Maria da Penha

Faltam 54 varas e juizados sobre crimes contra mulheres

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19 de março de 2013, 16h54

É necessário praticamente dobrar o número de unidades judiciárias especializadas em violência doméstica e familiar contra mulheres para atender à demanda atual no país. A conclusão é da pesquisa A Atuação do Poder Judiciário na Aplicação da Lei Maria da Penha, um mapeamento inédito divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça nesta terça-feira (19/3). Para a efetivação da Lei 11.340/2006, que fomenta o combate a esse tipo de crime, a quantidade de unidades de competência exclusiva deveria saltar de 66 para 120. 

O levantamento, produzido pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, revela que a distribuição das 66 varas e juizados de violência doméstica e familiar não é proporcional nas cinco regiões do Brasil. Essas unidades processaram, até dezembro de 2011, 677.087 procedimentos. Com 54 novas unidades distribuídas em áreas estratégicas do país, o Conselho prevê que o atendimento à demanda será mais adequado. Desde 2006, quando foi promulgada a lei, a média de criação de novas unidades exclusivas no país é de dez a cada ano.

"É um trabalho extremamente simples, mas que permite uma visão sobre a atuação do Poder Judiciário no combate à violência doméstica contra a mulher. Os números da pesquisa revelam que a violência acontece, sobretudo, no lar, onde deveria haver harmonia", disse o conselheiro Ney Freitas, presidente da Comissão de Cidadania e Acesso à Justiça, órgão do CNJ responsável pela articulação das ações de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher.

Embora a Lei Maria da Penha não tenha atribuído caráter obrigatório à criação de varas ou juizados de competência específica, a Recomendação CNJ 9, de março de 2007, sugere aos tribunais a instalação de unidades de atendimento exclusivo na capital e no interior. Nas comarcas em que não há juizados exclusivos estruturados, as varas criminais acumulam as competências cível e criminal para processar as ações dessa natureza.

Mapeamento
A pesquisa também permite uma análise sobre a agressão contra mulheres. As conclusões foram feitas com base nos dados do Mapa da Violência, elaborado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres, parceira do CNJ em outras iniciativas de divulgação da Lei Maria da Penha, assim como da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, produzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

De acordo com o estudo, o Sudeste, composto por quatro estados que juntos somam o maior contingente populacional do Brasil, possui a maior quantidade de unidades judiciais com competência exclusiva: 20 no total. O Nordeste, por sua vez, é a segunda região mais populosa do Brasil e dispõe somente de 15 varas ou juizados da violência doméstica e familiar nos seus nove estados.

O desequilíbrio se verifica também no Sul, que ocupa o terceiro lugar no ranking populacional brasileiro. O estudo mostra que os estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná dispõem, cada qual, de apenas uma vara ou juizado da violência doméstica e familiar exclusiva para atender, respectivamente, a uma média de 5,48 milhões, 5,3 milhões e 3,1 milhões de mulheres. De acordo com a pesquisa, nessa região não se iniciou ainda o processo de interiorização das estruturas de competência exclusiva.

Na Região Norte, a situação é similar. Roraima, Rondônia, Amazonas, Acre e Amapá contam com apenas uma unidade judiciária, cada qual destinada exclusivamente ao julgamento dos casos relacionados à Lei Maria da Penha. Tocantins e Pará são os que registram o maior número de varas ou juizados — três e quatro juízos, respectivamente.

A desproporcionalidade é observada ainda no Centro-Oeste. A região, que é a menos populosa do país, possui 16 varas ou juizados exclusivos para o julgamento de processos relacionados à Lei Maria da Penha. Dez dessas unidades judiciárias encontram-se no Distrito Federal, cuja população não chega a 2,7 milhões de pessoas. Com número de habitantes superior ao da capital, os demais estados da região registram quantidade menor de varas e juizados especializados: Mato Grosso conta com apenas quatro, enquanto Mato Grosso do Sul e Goiás têm somente uma unidade judiciária exclusiva.

A pesquisadora do DPJ Ana Paula Antunes Martins explicou que o estudo contribuirá para a expansão da rede de atendimento à mulher. "Não tínhamos um mapa completo de onde estava essa estrutura judicial de processamento exclusivo de ações referentes à Lei Maria da Penha. A partir do estudo, poderemos verificar o cumprimento ou observância de onde estão essas unidades. Podemos também contribuir para a formulação de políticas judiciárias de expansão da rede de atendimento à mulher, o que inclui os juizados", afirmou.

