Financiamento habitacional

TRF-4 nega indenização por 'venda casada' da Caixa

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20 de maio de 2013, 13h49

Se não existir certeza de que todos os contratos habitacionais firmados pela Caixa Econômica Federal com seus mutuários estão viciados pela prática da ‘‘venda casada’’, não há como acolher o pedido de nulidade dos negócios jurídicos dentro de uma Ação Civil Pública. Logo, só se poderia cogitar do pagamento de indenização após o ajuizamento de demandas individualizadas, face à singularidade da relação jurídica contratual.

O entendimento levou a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região a negar Apelação do Ministério Público Federal e a manter sentença proferida pela Vara Federal de Bento Gonçalves, que mandou a Caixa se abster de condicionar a concessão de financiamento da casa própria à aceitação de outros serviços financeiros.

O acórdão destaca que, embora o reconhecimento da ilegalidade da ‘‘venda casada’’ no caso presente, não há irregularidade em todas as contratações. Em algumas hipóteses, a aquisição de produtos e serviços conexos ao mútuo habitacional acaba por favorecer o próprio mutuário, que recebe vantagens na quitação do crédito adquirido.

O precedente do colegiado é da lavra do próprio relator do recurso, desembargador federal Fernando Quadros da Silva, nos autos da Apelação Cível 5024388-21.2010.404.7100, em julgamento realizado no dia 21 de março de 2013. Naquele caso, como registra a ementa, ‘‘os mutuários não só tinham ciência inequívoca do que estavam contratando, como também buscavam obter vantagens de tal contratação através da redução substancial da taxa de juros contratada inicialmente’’.

Por fim, o desembargador-relator negou o pedido do MPF para que a Caixa fosse compelida a publicar o inteiro teor da sentença condenatória nos órgãos de imprensa. Isso porque o juízo de origem já havia determinado a afixação de cartazes junto à agências da empresa, ‘‘o que, a bem da verdade, atinge à finalidade de proteção a direitos individuais homogêneos, nos moldes objetivados pelo autor [MPF]’’. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 8 de maio.

O caso
O Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, ajuizou Ação Civil Pública, pedindo indenização para clientes que tiveram de adquirir outros produtos/serviços no momento de contratar financiamentos junto à Caixa Econômica Federal — a chamada “venda casada” — nos últimos cinco anos.

Conforme parecer do procurador regional da República Roberto Thomé, a Caixa vinha condicionando a liberação de financiamentos, especialmente a linha habitacional, à aquisição de outros produtos financeiros, sejam eles obrigatórios (seguros) ou não (abertura de conta, poupança, planos de capitalização etc). O procurador da República em Bento Gonçalves, Alexandre Schneider, disse que a queixa era recorrente entre os mutuários da região.

A ‘‘venda casada’’ é uma prática comercial vedada pelo artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor. Ela retira do consumidor a possibilidade de escolher livremente os produtos e serviços que lhes são oferecidos, além de não fornecer as informações necessárias que o fariam decidir pela compra.

O entendimento também é compartilhado pela Súmula 473 do Superior Tribunal de Justiça, que diz: "O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada".

Com base nas provas colhidas no Inquérito Civil aberto pelo MPF e naquelas produzidas em juízo, a Vara Federal de Bento Gonçalves entendeu que houve flagrante condicionamento da liberação do financiamento à compra de demais produtos do banco, e não simplesmente uma ‘‘sinalização’’ no sentido de que a liberação do financiamento seria mais fácil. Só não reconheceu a nulidade desses contratos, firmados nos últimos cinco anos e, por consequência, negou indenização aos lesados.

Assim, o juiz federal substituto Marcos Eduarte Reolon condenou a Caixa a se abster da prática abusiva, sob pena de pagar multa de R$ 10 mil para cada caso apurado descumprimento da medida judicial. O magistrado também determinou a afixação de cartazes nas sedes da instituição, para informar ao público acerca da desnecessidade de aquisição de outros produtos para liberação de empréstimo.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão. 

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