O constitucionalista

Senado aprova nome de Luís Roberto Barroso para o STF

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5 de junho de 2013, 17h48

O plenário do Senado aprovou, por 59 votos a 6, a nomeação do constitucionalista Luís Roberto Barroso para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. O advogado e procurador do estado do Rio de Janeiro foi indicado pela presidente da República, Dilma Rousseff, para ocupar a cadeira do ministro aposentado Ayres Britto. Na tarde desta quarta-feira (5/6), Barroso foi sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, onde sua indicação foi aprovada por 26 votos a um. No início da noite, seu nome foi aprovado pelo plenário da Casa.

Antonio Cruz | ABr
A sabatina durou sete horas e foi marcada por perguntas técnicas, ao contrário do que ocorreu na primeira sessão em que o último ministro indicado, Teori Zavascki, foi sabatinado. Na ocasião, os senadores pareciam apenas querer saber se Teori votaria na Ação Penal 470, o processo do mensalão. Desta vez foi diferente. Houve poucas perguntas sobre casos concretos e mais questões técnicas, sobre Justiça.

Barroso, que terminou a sabatina visivelmente emocionado, não fugiu a nenhuma pergunta. Abordou até mesmo os temas que virá a julgar como ministro. Ainda que sem deixar claro seu voto, falou em tese sobre todos os assuntos, inclusive sobre o processo do mensalão. Neste caso, minimizou sua participação no julgamento do caso. Explicou que nas questões controversas, o placar no Supremo está cinco votos a quatro. Se o ministro Teori aderir à corrente majoritária, seu voto seria irrelevante. Já se aderir à corrente vencida, aí sim caberia a ele desempatar.

Senadores quiseram saber como se deu o processo político de sua indicação para o posto de ministro do Supremo. Alguns justificaram a pergunta dizendo que “houve notícias de atos não muito republicanos” em indicações recentes. Se referiram veladamente às notícias de que o ministro Luiz Fux teria procurado o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, réu no mensalão, para pedir seu apoio.

O advogado e procurador do estado do Rio de Janeiro disse ter sido pego de surpresa pela indicação. Afirmou não ter procurado apoio político e citou as pessoas que conversaram com ele sobre a possibilidade: o advogado Sigmaringa Seixas, o secretário executivo da Casa Civil Beto Vasconcelos e o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo. O que revela que os três estão entre os principais conselheiros da presidente Dilma no que toca à indicação de ministros e juízes. “O seu nome é um dos nomes que a presidente está considerando”, disse a ele Sigmaringa Seixas. Além destes, disse ter conversado sobre o assunto apenas com a própria presidente.

Reforma política, indicação de ministros com participação popular, sua defesa no caso de Cesare Battisti, interferência do Judiciário nas atribuições do Poder Legislativo, maioridade penal, caos penitenciário. O leque de temas submetidos à apreciação do advogado foi amplo.

Sobre reforma política, o advogado disse que sonha com uma reforma que pudesse baratear as eleições, dar autenticidade programática aos partidos e dar sustentação ao chefe do Poder Executivo independentemente de negociação a cada votação. “Mas esse é uma questão política, que depende do Congresso Nacional. O Supremo pouco pode fazer”, afirmou.

Os senadores quiseram saber, por exemplo, a opinião de Barroso sobre a possibilidade de o Ministério Público conduzir investigações penais. Segundo ele, no sistema brasileiro, a investigação policial é a regra. “E acho bom que esta continue sendo a regra”, afirmou. Para o advogado, a investigação pelo MP é possível, salvo se o Congresso aprovar emenda que diga diferente. “No quadro atual, o Ministério Público pode investigar como exceção, e em alguns casos acho até que deve. Mas não se deve dar a ele poder ilimitado. A legislação tem de disciplinar as hipóteses”.

A questão posta em debate na CCJ tem sido alvo de discussões no Congresso, por conta da tramitação da Proposta de Emenda à Constituição 37, que pretende garantir à polícia a exclusividade na condução de investigações criminais. Enquanto membros do Ministério Público argumentam que o órgão tem o poder de presidir investigações, advogados e delegados concordam que o MP, por ser o titular dos processos criminais, não pode ser o responsável pelas investigações. Além disso, argumentam que o MP não tem regras para a investigação, ao contrário da polícia.

Tensão entre poderes
A tensão entre os limites de atuação dos poderes Judiciário e Legislativo no cenário nacional deu o tom da sabatina. Grande parte das perguntas girou em torno do chamado ativismo judicial e de recentes decisões do Supremo, como a que reconheceu a união estável homoafetiva e a que permitiu a gestantes interromperem a gravidez de fetos anencéfalos. Casos nos quais Barroso atuou no STF.

O advogado fez uma distinção entre a judicialização da vida e o ativismo judicial. De acordo com Luís Roberto Barroso, a judicialização decorre da própria Constituição Federal, que é grande e discorre sobre muitos temas. Segundo ele, ao colocar um tema na Constituição, fixa-se, de pronto, a possibilidade de que ele seja levado à Justiça. Já o ativismo “é primo da judicialização, não é a mesma coisa”.

Barroso afirmou que o ativismo é uma postura de interpretação mais expansiva do Poder Judiciário criando uma regra específica que não estava prevista. “Quando há uma manifestação política do Congresso ou do Executivo, o Judiciário não deve ser ativista, deve respeitar a posição política. Mas se não há regra, o Judiciário deve atuar”, disse.

Como exemplo, o advogado citou o julgamento que tratou da anencefalia: “A medida foi criativa? Sim. Foi desrespeitosa ao Congresso Nacional? Não. Porque quando o Congresso deliberar sobre o tema, será a palavra dele que valerá. Onde faltar uma norma, mas houver um direito fundamental a ser tutelado, o Judiciário deve atuar. Mas isso não impede o Congresso de deliberar, depois, sobre o tema”.

