Pesquisa acadêmica

Acórdãos do STF aumentam de tamanho após TV Justiça

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20 de maio de 2013, 17h37

Os críticos da TV Justiça têm razão num ponto. A partir da transmissão ao vivo dos julgamentos, os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal ficaram mais longos e o número de decisões colegiadas caiu. Ao menos no caso das Ações Diretas de Inconstitucionalidade. Por outro lado, quem apostou que a TV Justiça traria queda na produtividade da Corte errou feio. A quantidade de decisões individuais dos ministros mais que dobrou desde o início das transmissões.

As conclusões fazem parte de uma pesquisa do procurador do Rio de Janeiro Felipe de Melo Fonte, que comparou a produção média da corte dos períodos anterior e posterior à transmissão dos julgamentos. No ar desde agosto de 2002, a TV Justiça divide opiniões entre acadêmicos, advogados, magistrados e antigos membros do Supremo.

O ministro aposentado Moreira Alves, por exemplo (27 anos de STF), sempre deixou clara sua contrariedade com a TV Justiça e sua impressão de que os votos ficaram maiores. “Os julgamentos se prolongaram pela extensão dos votos. Na minha época, eram menores. Hoje falam para aparecer mais na televisão”, disse à ConJur em agosto do ano passado.

Pois foi justamente para sanar parte dessa desconfiança que Melo Fonte reuniu e comparou dados da corte de 1990 a 2002 e de 2003 a 2011. No período anterior à transmissão dos julgamentos, o Supremo publicou, em média, 180 acórdãos por ano, com 18 páginas cada. Após o advento da TV Justiça o número caiu para 118 acórdãos por ano, de 29 páginas cada um. Dessa forma, enquanto a quantidade de acórdãos caiu 34%, o número de páginas lidas subiu 59%. A conta baseou-se apenas nos casos de ADI, por ter sido o instrumento que menos alterações sofreu ao longo dos 22 anos de dados que a pesquisa abarca.

Já o total de julgamentos, incluindo todas as classes processuais, aumentou: passaram de uma média anual 46,4 mil entre 1990 e 2002, para 115 mil ao ano entre 2003 e 2011. Mais que o dobro.

“É um fato inequívoco que os acórdãos cresceram consideravelmente. Na medida em que há acórdãos maiores, e uma dinâmica de plenário em que os ministros se habituaram a ler os votos, pela lógica, há menos tempo para julgar os demais processos”, afirma Melo Fonte, que faz questão de ressaltar o aumento dramático da produtividade individual dos ministros. Entre 1990 e 2002, cada membro do STF proferiu 4,2 mil decisões por ano, número que saltou para 10,4 mil no período de 2003 a 2011. “Um ministro da era pós-TV Justiça passou a valer dois ministros da era pré-TV Justiça”, compara Melo Fonte.

Aluno do constitucionalista Luis Roberto Barroso no doutorado em Direito Público da UERJ e ex-assessor do ministro Marco Aurélio, o procurador do Rio de Janeiro é entusiasta da TV Justiça. Ele vê como positiva a transmissão dos julgamentos.

“Há um certo consenso na doutrina constitucional de que qualquer tribunal precisa ter algum esteio na opinião pública para que ele se mantenha. As instituições precisam estar ancoradas em um ideário popular para que permaneçam funcionando bem. As pessoas podem não concordar com o resultado final, mas concordam com a necessidade de uma corte constitucional, e a TV Justiça reforça esse consenso”.

Para ele, a busca do Supremo por legitimidade não implica em qualquer risco para a qualidade das decisões. “A função do Supremo não é agradar as massas, mas sim de guardar o texto constitucional e o direito de um modo geral. Ouvir a opinião popular ajuda a evitar erros grosseiros”, defende.

Divergência
Para a professora Maria Teresa Sadek, da USP, é muito complicado atribuir a um único fator o aumento no tamanho dos votos e a queda nas decisões colegiadas do Supremo. "É muito difícil isolar a variável exposição na mídia sem trabalhar conjuntamente outras variáveis como o tema julgado e a composição da corte".

Opinião semelhante também tem o professor Dimitri Dimoulis, da Escola de Direito da FGV, para quem é arriscado estabelecer uma relação de causa e efeito entre a TV Justiça e o tamanho dos votos dos ministros.

“Isso tem muito mais a ver com o comportamento dos litigantes, escolha ou não de temas importantes, mudanças na lei e na Constituição e comportamento dos advogados, que pensam como substituir o Recurso Extraordinário. Se ninguém tivesse se mobilizados sobre união de pessoas do mesmo sexo ou sobre anencefalia, o Supremo não teria decidido sobre isso. Esses são os casos de um voto longo e circunstanciado”.

Para Dimoulis, não são os ministros que procuram aparecer na imprensa, mas a imprensa que os procura. “Eles estão dando um retorno, atendendo essa demanda incrível de entrevistas, declarações, críticas, como acontece com os políticos”.

Na avaliação do professor, não há qualquer sinal de que a TV Justiça exerça influência na forma dos ministros decidirem os julgamentos. “No julgamento de união de pessoas do mesmo sexo, a sociedade estava dividida, mas o Supremo foi unânime”, exemplifica. Para ele, a única influência que a TV Justiça pode exercer sobre o comportamento dos ministros está restrita ao guarda roupa: “Talvez o ministro escolha a gravata dele melhor”.

Clique aqui para ler a pesquisa de Felipe de Melo Fonte.

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