Proposta de ampliação
O estudo recomenda a instalação de 54 varas ou juizados da violência contra a mulher: a maioria em cidades limítrofes, do interior e com grande concentração populacional, para atender de forma adequada a demanda existente.

No Sudeste, a sugestão é criar duas novas unidades no Espírito Santo (Colatina e Cachoeiro do Itapemirim); três no Rio de Janeiro (Nova Friburgo, Volta Redonda e Campos dos Goytacazes); quatro em Minas Gerais (Montes Claros, Governador Valadares, Uberlândia e Juiz de Fora); e cinco em São Paulo (Ribeirão Preto, Bauru, Campinas, São José do Rio Preto e Presidente Prudente).

Para o Nordeste, a proposta são 18 novas varas ou juizados — sendo uma unidade judiciária para Alagoas (Arapiraca); quatro para a Bahia (Vitória da Conquista, Barreiras, Teixeira de Freitas e Juazeiro); duas para o Ceará (Sobral e Crateús), duas para o Maranhão (Caxias e Balsas); três para Pernambuco (Caruaru, Petrolina e Serra Talhada); uma para a Paraíba (Patos); duas para o Piauí (Parnaíba e Picos); duas para Sergipe (Itabaiana e Aracaju); e uma para o Rio Grande do Norte (Caicó).

Em relação ao Sul, o estudo sugere a criação de nove juízos, distribuídos entre Rio Grande do Sul (Pelotas, Caxias do Sul e Santa Maria); Paraná (Maringá, Londrina e Cascavel); e Santa Catarina (Chapecó, Joinville e Criciúma). Para o Centro-Oeste, a pesquisa destaca serem necessárias mais seis unidades judiciárias, a serem instaladas igualmente nos estados de Goiás (Rio Verde e Catalão); Mato Grosso (Sinop e Cáceres); e Mato Grosso do Sul (Corumbá e Dourados).

Para a Região Norte, o estudo pede mais cinco varas ou juizados especiais, distribuídos entre Acre (Cruzeiro do Sul); Amapá (Laranjal do Jari); Rondônia (Ji-Paraná); Roraima (Rorainópolis); e Amazonas (Parintins). Se a proposta for cumprida, haverá 120 varas ou juizados exclusivos da violência doméstica e familiar contra a mulher.

O número médio de magistrados por vara ou juizado no país é de 1,6. A unidade da federação com maior concentração de juízes por unidade é no Distrito Federal (4,5), seguido por Amazonas e Rio Grande do Sul (ambos com 3). Quinze estados contam com apenas um juiz para cada vara ou juizado de competência exclusiva.

Dados da violência
Nos últimos trinta anos, houve aumento de 230% na quantidade de homicídios de mulheres. Só na última década, houve 43,7 mil assassinadas. Espírito Santo, Alagoas e Paraná são os estados com maior quantidade de homicídios de mulheres — com mais de seis para cada 100 mil habitantes.

Em relação ao tipo de violência, a agressão física ainda é a mais comum e está presente em 44,2% dos casos, seguida da psicológica (20,8%) e da sexual (12,2%). Entre 20 e 50 anos, o parceiro é o agente agressor mais comum. Até os nove anos e depois dos 60, os pais e filhos são os principais autores de violência.

O Rio de Janeiro foi o estado que mais concentrou inquéritos de violência doméstica ou familiar (43.065), Rio Grande do Sul (39.669) e Minas Gerais (21.023). Os inquéritos configuram a fase pré-processual, em que há pedido de limitação de liberdade ou restrição de direitos do investigado. O inquérito policial é obrigatoriamente distribuído ao juiz competente.

A orientação do CNJ é de que as execuções das penas privativas de liberdade sejam feitas nas Varas de Execuções Penais. De acordo com essa orientação, apenas a execução das medidas de suspensão condicional do processo, da suspensão condicional da pena e das penas restritivas de direitos previstas no artigo 44 do Código Penal seriam processadas pela própria vara ou juizado de competência exclusiva para os crimes de violência contra a mulher.

A maior quantidade de ações penais também está no Rio de Janeiro (16.179), seguido do Mato Grosso (15.543) e do Pará (11.334). No cálculo de processos julgados em relação aos ingressados, Amapá e Distrito Federal foram os estados que tiveram mais efetividade (ambos com 85%). Em seguida, estão o Rio Grande do Sul (76%) e o Mato Grosso do Sul (74%). Com informações da Assessoria de Imprensa do Conselho Nacional de Justiça.

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