Repercussão geral

Quando a busca pela eficiência paralisa o Judiciário

Autor

  • Fábio Portela Lopes de Almeida

    é assessor da ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi na vice-presidência do Tribunal Superior do Trabalho órgão responsável pelo juízo de admissibilidade dos Recursos Extraordinários naquela Corte Superior. Doutorando em Direito Estado e Constituição pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Mestre em Direito pela mesma instituição em 2007 e em Lógica Linguagem e Filosofia da Mente pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Filosofia da UnB.

28 de janeiro de 2013, 13h23

A reforma do Poder Judiciário foi engendrada pela Emenda Constitucional 45, de 2004 com o objetivo explícito de trazer maior eficiência ao Poder Judiciário. Já na Exposição de Motivos da Emenda Constitucional 45/2004, é possível perceber a grande preocupação com a ineficiência da prestação jurisdicional no país. Intitulada “Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano” e assinada pelos presidentes da República, do Supremo Tribunal Federal, do Senado e da Câmara dos Deputados, a Exposição de Motivos aponta como premissa que a “morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos no regime democrático”.

Reconhece-se, assim, a chamada “crise do Judiciário brasileiro”, que demandaria para sua solução a ação concertada dos três Poderes da República, organizada em torno de um pacto que se desdobra em várias frentes de compromisso: (i) implementação da reforma constitucional do Judiciário; (ii) reforma do sistema recursal e dos procedimentos; (iii) defensoria pública e acesso à justiça; (iv) Juizados Especiais e Justiça itinerante; (v) execução fiscal; (vi) precatórios (vii) graves violações contra os direitos humanos; (viii) informatização; (ix) produção de dados e indicadores estatísticos; (x) coerência entre atuação administrativa e orientações jurisprudenciais já pacificadas; (xi) e incentivo à aplicação de penas alternativas.

Institutos e instituições novos foram criados para enfrentar a chamada “crise do Judiciário”, entre os quais se destacam o direito à razoável duração do processo, o Conselho Nacional de Justiça e a exigência de demonstração da repercussão geral das questões constitucionais debatidas nos Recursos Extraordinários. A proposta deste artigo é examinar, com um olhar institucional inspirado por Cass Sunstein e Adrian Vermeule[2] parte dos efeitos concretos do instituto da repercussão geral, passados oito anos da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004.

Nesse sentido, o artigo será dividido em três seções. Na primeira, examinarei os objetivos da repercussão geral, tal como têm sido descritos pela doutrina especializada. O propósito é relatar como a teoria jurídica sobre o instituto incorporou indevidamente em seu discurso sobre a repercussão geral as justificativas apresentadas no Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano, ressignificando o sentido da crise do Poder Judiciário como “crise numérica” de apenas uma instituição, o Supremo Tribunal Federal.

A partir da segunda seção, será adotada uma perspectiva institucionalista, com o objetivo de verificar os efeitos concretos da repercussão geral. Em primeiro lugar, pretende-se apresentar nessa seção um relatório estatístico da repercussão geral, com o propósito explícito de demonstrar a ineficiência do novo sistema para alcançar os objetivos da Emenda Constitucional 45. Outro propósito da seção é discutir, a partir dos números apresentados, a precisão do I Relatório “Supremo em Números”, da Fundação Getúlio Vargas, com o objetivo de verificar sua acurácia no exame dos efeitos da repercussão geral.

A terceira seção do artigo, por sua vez, é especialmente motivada pela abordagem de Sunstein. A seção dedica-se a explorar alguns dos motivos do fracasso da repercussão geral, denotando como certas opções adotadas na institucionalização do requisito recursal levaram a efeitos contrários aos pretendidos, por ter sido adotada uma abordagem teórica que não se preocupou com os efeitos do sistema no sistema microeconômico judicial do Supremo Tribunal Federal. Com base nas conclusões alcançadas nessa seção, serão propostas alternativas institucionais que, em princípio, poderiam superar parte dos problemas apontados e efetivamente resultar no aumento da celeridade da prestação jurisdicional.

Objetivos da repercussão geral à luz da doutrina
Como observado na introdução, a reforma do Poder Judiciário estabelecida pela Emenda Constitucional 45/2004 foi instituída com o propósito explícito de proporcionar maior celeridade na prestação jurisdicional.

A criação do instituto da repercussão geral, fruto desse processo, deveria se afirmar com instrumento para assegurar maior celeridade na tramitação de feitos em todo o sistema judiciário do país. Todavia, tão logo o instituto foi criado, a doutrina, a legislação e a jurisprudência passaram a diminuir o escopo de seus efeitos. A justificativa original, diminuir a morosidade e aumentar a eficácia das decisões judiciais, foi logo substituída por outra, menos abrangente: resolver a chamada “crise numérica” de apenas um órgão judicante, o Supremo Tribunal Federal.[3]

Essa crise consistiria no recebimento de elevado número de feitos, muitos dos quais acessórios, como Agravos de Instrumento contra despacho de admissibilidade que nega seguimento ao Recurso Extraordinário. Dado o volume de processos, a Corte não teria condições administrativas de julgá-los com rapidez e acurácia e, com o objetivo de tentar resolver a crise, precisaria adotar medidas de contenção para dificultar o acesso do jurisdicionado ao Tribunal. Não é por acaso que a crise é narrada nos seguintes termos por um dos membros da Suprema Corte:

Dados estatísticos disponibilizados no sítio do Supremo Tribunal Federal revelam, que entre 1991 e o ano de 2007, o total da soma de recursos extraordinários e agravos de instrumento distribuídos anualmente na Suprema Corte sempre superou 90% do total de processos distribuídos.

Os dados também demonstram que o volume de processos total distribuídos aumentou de 16.226, no ano de 1990, para 90.839, no ano de 2000, atingindo o patamar de 116.216 processos distribuídos no ano de 2006.

Registre-se que o acúmulo de processos na Corte Suprema a obrigou a adotar uma série de posicionamentos formalistas, definidos como “jurisprudência defensiva”, com o intuito de barrar o processamento dos recursos extraordinários e agravos de instrumento. Nesse sentido, podem-se citar as Súmulas 280, 281, 282, 283, 284, 288, 291 e 400, entre outras.

Um exemplo dessa prática é o indeferimento liminar de agravos de instrumento, cuja cópia da petição de interposição do recurso extraordinário tenha protocolo ilegível, aplicando-se interpretação extensiva à sua Súmula 288.