O professor definiu da seguinte forma o que considera os marcos do Judiciário no ativismo judicial: onde há regra expressa, vale a decisão do processo político majoritário. Ou seja, deve-se respeitar a deliberação do Congresso Nacional. Onde não há regra, o Judiciário pode avançar, ainda que com certo comedimento. “Mas onde haja o direito fundamental de uma minoria em jogo, o Judiciário deve ser mais diligente e atento”, e atuar com mais vigor.

Ainda segundo Barroso, jamais viria do processo político majoritário o fim da discriminação aos negros nos Estados Unidos, por exemplo. No caso, o fim a segregação estatal se deu a partir de uma decisão judicial que permitiu a uma menina negra frequentar a escola pública que, até então, era restrita a alunos brancos, no famoso caso Brown x Board of Education. “No mundo inteiro, as minorias são protegidas por tribunais constitucionais.”

Outro exemplo usado pelo sabatinado, de quando considera que um princípio constitucional pode excepcionar, no caso concreto, a incidência de uma regra legal, foi o teto de remuneração fixado pelo Congresso na reforma da Previdência. Ao julgar o tema, o STF entendeu que a norma não se aplicava à gestante que estava em licença maternidade. “E fez bem. Esta limitação tornaria a posição da mulher no mercado de trabalho inferiorizada”, disse Barroso.

Questionado sobre os limites da atribuição do Senado no controle de constitucionalidade, tema em discussão no Supremo, Barroso afirmou que é da Casa Legislativa a prerrogativa de transformar aquela decisão individual em decisão geral. Na linguagem jurídica, dar efeito erga omnes a ela. “Há uma norma expressa na Constituição que diz que o Senado deve exercê-la”. De acordo com ele, é até interessante a ideia de dar efeito geral às decisões do Supremo mesmo em processos de controle difuso, como defende o ministro Gilmar Mendes, Mas, no caso, a regra expressa diz outra coisa e ela deve ser respeitada.

Filtros para o STF
O modelo de indicação para cargos de ministro do Supremo fixado na Constituição brasileira foi exaltado pelo sabatinado. Ele até brincou: “Talvez eu não seja a pessoa mais isenta para falar desse assunto na posição que estou”.

Deu o exemplo do modelo alemão, onde a escolha é feita pelo Poder Legislativo. “Mas as circunstâncias da Alemanha ajudam”, disse. Lá, os partidos, independentemente da representatividade de suas bancadas, se alternam na indicação. “Eu prefiro a fórmula brasileira. O presidente tem uma responsabilidade pessoal muito nítida. Esta possibilidade de reconduzir a responsabilidade política a um agente político eletivo, eu acho melhor.”

Falou também sobre a possibilidade de se estabelecer mandatos para ministros do Supremo. Afirmou que não considera a ideia necessariamente ruim, mas que prefere o modelo atual, de vitaliciedade. E deu como exemplo o ministro Dias Toffoli, que tomou posse do cargo no STF com 42 anos de idade. “Com o termine do mandato, o que faria o ministro? Voltaria para a advocacia. Dessa forma, em que o Supremo seria uma instancia de passagem, seria ruim para o Supremo e para a advocacia o mandato. O que essas pessoas fariam se no auge de sua forma física e intelectual deixassem o tribunal?”, questionou. E completou: “Mas o debate público sobre o tema no Senado pode ser mais abrangente”.

Barroso também defendeu mais filtros para o Supremo Tribunal Federal. Respondia a pergunta do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), autor de proposta igual à feita pelo ministro aposentado do STF, Cezar Peluso, que transforma os recursos ao Superior Tribunal de Justiça e ao STF em espécies de ações rescisórias. Na prática, a decisão transitaria em julgado, ou seja, se tornaria definitiva e passível de execução imediata, na segunda instância.

Para o advogado, em regra, os processos deveriam mesmo terminar em segundo grau. Ele não demonstrou, contudo, apoio ou entusiasmo à proposta específica. Também disse que o Supremo julga questões demais. “O Supremo Tribunal Federal utilizou a Repercussão Geral de forma que já reconheceu mais processos com repercussão do que casos que possa julgar nos próximos 15 anos. A Repercussão Geral deixou de ser solução e virou problema”, afirmou. Em sua opinião, o Supremo precisa de filtros mais eficientes e radicais para que possa julgar os temas que repercutam, de fato, sobre toda a sociedade.

Foram feitas poucas perguntas sobre o processo do mensalão. Apenas os senadores Álvaro Dias (PSDB-PR) e Pedro Taques (PDT-MT) abordaram a Ação Penal 470. Dias o fez explicitamente. Barroso reafirmou que o que escreveu na Retrospectiva 2012 sobre Direito Constitucional para a revista Consultor Jurídico. Segundo ele, o Supremo tinha endurecido sua jurisprudência penal. “O mensalão foi, por muitas razões, um ponto fora da curva.” Mas ressaltou que não irá julgar o caso com nenhum critério além das leis e de suas convicções. “Nem governo, nem imprensa, nem acusados vão me pautar. Vou fazer o que acho certo”, disse.

Taques abordou a possibilidade de embargos infringentes, também em discussão no Supremo. Os embargos, que podem mudar o mérito de algumas condenações, são previstos no Regimento Interno do STF, mas não na lei que regula o processo do âmbito do Supremo. “O Regimento Interno do Supremo tem status de lei”, se limitou a dizer. Não respondeu se o regimento é ou não compatível com a lei posterior ao Regimento. Ele participará da votação do tema no Supremo.

*Texto alterado às 19h40 do dia 5 de junho de 2013 para atualização.

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