Justiça ao vivo

São Paulo terá Júri transmitido pela TV, nesta segunda

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9 de março de 2013, 9h37

Pela primeira vez na história do Brasil, a Justiça de São Paulo vai transmitir um júri popular em tempo real. Nesta segunda-feira (11/3) todos poderão acompanhar pela TV, rádio e internet o julgamento de Mizael Bispo de Souza, acusado de matar, em maio de 2010, a ex-namorada Mércia Nakashima.

A iniciativa de transmitir é do juiz Leandro Bittencourt Cano, da Vara do Júri de Guarulhos, responsável pelo julgamento do caso. Segundo ele a transmissão trará maior responsabilidade e aproximará o Judiciário do jurisdicionado. "A Justiça ainda é muito distante da população. A transmissão irá melhorar o entendimento do que acontece dentro dos tribunais. Isso dará mais transparência ao Judiciário. Além disso, a transmissão irá trazer maior responsabilidade. Promotores, advogados, juízes, todos os envolvidos em um julgamento transmitido irão se preparar melhor", afirma.

Para tomar a decisão, Leandro Cano consultou todas as partes. Segundo ele, a defesa do acusado foi reticente no início, porém depois aceitou a proposta. "Eles viram que há mais pontos positivos que negativos na transmissão", conta. O juiz explica que a transmissão do caso poderá ser interrompida. "Sempre que houver necessidade vamos interromper as filmagens, seja para preservar a integridade do tribunal, seja para garantir que não haja violação do direito das partes".

As opiniões sobre a iniciativa não são unânimes. O desembargador Antônio Carlos Tristão Ribeiro, presidente da Seção Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, é contrário à transmissão. "A exposição pública de um julgamento não é salutar. A transparência é dada pelo próprio processo, com a participação do corpo de jurados. Até que me convençam do contrário, eu não autorizaria a transmissão de um julgamento", afirma.

O desembargador Miguel Marques e Silva, da 13ª Câmara Criminal do TJ-SP, também é contrário a transmissão. Ele explica que não há proibição, mas que na Escola de Magistratura recomendam que não haja a transmissão. "A decisão depende de cada caso. Eu sou contra para evitar que o julgamento vire um circo". Segundo ele, foi esse o caso do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, no ano passado, que teve todas suas sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça. "Parecia um circo. A Justiça precisa de tranquilidade", diz. Para o desembargador, a atuação dos envolvidos também pode ser afetada. "A transmissão pode interferir na qualidade do julgmaento pois os envolvidos, ao saberem que estão sendo filmados, podem não agir com naturalidade".

Ele concorda porém que a transmissão tem pontos positivos. "Se houvese a transmissão de todos os julgamentos, como regra geral, aí sim, seria positivo. A população iria se acostumando com os julgamentos, entendendo como funciona um Tribunal do Júri. Seria educativo", conclui.

Ao contrário dos desembargadores, o advogado criminalista Roberto Podval, é favorável à transmissão. Ele lembra que quando defendeu Alexandre Nardoni, acusado e condenado por matar a filha Izabel Nardoni, pediu que o julgamento fosse transmitido, mas teve seu pedido negado. "Acredito que foi o primeiro caso onde foi solicitada a transmissão. É uma forma de mostrar à população as razões do que foi decidido, o público consegue ver todas as argumentações e com isso sabe o porque da decisão. Uma vez demonstrada as fundamentações, tira o peso das costas dos jurados". Ele explica que normalmente as pessoas só tomam conhecimento do que acontece no tribunal do Júri pela imprensa, que não expõe todos os fundamentos. Podval ressalta porém que só o tempo e a experiência poderão dizer se a medida é realmente positiva.

O procurador de Justiça no Rio Grande do Sul Lenio Luiz Streck não vê obstáculo à transmissão dos julgamentos. "Qual é a diferença entre a transmissão das sessões do Supremo Tribunal e outros julgamentos de outros tribunais ou juizos singulares? Parece que nenhuma", compara.

O procurador conta que teve uma experiência positiva com transmissões, enquanto autava como promotor. "Quando Promotor de Justiça nas Comarcas de Itaqui, Restinga Seca e Panambi, todos os júris nessas cidades foram transmitidos pelas respectivas Rádios (Radio Cruzeiro do Sul, Integração e Panambi). A comunidade gostava muito, aumentando, inclusive, a aceitação das pessoas do encargo para ser jurado. Penso que, para sustentar a tese da possibilidade de transmitir os julgamentos, podemos invocar a publicidade dos atos, a transparência dos atos judiciais. Hoje em dia até as sessões do Tribunal de Contas são transmitidas pela TV", conta.

A transmissão do julgamento do Júri, em Guarulhos, a partir desta segunda-feira (11/3) será feita por um pool de empresas de comunicação que engloba tevês, rádios e internet. Ao todo, 11 testemunhas deverão prestar depoimento, sendo cinco de acusação, cinco de defesa e uma de juízo. Na sequência, haverá o interrogatório de Mizael Bispo de Souza, que sempre negou envolvimento no assassinato da advogada. A previsão é de que o julgamento dure entre quatro e cinco dias até o Conselho de Sentença decidir. 

Para garantir a tranquilidade do julgamento e o acesso da imprensa, o juiz Leandro Bittencourt Cano determinou à Secretaria de Transporte e Trânsito o isolamento do quarteirão onde fica o prédio do fórum, na Rua José Maurício, centro de Guarulhos. O acesso de pedestres também será restrito. Só passarão pela área interditada pessoas que tenham necessidade urgente de ir ao fórum.

TV no tribunal
O Judiciário brasileiro ocupa uma posição singular no mundo desde que o Supremo tribunal Federal passou a transmitir suas seções ao vivo, pela TV Justiça, em 2002. Coube também à TV Justiça fazer uma rara transmissão de julgamento pelo Tribunal do Júri. Aconteceu em 2009, quando recebeu autorização do Conselho Nacional de Justiça para mostrar o julgamento do ex-deputado federal pelo Acre Hildebrando Paschoal, acusado de homicídio, tráfico de drogas e corrupção. O deputado foi condenado a mais de 100 anos de prisão. Além de transmitir o julgamento, a TV Justiça distribuiu as imagens que filmou para as emissoras comerciais do Brasil e do exterior.

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