Os números revelam a crise numérica que o Supremo Tribunal Federal enfrentou e a necessidade de racionalização do modo de prestação jurisdicional da Corte.[4]

Essa narrativa é típica dos estudos que tratam do tema.[5] Se de início o Supremo Tribunal Federal começou a responder à “crise numérica” criando uma jurisprudência defensiva, que fundamenta a denegação dos recursos distribuídos com base em formalismos, a Emenda Constitucional 45 criou dois mecanismos institucionais para obstaculizar o acesso à jurisdição perante a Suprema Corte e tentar conferir maior eficácia a suas decisões, a súmula vinculante e a repercussão geral.[6]

A repercussão geral, objeto de exame no presente estudo, foi criada como um filtro institucional capaz de assegurar que o Supremo Tribunal Federal apenas examinasse questões constitucionais relevantes, próprias de um “guardião da Constituição”. Como afirma Osmar Mendes Paixão Côrtes, ao examinar as semelhanças e diferenças dos institutos da arguição de relevância no horizonte constitucional anterior e da repercussão geral:

Fica claro que o legislador constituinte da época [1969], como o atual, que elaborou e aprovou a Emenda Constitucional nº 45, preocupou-se com o grande número de processos que chegava (e chega) ao Supremo Tribunal Federal, que pode inviabilizar o seu papel de guardião da Constituição Federal e de dar unidade à Federação, na medida em que é impossível que a Corte Suprema fique à disposição para examinar todas as questões jurídicas do país.

É, portanto, a possibilidade de “filtragem” de processos sem maior relevância, que não põem em xeque o princípio federativo e a guarda da Constituição, a força motora que levou à criação dos dois instrumentos — a antiga “arguição de relevância” e a atual “repercussão geral”.[7]

Como visto, a proposta original da Emenda Constitucional 45 era diminuir a morosidade e aumentar a eficácia das decisões do Poder Judiciário como um todo, e não apenas de uma única instituição. Ao criar apenas instrumentos dedicados à melhoria da eficiência do Supremo Tribunal Federal, a chamada reforma do Judiciário induziu uma cisão metodológica entre a Suprema Corte e as demais instituições judicantes.

Como se verá nas seções seguintes, os efeitos desta cisão são bastante graves e levaram a uma cegueira coletiva entre os doutrinadores pátrios, que examinam os efeitos da repercussão geral apenas no interior do sistema do Supremo Tribunal Federal, deixando de lado o impacto danoso que o sistema tem causado a todo o restante do sistema judiciário.

Na próxima seção, ficará claro que, ao contrário do que noticiou recentemente o estudo “O Supremo em Números”, da Fundação Getúlio Vargas, a sistemática da repercussão geral não tem levado a Suprema Corte a julgar, no sistema difuso de controle de constitucionalidade, mais questões “relevantes” do ponto de vista constitucional. Além disso, serão apresentados dados concretos, extraídos dos números divulgados pelo próprio Supremo Tribunal Federal em seu sítio eletrônico, que ilustram um aumento da morosidade do Poder Judiciário em decorrência da repercussão geral.

O que dizem os números da repercussão geral?
A presente seção tem por objetivo avaliar a eficiência da sistemática da repercussão geral a partir de dados estatísticos divulgados pelo sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal[8] que foram utilizados para justificar a própria existência do sistema da repercussão geral e continuam a ser utilizados a fim de legitimá-lo, como ilustra estudo publicado I Relatório Supremo em Números.[9]

Como discutido, são basicamente três as finalidades da repercussão geral: (i) instituir um filtro constitucional para que o Supremo Tribunal Federal concentre suas atividades no julgamento estrito de questões relevantes a partir de uma perspectiva constitucional; (ii) aumentar a celeridade da prestação jurisdicional; e (iii) diminuir a sobrecarga da Suprema Corte no exame de Recursos Extraordinários. Os números do sistema já permitem aferir se essas finalidades têm sido alcançadas.

Esta seção será dividida em duas partes. Na primeira, serão examinadas as consequências do sistema no âmbito do Supremo Tribunal Federal e, na segunda, o impacto para o restante do sistema judiciário, de forma a evidenciar os problemas da cisão metodológica que opõe a Suprema Corte aos demais Tribunais.

O impacto da repercussão geral no STF
Os primeiros dados estatísticos revelam a proporção entre os temas com repercussão geral reconhecida e o quantitativo total de temas que chegaram à Corte Constitucional.

Como reconheceu o próprio ministro Gilmar Ferreira Mendes no trecho supracitado, a crise numérica enfrentada levou a Corte a adotar uma jurisprudência defensiva, que serviria de filtro processual para diminuir a quantidade de recursos examinados no mérito. A ideia de “filtro”, portanto, deveria cumprir função semelhante, e só teria sentido caso fosse permeável apenas a matérias relevantes de um ponto de vista constitucional — o que se imagina um número relativamente pequeno de matérias em relação ao total de questões submetidas ao exame do Supremo Tribunal Federal diariamente.

Assim, o número total de temas com repercussão geral reconhecida deveria ser muito inferior ao número de questões com negativa de reconhecimento de repercussão geral. Mas os números revelam a seguinte realidade: 

Exame da repercussão geral Quantidade Percentual
Temas com repercussão geral reconhecida: 440 70,40%
Temas com repercussão geral negada: 175 28,00%
Temas em análise: 10 1,60%
Total 625 100,00%

 Como é possível observar, um primeiro exame quantitativo já causa estranheza quanto à eficiência da repercussão geral como filtro de seleção de temáticas com relevância constitucional. De todos os temas submetidos ao filtro constitucional, o Supremo Tribunal Federal entendeu que 70,40% (440 temas) têm repercussão geral, e que apenas 28% (175) não têm relevância “do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa” (art. 543-A, § 1º, do Código de Processo Civil, acrescentado pela Lei 11.418, de 2006).

Essa impressão é reforçada com um exame qualitativo dos temas que mais têm induzido o sobrestamento dos recursos que os versam (art. 543-B, § 3º, do Código de Processo Civil, acrescentado pela Lei nº 11.418, de 2006): 

Tema Tribunal Matéria Número de processos sobrestados
284 TJSP Diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança, bloqueados pelo BACEN, por alegados expurgos inflacionários decorrentes do Plano Collor I. 53.107
264 JEF/TRF – 3ª Região Diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança por alegados expurgos inflacionários decorrentes dos planos Bresser e Verão. 27.898
347 TJRS Direito à atualização monetária do vale-refeição dos servidores públicos do Estado do Rio Grande do Sul por decisão judicial. 26.232
246 TST Responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviço. 14.195
96 TRF – 4ª Região Incidência de juros de mora no período compreendido entre a data da conta de liquidação e a expedição do requisitório. 11.089
264 JEF/TRF – 4ª Região Diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança por alegados expurgos inflacionários decorrentes dos planos Bresser e Verão. 10.465
88 JEF/TRF – 4ª Região Aplicação do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99, a benefícios concedidos antes da respectiva vigência. 9.968
264 TJMG Diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança por alegados expurgos inflacionários decorrentes dos planos Bresser e Verão. 7.701
350 TRF – 1ª Região Prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário. 6.962
190 TST Competência para processar e julgar causas que envolvam complementação de aposentadoria por entidades de previdência privada. 6.66
4 STJ Termo a quo do prazo prescricional da ação de repetição de indébito relativa a tributos sujeitos a lançamento por homologação e pagos antecipadamente. 6.599
313 JEF/TRF – 4ª Região Aplicação do prazo decadencial previsto na Medida Provisória nº 1.523/97 a benefícios concedidos antes da sua edição. 6.498
24 TJSP Base de cálculo do adicional por tempo de serviço de servidor público admitido antes da Emenda Constitucional nº 19/98. 6.392
285 TJSP Diferenças de correção monetária de depósitos em caderneta de poupança, não bloqueados pelo BACEN, por alegados expurgos inflacionários decorrentes do Plano Collor II. 5.937
351 JEF/TRF – 5 Região Extensão a inativos e pensionistas da Gratificação de Desempenho do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo – GDPGPE. 5.879

Como é possível observar, boa parte dos temas que têm tido sua repercussão geral reconhecida e que têm induzido o maior número de sobrestamentos de recursos nos tribunais de origem não se relaciona à violação direta de dispositivos constitucionais relacionados ao núcleo do conceito material de Constituição — na dicção de Paulo Bonavides, “o conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição de competência, ao exercício de autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como sociais”.[10] Entre os temas destacados, nota-se a predominância de temas com viés financeiro (temas 264 e 285), relacionados a direitos funcionais de determinadas categorias (24, 347 e 351) previdenciário (88, 313), processual (190, 350), tributário (4), precatório (96) e responsabilidade do Estado (246).

