Novas demandas

CLT precisa de atualização, diz presidente do TST

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1 de maio de 2013, 15h12

Ao completar 70 anos nesta quarta-feira (1º/5) a Consolidação das Leis do Trabalho, indiscutivelmente precisa de atualização, disse o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Carlos Alberto Reis de Paula. No cargo desde março de 2013, o ministro explicou que atualizar as normas, no entanto, não significa flexibilizar o direito trabalhista no sentido de reduzir as garantias dos trabalhadores.

Reis de Paula enfatizou a necessidade de a CLT compreender normas referentes às novas demandas do mercado de trabalho e de regulamentar o trabalho terceirizado que, atualmente, é regido por decisões de tribunais trabalhistas. Sobre os novos direitos dos empregados domésticos, recentemente equiparados aos dos demais trabalhadores pela Emenda Constitucional 72, o ministro admitiu que, temporariamente, deverá haver aumento das ações na Justiça entre empregados e empregadores.

Para ele, a sociedade deverá se adaptar às novas condições impostas pela PEC das Domésticas. Reis de Paula ainda falou sobre a viabilidade da Proposta de Emenda Constitucional do Trabalho Escravo e sobre trabalho infantil.

Leia a entrevista com o presidente do TST à Agência Brasil:

O senhor defende a atualização da CLT, especialmente no sentido de flexibilizar-se para atender às novas demandas do mercado de trabalho?

Carlos Alberto Reis de Paula – É indiscutível que a CLT precisa de atualização. Há preceitos, normas e dispositivos que são antigos. Mas eu não gosto quando se fala em flexibilizar. Quando se diz isso, a ideia que eu tenho é que se vai mudar a filosofia que preside a CLT, que é a valorização do trabalho. Quanto a esse valorizar, ter o trabalhador como destinatário final é intocável. A CLT é um desafio à reflexão. É preciso que encontremos caminhos para que a CLT dialogue com a sociedade de hoje.

Quais são os pontos mais sensíveis nessa legislação?
Reis de Paula –
Em primeiro lugar, o problema da terceirização. É necessário haver uma regulamentação sobre isso. Hoje tratamos a terceirização baseados em decisões de tribunais, que podem ser repensadas. Eu não sei se a linguagem ou o enfoque são os mais adequados ao mundo de hoje. Também acho indispensável que cuidemos, na CLT, da tecnologia da informação, do trabalho à distância, do teletrabalho, entre outras coisas que decorrem desse fenômeno que é a comunicação. Como se faz um contrato nessa área? Como se estabelece a jornada de trabalho? O que significa hora à disposição? Esses são temas que estão em aberto.

Sobre terceirização, quais os caminhos que uma legislação sobre o tema pode tomar?

Reis de Paula –
Há duas questões nevrálgicas. A primeira: o que pode ser objeto de terceirização? Toda e qualquer atividade? A meu ver, não pode. Fico sempre a pensar que, para se terceirizar, deve-se exigir especializações, e não fazê-la [a terceirização] de forma genérica. A segunda: a responsabilidade. Qual é a responsabilidade daquele que toma o serviço? Quando se fala em terceirização, parte-se da da premissa de que há quem oferta e há quem toma um serviço. Qual a responsabilidade da parte que toma o serviço? Acredito que temos de caminhar com cautela, no sentido de estabelecer a responsabilidade solidária desse tomador.

Sobre os direitos recentemente estendidos aos empregados domésticos, o senhor acredita que a quantidade de ações judiciais vai aumentar, ou ainda é cedo para prever?
Reis de Paula –
Pode-se fazer uma previsão. Há as matérias que dependem de regulamentação, que deve ser feita de forma muito objetiva e criteriosa, mas sem entrar em muitas minúcias. Caso contrário, vamos entrar no universo dos debates e das interpretações variadas, o que é um péssimo negócio. Se a regulamentação seguir alguns critérios de objetividade, simplicidade e capacidade de síntese, acho que podemos reduzir o numero de ações. Indiscutivelmente, eu prevejo a maior incidência de ações, sobretudo no principio. É uma novidade, vários empregados e empregadores vão entrar com ações.

No que diz respeito à regulamentação desses direitos, há algum ponto específico sobre o qual os legisladores devam ter mais atenção?

Reis de Paula –
Um dos temas mais importantes do ponto de vista prático é a jornada de trabalho dos empregados domésticos, que é variável e depende de alguns contextos. A criação de um banco de horas está em curso e talvez seja uma solução. Mas há atividades do trabalho doméstico que precisam ser regulamentadas de forma específica — o que já pode ser fixado por meio da normatização que está sendo discutida. Por exemplo, no caso dos cuidadores e babás, em que há nuances. No caso do percentual da multa sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço para a demissão sem justa causa, isso vai depender de opção política. O FGTS tem dois aspectos: primeiro, a forma de recolher; o segundo, a multa — o que, para mim, é uma opção que o legislador vai ter que fazer. Outra questão sensível é a justa causa. O conceito genérico nós sabemos. O ponto é como isso vai se traduzir para o trabalhador doméstico. Podem haver imperícias.

A implementação da PEC do Trabalho Escravo, que prevê a expropriação de terras rurais e urbanas caso seja encontrado o uso de mão de obra em condições análogas à escravidão é viável?

Reis de Paula –
É viável. Nós somos fruto dos nosso atos e costumes. O Brasil está em pleno século 21 e temos costumes que nos assustam, como ter alguém que presta serviço em regime de escravidão. Apesar de a PEC ser viável, é possível adotarmos posições intermediárias para alguém que é pego com trabalho escravo — em vez de perder imediatamente a sua propriedade. Pode ser aplicada uma penalidade para que a pessoa seja educada nesse sistema. Uma coisa é ser punido pela primeira vez, outra, ser reincidente. O legislador tem de ter muito bom senso. A desapropriação é uma penalidade que se pode cogitar e que deve, sim, ser aplicada, em determinadas situações.

A diferenciação entre a exploração de mão de obra infantil e os casos em que há aprendizado por parte da criança no mercado de trabalho é um ponto relativamente polêmico. Qual a opinião do senhor sobre isso?

Reis de Paula – O problema de trabalho infantil é o de que não se poder impedir a criança de viver a infância. Esse é um critério complicado e fundamental, porque se esse trabalho impede a educação — e brincar faz parte da educação — e ele não tem esse direito, isso, a meu ver, é trabalho infantil que há de ser punido. Eu não sei se é um critério bom ou ruim. No final das contas, fica a cargo da inspeção do trabalho quando vão fiscalizar se aquela é uma situação de trabalho infantil. Há muitas realidades diferentes. Tudo depende das circunstâncias em que as coisas são prestadas. O fiscal tem de relatar os fatos, o que permite que nele não seja o único intérprete da situação e que outros interpretem os fatos também. Eu acredito que todos nós temos parâmetros de bom senso e temos de usá-los. 

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