Casamento gay

Suprema Corte dos EUA vive indecisão em audiência

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27 de março de 2013, 11h13

Começou nesta terça-feira (26/3), em Washington D.C., o que poderá ser o evento jurídico do ano nos EUA: a decisão da Suprema Corte sobre a constitucionalidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Os "torcedores" favoráveis e contrários ao "casamento gay", que acamparam em frente ao tribunal desde sexta-feira para garantir um lugar na audiência, se sentiram angustiados no primeiro do que será um evento de dois dias. Os ministros deram indicações de que poderão lavar as mãos — isto é, decidir não decidir.

Alguns ministros, como Sonia Sotomayor, questionaram a legitimidade dos proponentes da ação à Suprema Corte. Para eles, o casamento gay ainda é uma "novidade". O ministro Samuel Alito alertou que a corte pode não estar preparada para discutir uma questão "mais nova do que telefones celulares e a internet". O ministro Anthony Kennedy declarou que a corte "está entrando em um território desconhecido". E se queixou: "Temos cinco anos de informações para confrontar com 2 mil anos de história". As informações são dos jornais Washington PostChicago Tribune.

No evento de dois dias, a Suprema Corte começa a discutir dois casos separados. A terça-feira foi reservada para uma lei da Califórnia, que bane o casamento gay. A quarta-feira será dedicada a examinar uma lei federal que, em um artigo, estabelece que o casamento só pode existir entre um homem e uma mulher.

Os governos da Califórnia e dos EUA decidiram não defender suas leis respectivas. Assim, a defesa das leis é feita por advogados contratados pelo Partido Republicano e por grupos de interesse, sejam contra ou favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo. O governo Obama não vai defender a lei federal, mas participa da audiência para propor uma possível solução intermediária, a favor do casamento gay: deixar o problema para os estados.

A primeira discussão que surgiu, no início da semana, foi qual dos dois casos é mais importante. A decisão da Suprema Corte sobre a lei da Califórnia, conhecida como "Proposição 8", terá um impacto maior nas posições dos dois lados, na opinião de alguns juristas. Ela decidirá se o casamento gay é um direito constitucional dos americanos ou não. A decisão sobre a lei federal, a Lei da Defesa do Casamento (DOMA – Defense of Marriage Act), terá repercussão apenas no conjunto de benefícios federais que, hoje, só são concedidos ao casal homem-mulher.

"Uma decisão favorável, no caso da ‘Proposição 8’, será um marco na história jurídica do país, porque vai promover mudanças fundamentais nas leis e no status dos homossexuais americanos", disse à CBS News o professor da Faculdade de Direito da Universidade da Califórnia Adam Winkler. Uma decisão desfavorável significará, para o movimento gay, um retrocesso de pelo menos 25 anos na luta por direitos iguais.

Cinco decisões possíveis
Além de opiniões divergentes sobre o casamento gay, os ministros da Suprema Corte terão de navegar por cinco possibilidades diferentes de decisão: 1) declarar a lei da Califórnia inconstitucional, o que vai favorecer o casamento gay nos 50 estados e no Distrito de Colúmbia; 2) declarar a lei da Califórnia constitucional, o que vai por um fim à legalização do casamento gay no país; 3) derrubar a lei da Califórnia, mas declarar constitucionais as leis estaduais que autorizam o casamento gay — vai afetar nove estados, no momento; 4) derrubar a lei da Califórnia, apenas — vai afetar apenas esse estado; 5) decidir adiar a decisão ou, simplesmente, extinguir o caso.

Se a Suprema Corte decidir lavar as mãos, tudo pode continuar como está, menos para a Califórnia. A Suprema Corte pode fazer isso, decidindo, por exemplo, que os proponentes da ação à corte não tinham legitimidade para fazê-lo. Nesse caso, fica valendo a decisão anterior de um tribunal de recursos do estado, que considerou inconstitucional a chamada a "Proposição 8", a lei que é originária de votação popular e baniu o casamento entre pessoas do mesmo sexo no estado. E volta a vigorar uma lei estadual anterior, que autorizou o casamento gay como uma "união civil".

Se a Suprema Corte decidir pela inconstitucionalidade da lei, de uma forma que reconhece o direito constitucional do americano de se casar com uma pessoa do mesmo sexo, a decisão passa a valer para todo o país. E vai criar um problema legislativo imediato para 30 estados americanos, que inseriram em suas constituições estaduais uma emenda estabelecendo que o casamento só pode ser celebrado entre um homem e uma mulher.

No caso da decisão se limitar a derrubar a lei da Califórnia, mas, ao mesmo tempo, declarar que as leis estaduais que autorizam o casamento gay são constitucionais, a esfera federal sai definitivamente fora da questão do casamento gay. Deixa para cada estado decidir, individualmente, o que fazer.

Assim, os estados que reconhecem a "união civil entre pessoas do mesmo sexo" ou "parceira doméstica" não poderão barrar casamentos gays. E a decisão sobre a lei federal, a DOMA, passará a ter grande importância, porque uma decisão favorável aos casais homossexuais lhes estenderá todos os benefícios hoje concedidos apenas aos casais heterossexuais.

Colcha de retalhos
Outra consequência dessa possível decisão é a de que as cores dos dois partidos dominantes da política americana, o azul dos Democratas e o vermelho dos Republicanos, que pintam o mapa do país em todas as eleições, vão ganhar uma tonalidade jurídica. A atual separação entre estados liberais e estados conservadores ganhará um novo tom: os que são a favor ou contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, porque a questão já ganhou proporções consideráveis no país.

O mapa dos EUA, quando apresentado pelos jornais para indicar, através de cores, as posições dos estados em relação ao casamento gay já parece uma colcha de retalhos. Das 51 unidades da Federação (50 estados mais o Distrito de Colúmbia, o distrito federal dos EUA), 30 têm dispositivo constitucional que proíbe o casamento gay; nove têm leis estaduais ou decisões judiciais que autorizam o casamento gay; cinco têm leis estaduais que proíbem o casamento gay sem união civil; quatro têm leis estaduais que permitem uniões civis e/ou proibição constitucional ou legislativa de casamento gay; dois têm leis estaduais que autorizam casamento gay; e um não tem lei alguma sobre casamento gay ou união civil (Novo México).

Entre os 41 estados que não têm lei a favor do casamento gay, alguns reconhecem casamentos em outros estados, outros não. Toda essa configuração confusa cria problemas administrativos e logísticos para as grandes corporações, que têm unidades em todos os estados. Elas não podem ter uma política trabalhista uniforme, em relação aos empregados gays, porque a lei difere de um estado para outro. Por isso, as grandes corporações apresentaram uma moção à Suprema Corte em favor do casamento gay.

Perguntas duras
As audiências iniciais servem apenas para os advogados das duas partes apresentarem suas alegações e serem questionados pelos ministros, que terão até julho para tomar uma decisão. Os ministros "interrogam" duramente os advogados, sobretudo os que defendem uma posição que não lhes agrada.

Na sessão desta terça-feira, o advogado Charles Cooper argumentava, eloquentemente, que o propósito do casamento é assegurar a procriação, em relacionamento estáveis, com pai e mãe, quando foi interrompido pela ministra Elena Kagan: "Se a procriação é o propósito central do casamento, o estado não deveria, então, conceder licenças de casamento a casais com mais de 55 anos, correto?", ela perguntou. "Eu posso lhe garantir", ela disse, "que se o casal já tem 50 anos, não se pode esperar que venham muitas crianças desse casamento".

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