Conquanto seja subjetiva a qualificação da repercussão geral de determinada matéria, vários dos temas já se encontravam com solução pela própria jurisprudência da Corte[11] (como a questão atinente aos expurgos inflacionários, por exemplo, e que é objeto de vários precedentes de repercussão geral), ou sequer discutem diretamente matéria relacionada ao conceito material de Constituição. Dessa forma, a repercussão geral não tem exercido a seletividade que a justificaria no sistema de controle de constitucionalidade difuso.

Por outro lado, a sistemática tem sido aplicada com pouca eficiência, não trazendo maior celeridade nem ao Supremo Tribunal Federal, nem ao Poder Judiciário, como seria esperado. Em tese, o instituto deveria levar a maior celeridade no Poder Judiciário mesmo que o julgamento de mérito demorasse a ocorrer, porque cada tema debatido é representado em centenas ou milhares de processos em tramitação nos tribunais de origem. Mas não é o que vem ocorrendo.

Um primeiro aspecto que autoriza essa conclusão diz respeito à diferença entre o número de temas que têm sido submetidos à Suprema Corte já na sistemática da repercussão geral e o quantitativo de temas que tiveram julgamento de mérito, após reconhecimento de repercussão geral. Esses dados estão descritos na seguinte tabela e ilustrados no gráfico abaixo: 

  2007 2008 2009 2010 2011 2012 Média
Temas submetidos à repercussão geral 20 126 99 119 157 104 104,17
Temas com mérito julgado 0 27 26 19 38 10 20,00

Como é possível observar, há uma grande defasagem entre o número de temas submetidos à repercussão geral e o quantitativo de temas que tiveram seu mérito julgado após o reconhecimento da repercussão. Em média, a cada ano, são submetidos para exame 104,17 temas e apenas 20 temas têm o mérito julgado. Mesmo considerando-se no universo os temas que tiveram repercussão geral negada (um total de 175 temas, com média de 29,17 a cada ano), há uma defasagem de 49,17 temas por ano entre os que entram no sistema e os que têm seu mérito efetivamente julgado.

Esse resultado é sintoma da demora com que o Supremo Tribunal Federal tem julgado o mérito dos temas de repercussão geral. Em 2012, por exemplo, foi julgado o mérito de apenas 10 temas, ao passo que se reconheceu a repercussão geral de 104. A persistir esse ritmo, em dez anos haverá pendência de 491 temas para julgamento do mérito, somados aos 324 que já estão aguardando julgamento.

Atualmente, a composição total dos temas submetidos ao regime é a seguinte:

Exame da repercussão geral (Resumo) Quantidade Percentual
Mérito pendente 324 45,19%
Mérito julgado 120 16,74%
Repercussão geral negada 175 24,41%
Temas em análise 10 1,39%
Representativos da controvérsia 88 12,27%
Total 717 100,00%

Como é possível observar, essa tabela reforça a conclusão de que o sistema não tem servido como filtro de relevância, pois, de todos os processos submetidos ao sistema, apenas 24,41% de todos os temas tiveram sua repercussão geral negada. O número é diferente do apresentado anteriormente (28%) porque a presente tabela inclui os temas sob julgamento no Plenário Virtual, assim como os representativos da controvérsia que ainda aguardam manifestação sobre sua repercussão, nos termos do artigo 543-B, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil.

A tabela também revela que 45,19% de todos os temas submetidos à sistemática tiveram repercussão geral reconhecida e ainda estão aguardando julgamento do mérito. Os temas que tiveram solução, seja em razão de ter sua repercussão geral negada ou o mérito julgado após reconhecimento de repercussão geral, correspondem a 41,14% de todos os temas. É o que se vê na seguinte tabela: 

  Quantidade Percentual
Temas que induzem sobrestamento 422 58,86%
Repercussão geral reconhecida sem julgamento de mérito 324 45,19%
Representativos da controvérsia 88 12,27%
Temas em análise 10 1,39%
Temas já decididos 295 41,14%
Mérito julgado 120 16,74%
Repercussão geral negada 175 24,41%
Total 717 100,00%

Conquanto à primeira vista esse pareça ser um número que mostre eficiência do sistema, na verdade não é esse o caso. Dos 41,14%, 24,41% do total (ou 59,33% dos temas já decididos) referem-se a temas cuja repercussão foi negada, sendo que o Supremo Tribunal Federal apenas firmou entendimento sobre matéria em 16,74% (ou 40,69% dos temas decididos). A maioria dos temas (58,86%) refere-se a questões não decididas, que induzem o sobrestamento de recursos nos tribunais de origem.

Além disso, a repercussão geral não tem cumprido com eficiência a função de diminuir acentuadamente o número de Recursos Extraordinários e Agravos interpostos com a função de destrancar seu processamento nos Tribunais de origem. É o que se extrai da tabela a seguir: 

Controle Difuso
Ano RECLAMAÇÃO* RE** AGRAVO EM RE / AI* RE + AG/AI
2000 522 29.196 59.236 88.432
2001 228 34.728 52.465 87.193
2002 202 34.719 50.218 84.937
2003 275 44.478 62.519 106.997
2004 491 26.54 38.938 65.478
2005 32 29.483 44.691 74.174
2006 7 54.575 56.141 110.716
2007 8 29.796 31.267 61.063
2008 1.684 21.543 43.344 64.887
2009 2.238 9.694 39.937 49.631
2010 1.288 13.404 48.172 61.576
2011 1.848 11.067 22.878 33.945
2012 1.608 7.555 42.79 50.345
Total 10.431 346.778 592.596 939.374
* Até 2005, foram utilizados dados relativos à distribuição de processos, por falta de dados quanto à autuação.
** Foram utilizados dados relativos à distribuição dos processos, e não quanto à autuação, até 2007, por falta de dados.

Como é possível observar, a tabela apresenta dados sobre a distribuição de Recursos Extraordinários e Agravos de Instrumento até 2010, quando a Lei 12.322 extinguiu a necessidade de formação de instrumento, determinando o processamento nos mesmos autos, como Agravo em Recurso Extraordinário. Na segunda coluna, estão os dados sobre Recursos Extraordinários; na terceira, dados sobre tramitação dos recursos dependentes (Agravo em RE e Agravo de Instrumento); e, na quarta, os dados conjugados das duas classes processuais.

