Maturidade institucional

Princípio da eficiência guia trabalho da advocacia pública

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30 de março de 2013, 7h40

A advocacia pública brasileira alcançou o status de função essencial à Justiça com a Constituição de 1988, sendo os órgãos que a exercem de presença obrigatória na estrutura dos Poderes Executivos da União, dos estados e do Distrito Federal. Embora as Procuradorias Gerais dos Estados e do DF já existissem há décadas, o certo é que, em nível federal, o núcleo funcional da advocacia pública, que é a representação judicial e a consultoria jurídica das entidades públicas, apenas foi atribuído a uma instituição distinta do Ministério Público Federal com a Constituição cidadã.

Talvez por conta desse desabrochar institucional, no âmbito interno dos órgãos de advocacia pública brasileiros ainda se registram titubeios em relação a sua natureza e, por via de consequência, ao melhor modelo de organização e funcionamento para a consecução de seus fins, claramente traçados pelo constituinte. Essas dúvidas podem ser facilmente dirimidas, bastando a fidelidade ao texto e ao espírito da Constituição.

A missão precípua dos órgãos de advocacia pública é a pavimentação do caminho jurídico por meio do qual o Poder Executivo e as entidades administrativas a ele vinculadas implementam o ambicioso programa político genericamente traçado pela Lei Maior e que recebe detalhamento nos planos de governo, nas leis orçamentárias e demais atos normativos federais e estaduais (distritais).

Para essa concretização dos fins constitucionais, sobretudo consubstanciados nos direitos fundamentais, estão legitimados os poderes executivos da União e dos estados, cujos representantes são escolhidos pelo voto popular majoritário, sendo controlados politicamente pelos respectivos poderes legislativos e, juridicamente, pelos Tribunais de Contas, pelo Ministério Público e, em última instância, pelo Poder Judiciário.

Os órgãos de advocacia pública consultivos, embora participem do chamado sistema de controle interno do Poder Executivo, em matéria de execução orçamentária, diferem substancialmente dos órgãos de controle externo. As consultorias jurídicas dos Ministérios e Secretarias de Estado não são órgãos que, distanciados da administração, proferem pareceres descomprometidos com a ação governamental. São órgãos de advocacia e, enquanto tal, devem envidar todos os esforços no sentido da implementação dos planos de governo do modo mais eficiente possível, o que importa na adequada, e não burocrática, interpretação de textos normativos, respeitada, obviamente, a livre convicção de cada parecerista.

Para tanto, é dever de ofício dos consultores e assessores jurídicos que integram os órgãos de advocacia pública a interação com os administradores e governantes, descortinando-lhes a disciplina normativa balizadora de sua atuação, porém, de igual modo, buscando compreender os propósitos e os condicionamentos fáticos que a inspiram. Bem por isso, a disciplina constitucional e infraconstitucional das garantias de independência de magistrados e membros do Ministério Público jamais foi e jamais deverá ser a mesma dos advogados públicos.

A Constituição Federal silenciou a respeito da extensão da garantia de inamovibilidade aos advogados públicos, como também o fez a Constituição paulista de 1989. Todavia, a Lei Orgânica da PGE-SP, editada dois anos antes da Constituição de 1988, assegurou aos procuradores do Estado uma inamovibilidade relativa, como o é a inamovibilidade de magistrados, em dimensão compatível com a função exercida por esses profissionais.

De acordo com a Lei Complementar Estadual 478/86 (LOPGE/SP), em sua redação originária e na atual, o que se assegura aos procuradores é que nenhum deles será deslocado de ofício, isto é, a critério da chefia da instituição, de sua sede de exercício (Município ou Municípios atendidos pelo órgão em que atuam) ou de sua área de atuação (consultoria, contencioso geral e contencioso tributário-fiscal) senão mediante prévia aprovação do Conselho da PGE, deliberando por dois terços de seus integrantes (majoritariamente eleitos).

Caso não haja alteração de sede de exercício ou de área, compete ao procurador geral do Estado classificar os procuradores nos diversos órgãos de execução. Todo o inconformismo dos atuais dirigentes da Associação dos Procuradores do Estado – APESP, amplificado para fins midiáticos nesta respeitável publicação eletrônica, no artigo Alteração da Lei Orgânica da PGE-SP cria neocoronelismo, prende-se às resoluções dos procuradores gerais, desta e da anterior gestão, que consideram as consultorias jurídicas da capital como uma única unidade para efeito de lotação e classificação dos procuradores que lá atuam.

Com isso, permite-se a rápida adequação do número de procuradores que atuam nesses órgãos às constantes oscilações da carga de trabalho respetiva, que guarda correspondência com as atribuições das pastas. Além disso, torna-se possível buscar a aproximação ideal entre a formação, expertise e experiência dos consultores e o seu complexo mister. Não se diminuiu, nem seria lícito fazê-lo, em momento algum, a abrangência da garantia de inamovibilidade que a Lei Orgânica de 1986, pioneiramente, diga-se de passagem, assegurou aos advogados públicos paulistas.

Se cada uma das consultorias jurídicas fosse considerada unidade de classificação, ainda assim, com total amparo na legislação básica da instituição, poderia o procurador geral alterar, livremente, a classificação de um consultor de uma consultoria para outra. O que apenas seria diferente é que a todo o momento haveria a necessidade de alteração da resolução que fixa a lotação desses órgãos (ato também da competência do procurador geral, ouvido o Conselho) e mais: criar-se-ia a falsa impressão de que um procurador classificado em uma consultoria ali permaneceria de modo permanente e estável.

Somente o desvario corporativista e o descompromisso com a verdade podem permitir que alguém alcunhe o sistema de classificação em órgãos de execução e de designações internas que existe na área consultiva da PGE/SP desde 1986 de “neocoronelismo”. Ao exercer a competência de designar os profissionais que atuarão em cada consultoria jurídica de secretaria de Estado ou autarquia da capital (uma vez classificados na unidade que as compreende) o procurador geral do Estado age com discricionariedade, porém não de modo arbitrário, respeitando os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade administrativa e da publicidade, sem olvidar, contudo, como faz a entidade de classe, do princípio da eficiência e de seu compromisso com o interesse público.

E mais, caso instado a justificar o seu ato deverá explicitar-lhe a motivação, conforme determina o artigo 111 da Constituição. É curioso que nenhum desses atos de designação discricionária, praticados desde 2010, tenham sido questionados judicialmente, quer pelos procuradores, individualmente, quer pela zelosa diretoria da entidade de classe, omitindo-se, pois, no combate ao que alcunha de “neocoronelismo”.

A Procuradoria Geral do Estado de São Paulo e seus valorosos integrantes orgulham-se de haverem alcançado um estágio de desenvolvimento institucional que os protege, adequadamente, de toda forma de abuso de poder ou personalismo. A renovação de sua legislação básica, a par da atualização indispensável que o passar do tempo impõe, permitirá que o corporativismo infenso ao interesse público aqui jamais se instale.

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