Planos de saúde

Relações de consumo devem ser harmônicas e de confiança

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  • Maria Stella Gregori

    é advogada de Gregori Sociedade de Advogados professora de Direito do Consumidor da PUC-SP diretora do Brasilcon e ex-diretora da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

16 de junho de 2013, 9h01

Nos 15 anos da Lei dos Planos de Saúde, à luz da proteção do consumidor, é possível comemorar alguns fatores, mas ainda é necessário dar alguns largos passos para alcançar a sensação de vitória. O marco regulatório do sistema de saúde privado, também chamado supletivo ou suplementar, surgiu com aprovação da Lei 9.656/1998, e das medidas provisórias que sucessivamente a alteraram. Hoje está em vigor a Medida Provisória 2.117-44/01, que dispõe sobre os planos privados de assistência à saúde, incluindo, também, nessa terminologia, os Seguros-Saúde, que aguardam, até hoje, deliberação do Congresso Nacional.

A Lei dos Planos de Saúde impõe uma disciplina específica para as relações de consumo na saúde suplementar, além de estabelecer normas de controle de ingresso e permanência nesse mercado, a fim de preservar sua sustentabilidade e transparência. Ela resulta de um processo de construção de um conjunto de direitos do cidadão/consumidor, cujas raízes estão na Constituição Federal de 1988 e os fundamentos no Código de Defesa do Consumidor, lei de cunho geral e principiológico. Esse sistema privado, a partir de 2000, passou a se submeter à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), agência reguladora o Ministério da Saúde incumbida de fiscalizar, regulamentar e monitorar o mercado de saúde suplementar.

Não se tem dúvida de que o Brasil dispõe de um sistema normativo avançado, possui órgãos de proteção e defesa do consumidor e agência reguladora, que atuam, no intuito de inibir práticas lesivas e promover a estabilidade do mercado. Atualmente, o Brasil encontra-se em rota acelerada de desenvolvimento, mesmo ainda sendo um país muito desigual em questões econômicas e sociais. Situa-se entre os países mais importantes do planeta, tem apresentado crescimento econômico, redução dos índices de desemprego e das diferenças entre classes econômicas. O aumento de renda do cidadão tem levado ao aumento do consumo de bens e serviços. Tanto o consumidor como os fornecedores estão mais conscientes e seletivos em relação aos seus direitos e deveres.

No tocante à saúde, o Brasil encontra-se em situação semelhante aos demais países, com o envelhecimento da população, somada a uma expectativa positiva de vida mais longa, com custos assistenciais subindo rapidamente em função da vertiginosa incorporação de novas tecnologias, levando-se em conta que os recursos são finitos. Segundo dados da ANS, 2012 terminou com 66,5 milhões de consumidores com planos de saúde, sendo 47.9 milhões em planos assistenciais e 18,6 milhões em planos exclusivamente odontológicos, e 1.121 operadoras de planos de assistência à saúde ativas, com um faturamento de R$ 95 bilhões, o que representa uma alta de 12,2%, quando comparado ao desempenho de 2011. O restante da população brasileira é atendido somente pelo SUS.

No âmbito da proteção ao consumidor, há avanços trazidos pelo marco regulatório, entre outros, a transparência dos contratos, a definição de uma política de preço dos planos, a delimitação de carências, a proibição de discriminação de consumidores, a implementação do instrumento de portabilidade de carências, a determinação de prazos máximos para marcação de consultas e exames, a obrigatoriedade da operadora informar o motivo da negativa de cobertura, as regras institucionais e econômico-financeiras para as operadoras. A ANS tem se mantido ativa, no sentido de eleger temas prioritários para a regulação no que se refere à proteção do consumidor.

Entretanto, ainda, verificam-se conflitos nas relações de consumo nesse setor, que acabam sendo dirimidas pelos órgãos de defesa do consumidor, pela ANS e pelo Poder Judiciário. Segundo dados do Sindec do Ministério da Justiça, em 2012, os Procons receberam 1,35% de demandas referentes aos planos de saúde, especialmente, sobre assuntos pontuais, da Lei 9.656/1998 e de sua regulamentação, que não se compatibilizam com os princípios que norteiam os comandos do Código de Defesa do Consumidor.

A proteção do consumidor no Brasil acaba de ser elevada à política de Estado, com a criação do Plano Nacional de Consumo e Cidadania, inaugurando uma nova era, ao estabelecer um conjunto de medidas para garantir a melhoria na qualidade de produtos e serviços, priorizar o direito à informação e o atendimento ao consumidor.

Nessa nova era que se inicia, que uns chamam de Era do Diálogo, outros de Era de Resultados ou, ainda, Era da Confiança, precisamos nos sentir vitoriosos — isto é, sem conflitos ou pelo menos que eles reduzam consideravelmente, ou seja, que as relações de consumo sejam harmônicas e de confiança.

Para tanto, faz-se urgente a participação e o envolvimento de todos os atores desse setor, desenvolvendo uma agenda comum visando resultados positivos. É imprescindível que esse debate se inicie, imediatamente, no intuito de aperfeiçoar o sistema, resolvendo as incompatibilidades legais existentes à luz da lei consumerista, na busca da consolidação de um mercado de saúde suplementar responsável, transparente, ético e justo. Isto quer dizer, em outras palavras, a efetiva construção de um setor virtuoso, com ganhos reais, onde todos os agentes podem se beneficiar, buscando o tão almejado equilíbrio econômico, social e ambiental para a atual e as futuras gerações. O futuro da saúde suplementar será o que dela nós fizermos. O que significa: a responsabilidade é de todos nós e de cada um de nós.

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