De fato, houve uma diminuição no número de Recursos Extraordinários distribuídos no STF. Em 2006, último ano antes da implementação da sistemática da repercussão geral, foram distribuídos 54.575 Recursos Extraordinários na Corte. Em 2012, foram distribuídos apenas 7.555 — uma queda de 86,16%. Mas essa realidade tem que ser conjugada ao número de recursos subsidiários ao Recurso Extraordinário; em 2006, foram julgados 56.151 Agravos de Instrumento; em 2012, foram julgados 42.790 Recurso Extraordinários com Agravo (uma redução de apenas 21,60%). É importante ressaltar que esses dados não levaram em consideração ainda um efeito colateral da repercussão geral, consistente no elevado acréscimo no número de Reclamações (da ordem de 227%, quando comparados, por exemplo, os anos de 2004 e 2012), que são convertidas sistematicamente pelo Supremo Tribunal Federal em Agravos Regimentais contra o despacho de admissibilidade, em decorrência do decidido no AI-QO 760.358 (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 3/12/2009) e nas Reclamações 7.569 e 7.547 (Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 11/12/2009).

Por essa razão, é importante examinar a quinta coluna, que apresenta uma leitura conjugada dos recursos. Em 2006, ano em que foi submetido o maior quantitativo de recursos à Corte, foram distribuídos 110.716 processos; em 2012, foram distribuídos 50.345 recursos, ou 54,53% a menos. Mas 2006 foi um ano extremo, e vem sendo citado como comparativo do sucesso do sistema da repercussão geral (Mendes & Branco, 2012, p. 1186). Como a tabela demonstra, não há constância no quantitativo de processos distribuídos — em 2004 e 2005, por exemplo, o quantitativo foi inferior à média dos quatro anos anteriores. Mesmo no período posterior isso não ocorre. Em 2012, por exemplo, foram distribuídos 48,31% mais recursos do que em 2011.

Nesses termos, uma metodologia mais ideal deveria comparar a média de recursos distribuídos entre os seis anos de aplicação do sistema da repercussão geral com a média de recursos distribuídos nos seis anos anteriores. A média de recursos distribuídos entre 2001 e 2006 é de 88.249 por ano, ao passo que a média entre 2007 e 2012 é de 53.575 ao ano, ou 39,30% a menos. Essa é a medida do ganho da eficiência do sistema no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

O impacto da repercussão geral sobre os demais órgãos judicantes
Esse número só pode ser compreendido como ganho de eficiência em razão da já mencionada cisão metodológica entre o Supremo Tribunal Federal e os demais tribunais do país. Quando são examinados os dados alusivos a todo o sistema judiciário, ficará claro o impacto negativo da sistemática sobre a eficiência do Poder Judiciário nacional.

Como já salientado, ao final de 2012 havia 422 temas que induziam o efeito prescrito no artigo 543-B, parágrafo 1º, do CPC — o sobrestamento dos recursos que versem temas idênticos aos dos processos encaminhados ao Supremo Tribunal como representativos da controvérsia. Trata-se de três grupos de temas: (i) os qualificados como representativos da controvérsia, que ainda aguardam exame de sua repercussão geral pelo Plenário Virtual (88 temas); (ii) os que estão em análise no Plenário Virtual (10 temas); e (iii) os que tiveram sua repercussão geral reconhecida e aguardam julgamento de mérito definitivo (324 temas).

Esses temas representam 58,86% de todo o conjunto de questões submetidas ao sistema da repercussão geral. Todavia, esse número induz o engano de considerar o sistema eficiente — afinal, isso significaria que 41,14% de todos os temas submetidos à sistemática já foram solucionados e que, portanto, um número similar de recursos estaria solucionado.

A premissa é correta, mas a conclusão é equivocada, pois pressupõe que cada tema examinado tem em contrapartida uma proporção similar de processos associados. Mas existem temas que têm um número muito maior de recursos associados a si do que outros; como o Supremo Tribunal Federal não tem levado esse fator em consideração ao julgar o mérito dos temas, o impacto das poucas decisões de mérito tem sido mínimo nos demais tribunais. É o que se extrai da seguinte tabela: 

Impacto do julgamento definitivo Quantidade de processos Percentual
Repercussão geral reconhecida com julgamento de mérito 45.767 9,61%
Repercussão geral negada 5.242 1,10%
Subtotal 51.009 10,71%
Processos sobrestados 425.182 89,29%
Total 476.191 100,00%

Esses números correspondem ao quantitativo de processos associados aos temas conforme o julgamento definitivo no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Embora os temas com mérito julgado correspondam a 41,14% dos temas submetidos ao instituto da repercussão geral, eles apenas tiveram impacto em 10,71% de todos os recursos vinculados a esse instituto. E os temas com repercussão geral negada tiveram impacto apenas em 5.242 processos, ou 1,1% do total — o que novamente demonstra que o instituto não tem funcionado como filtro.

Ou seja, o aparente sucesso do instituto no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que teria ganho 39,30% de eficiência, na verdade revela um impacto pífio no âmbito do Poder Judiciário como um todo. Seis anos após sua institucionalização, apenas 10,71% dos recursos tiveram solução.

Os demais Recursos Extraordinários, correspondentes a 89,29%, estão sobrestados, com seu andamento suspenso até que o Supremo Tribunal Federal julgue o mérito dos temas associados a eles, seja negando a repercussão geral ou julgando o mérito das questões constitucionais versadas nos casos em que ela foi reconhecida.

Segundo dados divulgados pelo Supremo Tribunal Federal, a situação é calamitosa: 

Quantidade de recursos sobrestados nos tribunais de origem
Ano Quantidade
2011 192.384
2012 425.182
* Dados subestimados: vários tribunais não divulgaram seus dados estatísticos.

Esses dados mostram a quantidade de recursos sobrestados em todos os tribunais de origem.[12] É importante considerar, em primeiro lugar, que os próprios dados estão subestimados, pois vários tribunais não divulgaram seus dados — o que, se por um lado diminui a confiabilidade dos números, por outro evidencia o quão drástica é a situação.

Segundo os números divulgados pela Suprema Corte, havia, em 2011, 192.384 recursos sobrestados. Na metade de 2012, em dados colhidos no sítio do Supremo Tribunal Federal[13], havia 282.282 recursos sobrestados. Ou seja, entre dezembro de 2011 e junho de 2012, houve um acréscimo de 89.898 recursos sobrestados; entre junho e dezembro de 2012, foram sobrestados mais 142.900 recursos. Isso indica que está havendo uma aceleração no número de Recursos Extraordinários sobrestados, o que demonstra que o ritmo de julgamento dos temas submetidos ao rito da repercussão geral é insuficiente para solucionar as controvérsias.

Em apenas um ano, houve acréscimo de 121% no número total de recursos sobrestados — e os dados relativos a 2012 ainda estão incompletos, pois foram divulgados tão somente os números referentes a novembro de 2012.

