigados em um país e que possuem bens no outro, ou que viajam do Brasil aos Estados Unidos enquanto são investigados, por exemplo.

Como exemplo da proximidade, ele citou um encontro no início de 2013, em Washington, com a presença de membros do MP, da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, além de representantes de órgãos norte-americanos. Ainda em novembro, afirmou Cavalieros, deve ser promovida nova reunião, desta vez no Brasil, com foco no pagamento de propina nos dois países e na luta conjunta contra tal prática.

Em relação à Lei 12.846/2013, que permite a responsabilização de empresas por atos de corrupção praticados por seus funcionários, Cavalieros e Saadi citaram o desenvolvimento do compliance. Para o norte-americano, a prática é importante, mas não deve ser vista pelas autoridades como a única chave para descobrir casos de corrupção, pois existem outros mecanismos que apontam as irregularidades. Já na visão do brasileiro, é preciso tomar cuidado com o compliance disfarçado, levado a cabo de forma estruturada para permitir crimes mesmo cumprindo as regras básicas. De acordo com ele, a “empresa que pratica compliance sério é muito bem-vinda, mas o mundo não é cor-de-rosa”.

Mudança
Para Roberto Troncon, superintendente da Polícia Federal, o Brasil avançou no combate à corrupção de lavagem de dinheiro após atuar em duas frentes. Além da estratégia nacional desenvolvida pela PF, que criou um grupo especializado na repressão ao desvio de dinheiro, um conjunto de leis também foi importante, disse ele, citando as leis 8.112/1990; 8.666/1992; 8.429/1992; 9.613/1998; 12.846/2013; 2.850/2013; a Lei Complementar 101/2000; e a LC 135/2010.

Troncon disse que, em 2013, a Polícia Federal mantém quase 8,5 mil investigações em curso por conta de corrupção e desvio de dinheiro público, sendo que 40% envolvem, crimes cometidos por prefeitos e vereadores. Tal prática é mais comum, citou, em estados com menor capacidade financeira, especialmente no Nordeste. Roberto Troncon informou que 34 destas investigações são tratadas como especiais pela PF. Somadas, elas apuram desvio de R$ 1 bilhão e já levaram ao bloqueio de R$ 176 milhões, além do indiciamento de quase 250 pessoas.

Para Donald Peele, vice-presidente para a América Latina de governança, risco e compliance da Thomson Reuters, que organizou o evento, os investidores e especialistas reconhecem que, com a Lei 12.846, o Brasil está se juntando à realidade do cenário mundial. De acordo com ele, é necessário que o país alinhe seus regulamentos com o de outros países e com os protocolos globais. Como cada legislação tem diferenças, afirmou Peele, muitas empresas estão tendo de buscar advogados e profissionais de compliance para compreender as semelhanças e distinções entre a legislação brasileira e a americana, por exemplo.

Ele classificou a corrupção como uma questão cultural e intrínseca à sociedade. Entre os aspectos que devem ser analisados, concluiu Peele, estão a aceitação popular à corrupção, os mecanismos de combate e a percepção de impunidade. Já José Leonélio Souza, Business Development Manager da área, disse que a mudança de cultura em relação à corrupção empresarial passa pela direção de cada companhia. Segundo ele, a política interna deve ser clara, conhecida por todos os funcionários é encampada a partir dos cargos de direção, pois a cultura organizacional se espalha de tais profissionais para seus subordinados, e não em direção contrária.

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