Livre comércio

Regra que proíbe cigarros com aroma é suspensa

Autor

29 de março de 2013, 9h14

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) extrapolou suas atribuições ao editar a resolução que proíbe a comercialização de cigarros que contêm aroma e sabor. Foi o que decidiu o juiz Pompeu de Sousa Brasil, da 3ª Vara da Justiça Federal de Salvador, no último dia 14 de março. A decisão, da qual cabe recurso, vale apenas para as atividades da indústria do tabaco em território baiano.

O juiz concedeu liminar ao Sindicato da Indústria do Tabaco no estado da Bahia. Na decisão, registrou que não estão em debate os malefícios causados pelo cigarro, mas o fato de os órgãos reguladores irem além do que permitem as suas competências ao editarem normas que restringem atividades comerciais regulares. Isso, de acordo com ele, só pode ser feito por meio de lei.

“O que se põe em debate, na verdade, é o comportamento de órgãos do governo que, no afã de cumprir sua tarefa institucional, devassam o umbral de seu condão regulatório para atingir o espaço reservado à lei strictu sensu, cuja elaboração cabe ao parlamento, por meio dos representantes que expressam (ou pelo menos deveriam) a vontade popular”, afirmou o juiz.

Representado pelo advogado Everardo Gueiros Filho, o sindicato recorreu à Justiça com o argumento de que a Anvisa foi além do que lhe permite a lei ao editar a Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) 14/2012. Também sustentou que houve violação à liberdade de escolha do consumidor e ao principio da motivação, já que a norma não tem elementos técnico-científicos que dêem suporte à proibição. Publicada em março do ano passado, a RDC 14 proibiu a importação e comercialização de cigarros que contenham quaisquer tipos de amora ou sabor, como cigarros mentolados, por exemplo, e o uso de diversos aditivos.

Segundo informações do sindicato trazidas ao processo, a norma banirá 96% dos cigarros legalmente produzidos no país, o que afronta a ordem econômica e o princípio constitucional do livre exercício de atividades econômicas, “afetando dramaticamente o setor, em especial empresa sediada neste estado que, fabricando cigarros compostos por grãos de cravo natural, fez expressivo investimento em sua unidade fabril, recolhendo vultosa quantia em impostos e gerando mais de 500 empregos diretos e indiretos”.

Ao suspender a resolução, o juiz ressaltou que o processo não discute os efeitos maléficos do cigarro na saúde dos fumantes: “Parece claro que a discussão proposta não transita sobre a questão da nocividade do fumo, os prejuízos que causam à saúde, suas consequências nefastas para os jovens que, cedo, se vêem enleados num vício do qual, passado algum tempo, não conseguem se libertar”. De acordo com a decisão, o pecado da Anvisa é regulamentar aquilo que não lhe é cabido, já que tal regulamentação só poderia ser feita por meio de lei.

O juiz lembra, na liminar, que tramitam no Congresso Nacional propostas legislativas de semelhante teor ao da resolução, ou até mais radicais, simplesmente proibindo o fumo em território nacional. Segundo ele, é o Congresso o palco correto para a discussão de tais medidas.

O magistrado critica as ações de agências reguladoras que extrapolam os limites de suas atribuições: “Preocupa-me, no entanto, o menoscabo ao império da lei que atos dessa natureza emblematizam (RDC 14v.g.), veiculando emanações de poder que não são próprios da Administração, porque desprovidos de delegação legal com amplitude compatível. No caso, então, interferindo drasticamente em determinado setor, tangendo-o à revolução (quiçá desaparecimento), transformações ditadas não pelos fenômenos próprios da atividade econômica ou da concorrência em ambiente de livre mercado, mas pela vontade do administrador, não avalizada pelo Congresso Nacional”.

Resolução sob ataque
Não é a primeira vez que a resolução da Anvisa é contestada. Em novembro, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4.874) no Supremo Tribunal Federal para derrubar parte da lei federal que criou a Anvisa e, por arrastamento, da resolução que proíbe a comercialização de cigarros com sabor e aromatizantes. Segundo a CNI, a agência governamental atua “numa cruzada de proibições de substâncias e produtos ao arrepio da Constituição e do Congresso Nacional”.

De acordo com a ação, a parte final do inciso XV do artigo 7º da Lei federal 9.782/1999 está permitindo que a Anvisa utilize seu poder regulamentador para proibir, em caráter genérico e abstrato, a fabricação e a comercialização de produtos e insumos submetidos à fiscalização sanitária. A CNI afirma que a Anvisa não pode atuar como se tivesse delegação legislativa em branco, isto é, desacompanhada de diretrizes ou parâmetros claros e obrigatórios.

“A Anvisa considera possuir poder normativo para proibir genericamente a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de quaisquer produtos e insumos — mesmo daqueles que não representem risco real ou iminente à saúde”, sustenta a confederação. De acordo com dados da entidade, mais de 98% dos cigarros vendidos no Brasil são do tipo american blend, produto de uma mistura de aditivos e diferentes tipos de fumo. A ação foi distribuída para a ministra Rosa Weber. Não há prazo para seu julgamento pelo plenário do Supremo Tribunal Federal.

Clique aqui para ler a decisão.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!