O seguinte gráfico ilustra a proporção entre recursos solucionados na vigência da repercussão geral e os apelos sobrestados, demonstrando o quão pequeno tem sido o impacto das decisões de mérito do Supremo Tribunal Federal:

Do ponto de vista sistêmico, é importante realizar ainda uma última medida do impacto da repercussão geral. Na subseção anterior, verificou-se que o quantitativo de Recursos Extraordinários e Agravos de Instrumento ou Agravos em Recurso Extraordinário revelava uma melhoria da eficiência do Supremo Tribunal Federal no exame desses recursos, da ordem de 39,30%.

Quando os números referentes ao sobrestamento são adicionados ao quantitativo de Recursos Extraordinários, a realidade do impacto da sistemática sobre o sistema judiciário revela-se bem diferente. É o que se extrai da adição equânime, a título de projeção hipotética, do número atual de processos sobrestados a cada ano após a implementação da repercussão geral até 2011, além do número de sobrestados em 2012: 

Ano RE** AGRAVO EM RE / AI* SOBRESTADOS RE + AG/AI
2000 29.196 59.236 0 88.432
2001 34.728 52.465 0 87.193
2002 34.719 50.218 0 84.937
2003 44.478 62.519 0 106.997
2004 26.54 38.938 0 65.478
2005 29.483 44.691 0 74.174
2006 54.575 56.141 0 110.716
2007 29.796 31.267 38.476 99.539
2008 21.543 43.344 38.476 103.363
2009 9.694 39.937 38.476 88.107
2010 13.404 48.172 38.476 100.052
2011 11.067 22.878 38.476 72.421
2012 7.555 42.79 232.798 283.143
Total 346.778 592.596 425.178 1.364.552
* Até 2005, foram utilizados dados relativos à distribuição de processos, por falta de dados quanto à autuação.
** Foram utilizados dados relativos à distribuição dos processos, e não quanto à autuação, até 2007, por falta de dados.

É importante, também, comparar graficamente o impacto do sobrestamento na quantidade total de processos com o impacto da repercussão geral sobre o Poder Judiciário sem levar em consideração o sobrestamento:

Como é possível observar, ao contrário do que vem sendo divulgado, tem havido um aumento no número de recursos no sistema judiciário como um todo. Na média dos 6 anos após a vigência da repercussão geral, houve um acréscimo de 41,00% novos Recursos Extraordinários frente aos recursos interpostos no período anterior.[14] E os dados de 2012 mostram um acréscimo bastante elevado no número de recursos sobrestados — tendência que, a ser mantida, certamente levará ao colapso do sistema.

Ou seja, na realidade não houve acréscimo de 39,30% na eficiência do sistema com a implementação da repercussão geral. Pelo contrário, o sistema judiciário de processamento de Recursos Extraordinários perdeu 41% de sua eficiência— o que equivale a dizer que os objetivos de alcançar a celeridade na prestação jurisdicional e a maior eficiência no Poder Judiciário, que fundamentaram a reforma veiculada pela Emenda Constitucional nº 45, não têm sido alcançados.

O I Relatório “Supremo em Números” e a repercussão geral
É importante discutir, à luz dos números apresentados, a precisão do I Relatório “Supremo em Números”, da Fundação Getúlio Vargas que, embora reconheça em parte a ineficiência da repercussão geral para realizar julgamentos mais céleres, aposta na tese de que o instituto tem levado a um número maior de julgamentos ligados à persona constitucional do Supremo Tribunal Federal, que seria a função precípua da Corte.

A premissa do Relatório é a mesma identificada na primeira seção: até 2007, o Supremo Tribunal Federal vinha enfrentando um acúmulo de novos processos, e essa situação foi melhorada pela implementação da repercussão geral. Mas, ao menos, reconhece-se que a correta análise da situação demandaria um exame do que vem ocorrendo no âmbito dos demais tribunais.

A repercussão geral reduziu drasticamente o número de processos que dependeriam de julgamento no âmbito do Supremo. Também possibilitou o crescimento das outras personas, a ordinária e a constitucional. Os dados do Supremo em números mostram isso com clareza. Mas pode não ter reduzido, do ponto de vista dos cidadãos, o número de recursos necessários até o trânsito em julgado de uma dada questão. Seu efeito pode até mesmo ter sido o inverso: em muitos casos, processos que já levaram anos para chegar até os tribunais podem ficar represados aguardando uma decisão do STF que, eventualmente, pode inclusive não se aplicar perfeitamente a seu caso. Nesta circunstância, haveria não apenas um aumento de tempo para a decisão final, mas também um aumento de etapas. Estas inferências, porém, não podem ser afirmadas categoricamente, já que para essa análise não bastam apenas os dados do Supremo. Dependemos também de informações dos próprios tribunais (Falcão, Cerdeira & Aguelhes, 2011, p. 62).

Apesar disso, o Relatório trata a questão relativa ao impacto da repercussão geral nos demais tribunais como uma questão secundária — afinal, apesar de reconhecer esta como uma questão importante, o tom que perpassa todo o relatório é de que a reforma constitucional entabulada pela Emenda Constitucional 45 é um sucesso: “Estes dados nos mostram que, apesar de uma queda bastante acentuada de 2008 para 2009, parece que o número de processos está se estabilizando — e, repetimos, não obstante o enorme sucesso da Emenda Constitucional 45 —, está se estabilizando em patamares ainda muito altos” (Falcão, Cerdeira & Aguelhes, 2011, p. 59).

Mas por que o Relatório conclui que o sistema tem sido bem sucedido? Essa conclusão é alcançada em razão de um erro categorial. Segundo o estudo da FGV, o Supremo Tribunal Federal encarna três funções específicas: a persona constitucional, a persona recursal e a persona ordinária. Cada persona é revelada pelas classes processuais julgadas pelo STF. A persona constitucional alude apenas aos processos relacionados ao controle concentrado de constitucionalidade — Ação Direta de Constitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, Mandado de Injunção e Proposta de Súmula Vinculante. A persona recursal, por sua vez, inclui os recursos ligados ao controle difuso de constitucionalidade — fundamentalmente, os Recursos Extraordinários e os Agravos de Instrumento. E a persona ordinária, a seu turno, refere-se aos processos de competência originária do Supremo Tribunal Federal.

O erro categorial se revela na leitura dos dados relativos a cada persona, como revela a discussão sobre os primeiros dados narrados no Relatório, que destacam o grande número de processos julgados pela persona recursal em detrimento dos julgados pela persona constitucional:

A absoluta maioria dos processos recebidos pelo Supremo origina-se da Corte Recursal, correspondendo a quase 92% dos casos de 1988 até 2009. Quantitativamente, portanto, o Supremo não é uma “corte constitucional” no sentido original em que esse tipo de instituição foi pensada. Em números absolutos, está muito mais próximo de uma “corte recursal suprema”. Não é uma corte que escolhe o que julga fundamental julgar. É antes uma corte escolhida pela parte. Não constrói seu destino. Seu destino lhe é construído por cada recurso que lhe chega por deliberação alheia, de terceiros (Falcão, Cerdeira & Aguelhes, 2011, p. 21).

