Processo administrativo

OAB-RJ quer advogados em julgamentos fiscais na Receita

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17 de julho de 2013, 10h53

Os advogados que defendem empresas em processos administrativos na Receita Federal devem poder participar das sessões de julgamento de primeira instância, nas Delegacias Regionais de Julgamento, com base nos príncípios da publicidade, da paridade de armas e da ampla defesa. O argumento fundamenta ofício que vai ser entregue nos próximos dias pela seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro à Superintendência da Receita Federal no estado. No documento, a entidade dá o pontapé inicial na discussão ao criticar o fato de as sessões de julgamento de contestações a autos de infração serem fechadas, sem a participação de partes e de seus advogados, mesmo sendo julgamentos colegiados.

Segundo os fiscais, é o Decreto 70.235/1972, com redação dada pela Medida Provisória 2.158-35, de 2001, que define que as sessões devem ser fechadas, uma vez que a deliberação é interna do Fisco. O inciso I do dispositivo afirma que o julgamento administrativo compete, “em primeira instância, às Delegacias da Receita Federal de Julgamento, órgãos de deliberação interna e natureza colegiada da Secretaria da Receita Federal”.

Para a Comissão de Estudos Tributários da OAB-RJ, a limitação impede que o advogado exerça sua função na defesa dos clientes, prevista no artigo 7º do Estatuto da OAB. “O Estatuto permite ao advogado o acesso a todos os lugares”, defende o presidente da comissão, Maurício Pereira Faro. Segundo ele, o pedido, que atende a demandas de tributaristas e foi aprovado por unanimidade na comissão, é para que os advogados sejam intimados previamente quando o caso de um cliente entrar na pauta de julgamento; para que os defensores tenham acesso às salas de reunião; e que possam fazer sustentação oral e esclarecimentos de questões de fato quando necessário.

Segundo o vice-presidente da comissão, Gilberto Fraga, a participação dos advogados nas sessões pode trazer mais qualidade aos debates dos casos, que muitas vezes envolvem bilhões de reais em autuações fiscais. Ele lembra que a participação não violaria o sigilo fiscal dos contribuintes porque apenas os advogados das partes julgadas participariam da sessão. Para Maurício Faro, isso fica comprovado na forma como julga a instância superior da Receita, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, em Brasília, que permite a participação e a sustentação dos advogados.

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Felipe Santa Cruz - 25/10/2012 [Divulgação]Caso o ofício não seja atendido ou respondido pela Receita do Rio, a intenção é judicializar o pleito, de acordo com o presidente da seccional, Felipe Santa Cruz (foto). “O processo administrativo é público e cabe Mandado de Segurança para o cumprimento da regra. A Receita deve editar uma portaria a respeito”, diz. No ofício, a Ordem cita o exemplo do órgão fiscal de julgamento do estado do Rio de Janeiro — o Conselho de Contribuintes —, que permite a presença dos defensores nas sessões.

Em artigo publicado pela revista Consultor Jurídico nesta segunda-feira (15/7) — clique aqui para ler —, o presidente e o vice da Comissão de Direito Tributário da OAB-RJ criticaram o que chamam de julgamentos secretos na Receita. “Para estarrecimento de todos, as sessões de julgamento sempre foram fechadas e revestidas de um sigilo absolutamente injustificado e divorciado de qualquer respaldo lógico ou jurídico”, afirmaram Faro e Fraga. Eles comparam o procedimento a práticas comuns na ditadura militar. “É lamentável que ainda hoje estejamos a discutir tão óbvia prerrogativa que muito nos lembra o que se convencionou denominar ‘anos de chumbo’, em que comezinhas garantias fundamentais dos cidadãos eram absurdamente violadas.” 

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Sandro Serpa - 16/07/13 [Divulgação]Sigilo e estrutura
Para o subsecretário de Tributação da Receita Federal Sandro de Vargas Serpa (foto), a requisição esbarra na proteção ao sigilo fiscal dos contribuintes e nas punições penais que servidores podem sofrer se violarem essa garantia. “Não há falta de transparência. Embora só a ementa das decisões sejam publicadas no Diário Oficial, o contribuinte recebe a íntegra da decisão, e pode recorrer”, contrapõe. A comparação com os julgamentos do Carf, segundo ele, também são desproporcionais. “Dentro da Receita, a questão é mais complexa. O Carf é um órgão do Ministério da Fazenda, mas que está fora da Receita Federal. Lá, o sigilo é flexibilizado, até porque participam dos julgamentos conselheiros que não são fiscais, mas representantes de contribuintes.”

O subsecretário defende ainda a imparcialidade dos julgadores de primeira instância. “As Delegacias que julgam são independentes das que autuam, inclusive respondem a superiores hierárquicos diferentes. As julgadoras se reportam ao subsecretário de Tributação, enquanto as que lavram autuações devem satisfações ao superintendente local.”

Serpa reconhece a demanda e afirma que a abertura dos julgamentos não é impossível, mas lembra que o processo não foi pensado para essa possibilidade. “O Carf tem salas para as sessões de julgamento, com estrutura para o acompanhamento pelos advogados. Já as delegacias só têm espaço para os auditores”, explica.

É o que também afirma o delegado da Receita Federal em Bauru (SP), Marcos Mello. “Nem todas as sessões são presenciais. Há algumas que são feitas por videoconferência.” Segundo ele, sustentações orais provocariam maior demora nos julgamentos.

Precedentes favoráveis
A Justiça já se manifestou sobre o assunto. Em 2007, decisão da 5ª Vara Federal Cível de São Paulo anulou um julgamento da Delegacia Regional de Julgamento de São Paulo justamente pela falta de publicidade. 

“O princípio da ampla defesa deve ser observado pelo processo administrativo, sob pena de nulidade, e manifesta-se através da oportunidade concedida ao contribuinte de opor-se a pretensão”, afirmou a juíza Cláudia Mantovani Arruga. Ela suspendeu a decisão administrativa e determinou um novo julgamento, dessa vez com a ciência prévia do contribuinte e de seu advogado, para que eles possam estar presentes — clique aqui para ler.

Três anos antes, 4ª Vara Federal Cível de São Paulo tomara decisão semelhante — clique aqui para ler. A juíza Maria Isabel do Prado determinou que a Delegacia de Julgamento paulista informasse a um contribuinte quando julgaria seu recurso administrativo para que a empresa pudesse estar presente. A juíza permitiu ainda que "o advogado da impetrante aplique o exercício de ampla defesa, assim entendido, a entrega de memoriais, sustentação oral, requisição de provas, participação em debates e todos os demais atos necessários ao exercício de tal direito".

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