Insegurança jurídica

TRF-4 derruba parecer da Fazenda contra coisa julgada

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31 de julho de 2013, 16h22

O parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional que orienta a atuação dos procuradores nos casos que discutem tributos já declarados constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal sujeita a coisa julgada ao ato administrativo. Dessa forma, viola o princípio da separação de poderes e atenta contra a segurança jurídica do país. Com esse entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, manteve sentença que impediu o fisco de cobrar Cofins de um escritório de advocacia pelas regras do documento.

A discussão é a respeito do Parecer 492 da PGFN. O texto diz que, se o STF já tiver declarado a constitucionalidade de determinado tributo, a Procuradoria da Fazenda pode determinar o encaminhamento dos autos à Delegacia Tributária para que o contribuinte seja autuado.

Em Mandado de Segurança anterior, o mesmo escritório já havia conseguido a isenção da Cofins, tal como estabelecida pelo artigo 6º, da Lei Complementar 70/1991, com o afastamento do que dispõe o artigo 56, da Lei 9.430/1996. O pleito foi reconhecido por decisão da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar Recurso Especial em 2002.

Para o relator da apelação em reexame necessário, desembargador Otávio Roberto Pamplona, uma vez regrada a relação jurídica pela normativa individual emitida pelo Judiciário, salvo a superveniência da lei, ‘‘somente este poderá examinar a conservação e a permanência daquele regramento individual em relação aos fatos futuros”.

A desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch, que votou afinada com o relator, explicou que os institutos da segurança jurídica e da coisa julgada foram erigidos à categoria de direitos fundamentais, conforme o artigo 5º, caput, e inciso XXXVI.

‘‘Assim, sua concretização depende de uma série de condições que não permitam seu desvirtuamento no cotidiano das relações jurídicas. Em virtude dessas condições, são mínimas as situações em que podem ceder em nome de outros princípios da mesma envergadura — por exemplo, a igualdade’’, ilustrou.

No atual sistema constitucional, discorreu a desembargadora, a proteção aos direitos fundamentais constitui cláusula pétrea. Logo, não se admite, no texto constitucional, alterações que venham a restringi-la.

‘‘Ademais, a separação de poderes do Estado também constitui cláusula pétrea, não se admitindo que posterior emenda constitucional amplie a competência do Supremo Tribunal Federal nos casos de controle difuso de constitucionalidade, de maneira a dar efeitos erga omnes [vale contra todos e não só para as partes em litígio] a decisões ali tomadas, sob pena de violação da competência do Senado Federal para tanto’’, concluiu. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 16 de julho.

O caso
O escritório Bernardon e Gerent Advogados Tributaristas Associados entrou com Mandado de Segurança na 2ª Vara Federal Tributária de Porto Alegre para se eximir do pagamento da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) nos moldes do Parecer PGFN/CRJ 492, de 7 de fevereiro de 2011.

Alegou estar isento da cobrança por decisão judicial transitada em julgado no STJ e não mais sujeita à revisão por Ação Rescisória. O Mandado de Segurança que lhe garantiu a isenção havia sido impetrado na 3ª Vara Federal da Capital.

O parecer estabelece diretivas para a atuação da PGFN em relação a tributos cuja constitucionalidade é afirmada pelo STF, quando existente em favor do contribuinte decisão transitada em julgado reconhecendo a inconstitucionalidade.

As diretivas possuem força para impactar ou alterar os seguintes precedentes do STF: todos os formados em controle concentrado de constitucionalidade, independentemente da época em que prolatados; quando posteriores a 3 de maio de 2007, aqueles formados em sede de controle difuso de constitucionalidade, seguidos, ou não, de Resolução Senatorial, desde que, nesse último caso, tenham resultado de julgamento realizado nos moldes do artigo 543-B do CPC; quando anteriores a 3 de maio de 2007, aqueles formados em sede de controle difuso de constitucionalidade, seguidos, ou não, de Resolução Senatorial, desde que, nesse último caso, tenham sido oriundos do Plenário do STF e confirmados em julgados posteriores do Supremo.

Em outras palavras, não sendo cabível o ajuizamento de Ação Rescisória, o procurador da Fazenda Nacional pode encaminhar cópia dos respectivos autos judiciais à Delegacia da Receita Federal do domicílio fiscal do contribuinte-autor, para dar início aos procedimentos de cobrança administrativa do tributo após o advento do precedente do STF ou da publicação do Parecer.

A sentença
Em sentença proferida em 5 de dezembro de 2012, a juíza substituta Elisângela Simon Caureo confirmou a liminar concedida, determinando ao fisco que se abstenha de exigir o tributo aos moldes do que prevê a diretiva da Fazenda Nacional.

"Não há dúvida que o Parecer 492/2011 merece efetivamente os questionamentos que lhe foram apresentados. Sujeitar a desconstrução de uma decisão judicial transitada em julgado ao exame exclusivamente administrativo fere não só a segurança jurídica ou a proteção da confiança, mas também a separação dos poderes", considerou a juíza.

Em sua avaliação, não há compatibilidade, hoje, entre o que é proposto no Parecer e o modelo de controle de constitucionalidade vigente. Isso porque a coisa julgada continua sendo direito e garantia individual, conforme o artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Constituição. Destacou que toda relativização deve vir da lei, conforme prevê o artigo 741 do Código de Processo Civil, ou da clara sinalização da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

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