Mais adiante, comparam-se os dados do STF com os da Suprema Corte norte-americana:

A título de comparação, a Suprema Corte norte-americana recebe cerca de 7 mil processos ao ano e julga aproximadamente 100. O Supremo Tribunal Federal, até 2007, estava recebendo e julgando mais de 100 mil. Fica claro que a agilidade decisória do Supremo não se resolve apenas imprimindo maior velocidade dos processos, mas pressupõe, antes, maior seleção dos casos que ali podem chegar (Falcão, Cerdeira & Aguelhes, 2011, p. 58).

A comparação desses dois parágrafos mostra o equívoco categorial da distinção entre persona constitucionale persona recursal. Em primeiro lugar, o Relatório “se esquece” do fato de que na tradição constitucional brasileira a jurisdição constitucional sempre se exerceu fundamentalmente pela via difusa, por meio do Recurso Extraordinário (Afonso da Silva, 2012, p. 558). Apenas recentemente, já no horizonte da Constituição de 1988, o controle concentrado veio a se afirmar de maneira mais contundente, e mesmo assim, sem evidências de sua supremacia sobre o controle difuso de constitucionalidade (Mendes, 1999, pp. 64-65; Mendes, 2006, p. 216).

Segundo o Relatório, o Supremo Tribunal Federal não é uma “corte constitucional”, mas uma “corte recursal” porque julga mais recursos do que processos diretamente vinculados a sua persona constitucional. Ora, se a identidade constitucional do Supremo Tribunal sempre esteve ligada ao controle difuso de constitucionalidade, pela via do Recurso Extraordinário, não há como distinguir as duas categorias aprioristicamente — pois a persona constitucional do STF está umbilicalmente ligada à persona recursal. A criação de uma dualidade categórica entre ambas somente é possível caso se compreenda que a finalidade do estudo era, desde o início, a de estabelecer como premissa o que se queria concluir — que o STF precisava de mecanismos institucionais para julgar mais processos ligados ao controle de constitucionalidade concentrado do que ao difuso. Mas esta seria uma petição de princípio, porque não está claro no estudo por que razão o Supremo Tribunal Federal deveria utilizar mais um sistema do que outro.

Esse equívoco é tão evidente que o próprio modelo constitucional invocado pelo Relatório não se presta à demonstração da tese pretendida. O Relatório invoca a experiência da Suprema Corte norte-americana com o propósito de comparar nossa experiência com a de outra “Corte constitucional”. Ora, o modelo de controle de constitucionalidade americano — que, aliás, está na base da experiência histórico-constitucional brasileira — é o difuso, pela via do recurso, e não o concentrado, modelo que o Relatório sugere deva vir a ser o dominante, por ser supostamente mais eficiente.

Verifica-se, assim, que o problema identificado é o volume de recursos julgados pelo Supremo Tribunal Federal, e não, como pressuposto pelo Relatório da Fundação Getúlio Vargas, o fato de o Supremo Tribunal Federal julgar mais Recursos Extraordinários do que processos em controle concentrado de constitucionalidade. E, para o problema identificado, a repercussão geral não trouxe qualquer solução — embora o Supremo Tribunal Federal tenha recebido 39,40% recursos a menos, o sistema judiciário como um todo continua a processar mais Recursos Extraordinários do que antes — no mínimo, 41% a mais. Assim, o problema numérico foi apenas parcialmente transferido para o arquivo dos tribunais inferiores[15], mas ainda continua sob responsabilidade do Supremo Tribunal Federal, que não tem julgado os temas com a eficiência necessária.

Ao contrário do que conclui o I Relatório “Supremo em números”, a Repercussão Geral não tem sido um sucesso.

Uma abordagem institucionalista a respeito da repercussão geral
Os constitucionalistas norte-americanos Cass Sunstein e Adrian Vermeule, em artigo intitulado “Interpretation and institutions” (2002), propõem a tese de que a teoria jurídica contemporânea tem se concentrado mais na discussão de teorias hermenêuticas, em detrimento de teorias da decisão institucional. Em outras palavras, as teorias jurídicas têm debatido mais teorias normativas da decisão judicial (o modo pelo qual os juízes deveriam julgar) do que teorias a respeito das implicações institucionais para uma teoria da decisão judicial (como as decisões jurídicas podem afetar o funcionamento das instituições ou serem afetadas por ele) (Sunstein & Vermeule, 2002, p. 888) ou com o modo pelo qual os interesses dos agentes podem afetar as instituições (Vermeule, 2002, p. 1559).

Embora o debate em torno da repercussão geral leve em conta, corretamente, que o desenho dos institutos jurídicos é um dos fatores envolvidos no problema da morosidade do Poder Judiciário, o modo pelo qual a Lei 11.418/2006 e as alterações no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal regulamentaram o instituto não considerou nem as implicações das alterações propostas para as instituições envolvidas e nem tampouco o modelo de gestão da repercussão geral pelos agentes do sistema, os ministros do Supremo Tribunal Federal e órgãos auxiliares.

Nesse sentido, a proposta da presente seção é aplicar a perspectiva de Sunstein como instrumento de análise do instituto da repercussão geral, explorando alguns dos elementos que levaram a repercussão geral a contribuir para a morosidade do sistema judiciário. A contribuição de ambos — cuja abordagem inspirou todo o texto até aqui — é a de possibilitar o olhar institucional sobre as implicações da repercussão geral, de modo a avaliar como certas opções adotadas na institucionalização do requisito recursal levaram a efeitos contrários aos pretendidos.

Um elemento a ser considerado nessa discussão é sugerido por Adrian Vermeule (2002). Em Judicial review and Institutional choice, Vermeule estuda o judicial review a partir de uma abordagem institucional. Ao debater a proposta de Hamilton no artigo 78 do clássico O Federalista, Vermeule a reconstrói como um problema principal-agente, estrutura oriunda da teoria dos jogos.

Nesse modelo, alguém (o principal) delega a um terceiro (o agente) funções que seriam executadas mais eficientemente por ele. Em situações nas quais o interesse (função de utilidade em termos econômicos) do agente e do principal convergem, não há necessidade de incentivos para que a delegação funcione adequadamente. Contudo, em situações de divergência, o principal precisa construir esquemas de incentivo para que o agente, conquanto não tenha originalmente a intenção de agir de acordo com a vontade do principal, o faça porque os incentivos oferecidos são suficientes para que as duas funções de utilidade convirjam (Mitnick, 2006). Vermeule reformula a teoria da representação hamiltoniana em termos do modelo: o povo, como principal, aponta tanto representantes eleitos como seus agentes quanto o Poder Judiciário como outro agente, cuja função é fiscalizar a atuação dos representantes políticos. A estrutura de incentivos é dada pela Constituição, que buscaria alinhar os interesses dos representantes e dos juízes com os do povo (Vermeule, 2002, p. 1559).

