Demandas atendidas

Central do Cidadão do Supremo completa cinco anos

Autor

  • Marcos Alegre Silva

    é analista Judiciário do Supremo Tribunal Federal e assessor-chefe substituto da Central do Cidadão. É especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Cândido Mendes.

3 de julho de 2013, 9h25

No dia 21 de maio de 2013 a Central do Cidadão completou cinco anos de muito trabalho e realizações. Nesse período, participou ativamente da construção da história do Supremo Tribunal Federal.

Antes da sua criação, o atendimento a pedidos de informações era realizado por vários setores, muitas vezes sem comunicação entre eles. Faltava uma diretriz unificada para tratar demandas por informações recebidas diariamente na Corte. Não havia uma unidade de ouvidoria e o foco no fornecimento de informações estava no trâmite processual.  Algumas vezes, não se sabia o que fazer com demandas por informações que não diziam respeito a processos em tramitação no Tribunal.

A unidade não foi criada como uma estrutura típica de ouvidoria, porque não tem um ouvidor com mandato eletivo, por exemplo, mas com atividades comuns a estruturas dessa natureza, como a centralização dos canais de informações e a intermediação interna nas soluções de problemas.

A Central iniciou os trabalhos com a missão de informar a sociedade sobre o papel do STF, a forma de atuação e os serviços disponíveis. O objetivo principal era utilizar-se das solicitações como insumos para melhorar a prestação dos serviços do Tribunal. Para isso, unificou os canais de informação e passou a atuar em parceria com os serviços que já tinham interação com o usuário externo, a exemplo da pesquisa de jurisprudência, da biblioteca e do arquivo.
No entanto, logo no início dos trabalhos verificou-se que o universo temático das solicitações recebidas ia muito além de pedidos de informações sobre o funcionamento do STF.

Eram pedidos de toda ordem: denúncias de desvio de conduta de juízes em outros tribunais; de tortura e maus tratos; doação de livros e de Constituição; pedidos de aposentadoria; informações de como tirar passaporte e, até mesmo, pedido de emprego, moradia e doação de cesta básica. Relatavam-nos problemas do dia-a-dia, brigas com vizinho, dúvidas de como proceder juridicamente diante de uma demanda, e muitas denúncias de descaso de autoridades na sua esfera de competência. Destacava-se, também, o grande volume de correspondências enviadas por pessoas que cumpriam pena em estabelecimentos prisionais.

Em meio a esse atordoamento inicial do “o que fazer?”, a pequena equipe composta por três servidores, com o suporte do então presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, começou a estudar uma forma de proceder naquelas demandas. A solução encontrada foi atuar de forma administrativa, ou seja, encaminha-se o problema apontado à autoridade competente e pede-se que ela tome as medidas cabíveis ao caso, sem o condão de ordem judicial.

Os resultados foram surpreendentes. Pedidos aparentemente sem solução passaram a ter respostas com a indicação das providências adotadas, as quais foram retransmitidas prontamente ao solicitante. Bolsas de estudos concedidas, programa de financiamento para pessoas que queriam escrever o primeiro livro, liberdade ao aprisionado de forma ilegal, inscrição em programas de habitação, assistência jurídica ao desassistido e tantos outros. A partir daí, passamos a adotar um princípio norteador da nossa atuação – o da máxima efetividade – fazendo com que a solicitação chegue a quem precisa, não só autoridades públicas, mas a quem pudesse dar concretude ao pedido e informando, da forma mais completa possível, ao interessado.

Isso foi possível pela conjunção de vários fatores, em especial as inúmeras parcerias estabelecidas com autoridades, servidores e integrantes da sociedade civil que partilham a mesma filosofia adotada pela Central do Cidadão e, sobretudo, a força da imagem da instituição “Supremo Tribunal Federal”.  Como a indicação é meramente administrativa (não é ordem judicial), a autoridade competente não está obrigada a agir. Ao reconhecer a legitimidade do pedido, que por outros meios provavelmente não chegariam até ela, toma as medidas cabíveis ao caso.

Outra característica marcante observada é o grande volume de manifestações recebidas em virtude dos julgamentos de grande repercussão nacional realizados pelo STF. Principalmente quando há cobertura midiática, as pessoas se manifestam com opiniões bastante divididas sobre a questão objeto de julgamento. Nessas oportunidades, é comum o recebimento de trabalhos científicos, textos e opiniões de pessoas interessadas, mas que não são partes do processo judicial.