A crítica de Vermeule a esse modelo é especialmente útil para a presente discussão. Segundo o autor, a teoria de Hamilton somente poderia ser eficiente caso os juízes fossem absolutamente confiáveis e infalíveis ou caso a estrutura de custos da agência fosse adequada. Esses custos são de duas ordens: em primeiro lugar, há os custos de competência — os vieses cognitivos e limites de acesso à informação que os tornam sujeitos a cometer erros; e, em segundo lugar, há os custos do auto-interesse — o risco de os juízes usarem sua autoridade em benefício próprio (Vermeule, 2002, pp. 1559-1560). Para os propósitos do presente estudo, estou interessado nos custos de competência – embora os custos do auto-interesse também não possam ser descartados.

Uma teoria institucional eficiente precisa considerar uma teoria do agente que leve em conta suas preferências cognitivas (Goodenough, 2009, p. 396). A teoria econômica neoclássica, por exemplo, utiliza um modelo de racionalidade que supõe serem os agentes econômicos absolutamente racionais que buscam aquilo que esteja em harmonia com suas preferências de utilidade — o homo economicus. Mais recentemente, a economia comportamental tem utilizado modelos baseados na psicologia cognitiva (Sunstein, 2008) ou na psicologia evolutiva (Hopcroft, 2009), que pressupõem a existência de determinados interesses cognitivos presentes na racionalidade humana.

Assim, um aspecto relevante a ser considerado para o exame da adequação institucional da repercussão geral diz respeito aos vieses cognitivos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, uma vez que estes influenciam a sua função utilidade. Quais são esses vieses cognitivos? Uma possibilidade seria considerar como viés cognitivo o fato de que a maioria dos ministros — assim como a maioria dos demais agentes envolvidos na tramitação dos Recursos Extraordinários, como advogados, demais juízes e outros atores — estavam condicionados a raciocinar nos termos da sistemática anterior. Assim, seria razoável esperar que, por hábito, os Ministros do Supremo Tribunal Federal estivessem acostumados a julgar todos os Recursos Extraordinários distribuídos a si, o que geraria um viés cognitivo que induziria o reconhecimento da repercussão geral.

Dessa forma, as normas que regem a repercussão geral deveriam gerar incentivos para que esse viés cognitivo fosse amenizado, mediante a adoção de procedimentos que tornassem mais custoso o reconhecimento da repercussão geral de determinado tema. Não foi o que aconteceu; pelo contrário, o artigo 102, parágrafo 3º, da Constituição exige que a repercussão geral de matéria somente possa ser rejeitada por maioria de 2/3 dos membros do Supremo Tribunal Federal. Trata-se de procedimento muito mais dificultoso do que o exigido pelo writ of certiorari, na Suprema Corte norte-americana — que se exige voto positivo de ao menos quatro dos nove Justices (ou 44,44% da Corte) a favor do julgamento do recurso a fim de que ele seja examinado. E lá, os Justices exercem de fato sua prerrogativa — conforme dados apresentados pelo próprio Relatório da FGV, das mais de 7 mil questões que chegam à Suprema Corte, apenas 100 são julgadas — um índice de apenas 1,42%, bem abaixo do percentual de 70,40% de matérias em que se reconheceu repercussão geral até o fim de 2012. Ou seja, a presunção, nos Estados Unidos, é a de que a matéria não tem relevância. No Brasil, é necessário o voto de oito dos Ministros para que seja negada a repercussão geral da matéria (ou 72,72%), adotando-se, pelo contrário, a pressuposição de que a matéria tem repercussão.

Além disso, o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal estabelece que a ausência de manifestação sobre a repercussão geral de determinado tema deve ser interpretada como manifestação por sua existência (art. 324, § 1º), à exceção de hipótese em que o Relator declare que a matéria é infraconstitucional. Nesse caso, a abstenção é interpretada como manifestação pela inexistência de repercussão geral (art. 324, § 2º).

Esse arranjo institucional, ao invés de tornar mais custoso que os ministros ajam conforme suas preferências cognitivas, os incentiva a agir conforme elas. Afinal, o ônus da omissão inexiste – reconhecida a repercussão geral de determinado tema, o seu mérito será avaliado posteriormente. E não é por acaso que em vários temas cuja repercussão geral é reconhecida há omissão expressiva de vários membros da Corte.[16]

Além disso, essa normatização reforça um outro viés cognitivo identificado pela psicologia cognitiva. As pessoas tendem a adotar a posição padrão de um determinado arranjo quando existe uma multiplicidade de escolhas a sua disposição (Sunstein & Thaler, 2008, p. 10-11). Como a posição padrão da sistemática é pelo reconhecimento da repercussão geral, a arquitetura de escolhas instituída pela normatização está incentivando os Ministros a continuarem a reconhecer a repercussão geral da maior parte das matérias.

Não é uma surpresa, portanto, que 70,40% dos temas que chegaram à Suprema Corte tiveram sua repercussão geral reconhecida e que o requisito processual não esteja atuando como filtro de relevância constitucional a que se propusera.

Mudanças pontuais na sistemática da repercussão geral poderiam dar incentivos para que os Ministros atuassem de acordo com a premissa de que o requisito deve funcionar como filtro. A arquitetura de escolha deveria partir do pressuposto de que a maioria dos temas não têm repercussão geral. Desse modo, (i) considerar a omissão como um voto contra a repercussão geral da matéria, (ii) estabelecer quórum qualificado para o reconhecimento da repercussão geral (não para negá-la), (iii) exigir dos ministros voto fundamentado para reconhecer a repercussão geral da matéria seriam medidas institucionais que certamente dariam maior eficiência ao sistema, que passaria a operar segundo as premissas de sua instituição e (iv) obrigar o julgamento de representativos da controvérsia, pela ordem de ingresso no sistema.[17] Essas medidas decerto trariam mais custos para que os ministros atuassem conforme as funções de utilidade acima supostas, tornando mais provável o julgamento conforme os princípios normativos que justificaram a implementação do sistema.

Por fim, uma perspectiva institucionalista decerto examinaria os impactos da repercussão geral sobre todo o sistema judiciário, e não apenas no Supremo Tribunal Federal. Um exame sucinto demonstra a inadequação do efeito do sobrestamento de todos os recursos que versem matéria idêntica a tema cuja repercussão geral foi reconhecida. Essa medida apenas transforma os tribunais de origem em arquivos do Supremo Tribunal Federal e suspende processos por anos a fio — processos que ainda continuarão a tramitar por muito tempo mesmo após o julgamento definitivo da questão. Esse efeito funesto poderia ser evitado pela simples atribuição de efeitos ex nunc às decisões do Supremo Tribunal Federal, que passariam a ter força vinculante apenas após o julgamento de mérito dos temas em que se reconheceu repercussão.[18]

Considerações finais
São irrepreensíveis as preocupações que levaram à implementação do instituto da repercussão geral. É preciso que o Poder Judiciário seja mais eficiente, mais célere e possa, de fato, solucionar as controvérsias que lhe são postas.

Todavia, até aqui a repercussão geral não cumpriu sua proposta. Pelo contrário, o sistema de processamento dos Recursos Extraordinários, ao final de 2012, era 41% mais ineficiente do que no modelo processual anterior. As conclusões do I Relatório “Supremo em Números” não são exatas, pois não levaram em conta várias questões que, na verdade, têm resultado em maior morosidade na tramitação dos Recursos Extraordinários. Isolar a análise no âmbito do Supremo Tribunal Federal, esquecendo-se do impacto sobre os demais órgãos do Poder Judiciário, apenas confere legitimidade a mecanismos que têm causado uma piora nos indicadores de celeridade e eficiência.

Isso não significa dizer que o instituto da repercussão geral carece de utilidade, mas que é necessário reformá-lo de modo que possa, enfim, atingir sua finalidade. Essas reformas não podem, contudo, partir apenas de considerações teórico-processuais — que, como se demonstrou, levaram à construção de um sistema pouco funcional.

É preciso adotar uma leitura institucional que examine as distorções do atual sistema e auxilie na elaboração de alternativas que efetivamente solucionem o problema. Mas, para isso, é preciso lançar mão de novas ferramentas de análise que não têm sido utilizadas pelos juristas, como elementos da economia comportamental, da teoria dos jogos e da teoria da escolha institucional. Busquei mostrar, no presente artigo, um exemplo de tal análise.

* O autor agradece a Juliana Martins Duarte, também assessora do mesmo órgão, por sugestões importantes para as temáticas discutidas, além de revisão precisa do texto.

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[1] Doutorando em Direito, Estado e Constituição pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Mestre em Direito pela mesma instituição em 2007 e em Lógica, Linguagem e Filosofia da Mente pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Filosofia da UnB. No momento em que o artigo foi escrito, o autor era Assessor da Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi na Vice-Presidência do Tribunal Superior do Trabalho, órgão responsável pelo juízo de admissibilidade dos Recursos Extraordinários naquela Corte Superior. O autor agradece a Juliana Martins Duarte, também Assessora do mesmo órgão, por sugestões importantes para as temáticas discutidas, além de revisão precisa do texto. 

[2] Sunstein /Vermeule, 2002.

[3] Mendes/Branco, 2012: 1187.

[4] Mendes/Branco, 2012: 1186-87.

[5] Côrtes, 2012: 16-19; Carvalho Filho, 2011: 27.

[6] Zaidan de Carvalho, 2012: 196-97.

[7] Côrtes, 2012: 101.

[8] Os dados estatísticos utilizados são publicamente divulgados pelo Supremo Tribunal Federal e podem ser acessados em < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica>. Acesso em 10 jan. 2013.

[9] Falcão/Cerdeira/Aguelhes, 2011.

[10] Bonavides, 2000: 63

[11] É importante destacar que o próprio Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal possibilita o julgamento mais célere de questões já decididas por jurisprudência dominante, por julgamento eletrônico (art. 323-A). Todavia, tal medida não tem sido tomada – e temas já decididos na jurisprudência têm a repercussão geral reconhecida e passam anos a fio aguardando julgamento de mérito.

[12] Os dados alusivos a 2011 foram extraídos do relatório emitido pelo próprio Supremo Tribunal Federal no II Seminário Repercussão Geral em evolução. Disponível em <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaRepercussaoGeralRelatorio/anexo/Resultados_apresentados.pdf>. Acesso em 13 jan. 2013. Os dados relativos a 2012 foram obtidos no sítio do STF, em seção destinada a apresentar estatísticas e relatórios da Repercussão Geral – e os números são incompletos, pois retratam a situação apenas até o final de novembro. Disponível em < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=sobrestadosrg>. Acesso em 13 jan. 2013.

[13] Dados apresentados no Congresso Brasiliense sobre Eficiência do Poder Judiciário, realizado nos dias 28 e 29 de junho de 2012 na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Os números foram obtidos no segundo sítio do STF indicado na nota anterior, mas com acesso em 15 jun. 2012.

[14] É importante notar que essa conclusão não leva em consideração os vários incidentes processuais que tramitam nos tribunais de origem em decorrência do processamento dos Recursos Extraordinários. Como o STF decidiu no julgamento do AI-QO 760.358 (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 3/12/2009) e das Reclamações 7.569 e 7.547 (Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 11/12/2009), cabe Agravo Regimental contra decisão que aplica a sistemática da repercussão geral no tribunal de origem. Assim, além do despacho que aplica o precedente de repercussão geral, os órgãos responsáveis pelo processamento dos Recursos Extraordinários devem também julgar Agravos Regimentais, Embargos de Declaração e outros incidentes que decorram do sistema, o que possibilita a multiplicação do número de decisões do Poder Judiciário em um único Recurso Extraordinário. Além disso, também existem várias impugnações apresentadas contra o sobrestamento dos recursos, o que eleva ainda mais a quantidade de incidentes novos a serem decididos.

[15] Não é por acaso que vários tribunais do país (TJPA, TJPI, TJRS, TJPR, TJSC, e os Tribunais Regionais Federais da 2ª e da 4ª Região), ao responder a questionário específico formulado pelo Supremo Tribunal Federal para o II Seminário Repercussão Geral em evolução, identificaram como uma das principais dificuldades para a implementação do sistema a ausência de espaço físico para gestão do acervo. Além disso, vários tribunais identificaram também a carência de pessoal e de recursos de informática para gerenciar os processos.

[16] Confira-se, apenas a título de exemplo, o ocorrido no reconhecimento da repercussão geral do Tema nº 106 da Corte, que dizia respeito a duas questões (“definição da competência para julgar, após o advento da Lei nº 8.112/90, os efeitos de decisão proferida anteriormente pela Justiça do Trabalho” e “extensão do reajuste de 84,32%, relativo ao IPC de março de 1990, concedido pela Justiça Federal em decisão transitada em julgado, a outros servidores”). O Tribunal reconheceu a repercussão geral das matérias mesmo com sete votos contrários, uma abstenção e apenas três votos favoráveis. Disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2631072&numeroProcesso=590880&classeProcesso=RE&numeroTema=106>. Acesso em 16 jan. 2012. 

[17] Essa medida incentivaria o julgamento da Repercussão Geral de várias matérias que não têm sido julgadas na sistemática da repercussão geral, apesar de vasta jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as questões são infraconstitucionais. Essa medida seria necessária porque vários processos considerados como representativos da controvérsia têm sido julgados monocraticamente pelos Ministros, ao invés de serem inseridos no Plenário Virtual a fim de que seja negada, desde logo, a repercussão geral da matéria.

[18] Embora não se tenha discutido a questão, outra medida importante seria a adoção de julgamentos interdependentes entre o sistema difuso e o sistema concentrado de constitucionalidade. Desse modo, caso uma mesma questão esteja sendo debatida nos dois sistemas, a decisão em um deles deveria ser adotada imediatamente no outro. Não é raro que a mesma discussão esteja sendo debatida nos dois sistemas e, após a solução em um, ainda haja longo lapso temporal para que a matéria seja debatida no outro.

Autores

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    é assessor da ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi na vice-presidência do Tribunal Superior do Trabalho, órgão responsável pelo juízo de admissibilidade dos Recursos Extraordinários naquela Corte Superior. Doutorando em Direito, Estado e Constituição pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Mestre em Direito pela mesma instituição em 2007 e em Lógica, Linguagem e Filosofia da Mente pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Filosofia da UnB.

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