A Central do Cidadão encaminha essas manifestações aos gabinetes dos ministros. O material pode ser utilizado como subsídio na construção do entendimento sobre a matéria. Alguns exemplos disso podem ser observados quando o STF decidiu sobre a (in)constitucionalidade da realização de pesquisa com células tronco embrionárias; a interrupção da gravidez de feto anencéfalo; a realização do exame da Ordem dos Advogados do Brasil, o reconhecimento de direitos em relações homoafetivas, entre tantos outros. Trata-se de uma nova vertente de atuação “não planejada” pois, quando a Central encaminha as manifestações aos Ministros, permite que o cidadão comum seja ouvido nas questões mais importantes decididas pela Suprema Corte brasileira.

Por ocasião do ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.679, que discutia algumas limitações às operadoras de TV por assinatura, foram recebidas mais de 14 mil manifestações de usuários desse serviço. O ministro Luiz Fux convocou uma audiência pública para ouvir autoridades e especialistas sobre o tema, cuja finalidade é auxiliar os Ministros a entender melhor o assunto.

O trabalho que a Central do Cidadão vem realizando recebeu reconhecimento interno de Ministros, servidores e colaboradores e a unidade passou a apoiar todas as unidades na comunicação com sociedade. A equipe cresceu e hoje conta com vinte colaboradores. O número de solicitações também aumentou. Das 150 solicitações mensais, para as atuais 6 mil por mês. Desde a sua criação, em maio de 2008, até maio de 2013, a Central do Cidadão realizou 171.396 atendimentos.

Em maio de 2012, por ocasião do início da vigência da Lei 12.527/11, a Lei de Acesso à Informação, foi atribuída à Central do Cidadão a competência para gerenciar os pedidos baseados na nova legislação e responder ao requerente no prazo definido por ela (20 dias). Com o objetivo de facilitar a consulta às informações públicas e atender à determinação, os conteúdos da página do STF foram reorganizados em um novo ambiente denominado “Acesso à Informação”.

Nesse primeiro ano de vigência, a Central já respondeu mais de 1.200 questionamentos com fulcro na Lei. Os temas mais comuns são os relacionados à transparência pública (estatísticas de processos, gastos, remuneração, etc.). As informações solicitadas de forma recorrente têm sido organizadas pelas unidades gestoras e disponibilizadas no Portal do STF.

Pedidos curiosos são recebidos diariamente, como o de uma solicitante que queria confirmar a identidade e a veracidade das informações postadas pelo namorado, em um relacionamento mantido pela internet; o neto de um antigo servidor do STF que queria confirmar a filiação do avô para montar a árvore genealógica da família; os telespectadores que, após assistirem os julgamentos do STF pela TV Justiça, pediram informações sobre as especificações do relógio digital do Plenário e da almofada com elástico que prende a cadeira dos Ministros porque tinham interesse em adquiri-los – o primeiro informou ter deficiência visual e o mostrador digital maior permitirá a leitura das horas, o segundo alegou sofrer de dores na coluna; o violinista que pediu apoio para o replantio do pau-brasil com a intenção de garantir a confecção de arcos de violino de qualidade. São alguns exemplos.

Apesar dos avanços conseguidos à custa de muito trabalho, algumas dificuldades são presentes. No âmbito externo, destacam-se: a necessidade de melhorar a integração com outras unidades de Ouvidoria; a carência de recursos para a prestação de serviços de alguns órgãos, como as Defensorias Públicas, o que faz com que as reclamações sejam constantes; o aumento crescente do número de solicitações. Internamente: a necessidade constante de treinamento da equipe, pois o fluxo de informação é intenso.

Nesses anos de funcionamento, percebeu-se que grande parte da sociedade vive alheia ao funcionamento do Estado. Pessoas comuns pouco conhecem sobre a divisão dos Poderes ou a repartição de competências dos órgãos do Estado. Esse “mundo” se apresenta a elas nos momentos que vivenciam um problema real. Nessas ocasiões, algumas delas procuram diversos órgãos públicos em busca de auxílio, informação e apoio.

A experiência vivenciada no trabalho desenvolvido pela Central do Cidadão ensina que o Supremo Tribunal Federal ocupa, no imaginário popular, a última esperança de se alcançar “Justiça”. Não necessariamente a “justiça técnico-jurídica”, mas a social e a humana. Isso aumenta a responsabilidade de servidores e colaboradores diante de cada solicitação, numa experiência que proporciona aprendizagem e busca constante pela excelência.

Finalmente, sabemos que a Central do Cidadão do STF não vai solucionar todas as agruras da sociedade brasileira, mas estamos fazendo a nossa parte. Mais que isso, estamos a dar o exemplo diariamente.

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    é analista Judiciário do Supremo Tribunal Federal e assessor-chefe substituto da Central do Cidadão. É especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Cândido Mendes.

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