Reconstrução da cidadania

Falta vontade política para garantir igualdade para todos

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21 de janeiro de 2013, 16h23

A impossibilidade de ressocialização de delinquentes é hipótese que não existe objetivamente e nem o Direito universal a avaliza como categoria jurídica ou componente do Penalístico desde o advento da obra "Dos Crimes e das Penas" de Cesare Beccaria, tanto aqui em nosso país quanto em qualquer outra parte.

Se esse novo paradigma não fosse institucionalizado desde então, o Estado Moderno seria como que um "Estado terrorista", viveríamos a "Lei da Selva" de um modo tecnologicamente sofisticado, hoje em dia. Daí para a hecatombe seria apenas um simples acionar de um botão.

Descendo a minudências, o que falta mesmo é vontade política para garantir igualdade para todos. Superabunda o egoísmo e o corporativismo tosco deita atividades diversas numa sociedade ainda extratificada como a nossa, comum abaixo do equador. As causas da crise social que vivenciamos por aqui têm raízes multifacetadas, formativas, e não admitem enquadramentos simplistas, acomodatários, fáceis. Esta atitude não seria inteligente, de modo algum!

Diferenças abissais sempre geraram no plano da vida social as mais diversas formas de dissensão. A falta de feedback educacional e moral — obtidos na família ou providenciados pelo estado de bem-estar —, sobretudo entre os menos afortunados, agrava essa atmosfera e recrudesce os estereótipos acerca da ideia que comumente alinhavamos, como classe média, de criminalidade urbana. Muitas dessas ocorrências sequer chegam a ser investigadas, e deveriam ser investigadas pelas mesmas razões de Justiça que naturalmente explicam tanta fúria, não raro apologética do crime, observada hodiernamente contra os que erram e são normalmente privados da sorte econômica e social.

Com efeito, constata-se essa evidência histórica pelo perfil clássico das populações carcerárias, de um lado, e pelas estatísticas de crimes irresolvidos, além da própria violência urbana e rural, de outro. Tudo isso causa sem dúvida enormes perplexidades ao espírito e uma não menos intensa sensação de impotência diante desse fenômeno. Daí para o fomento às imagens mais primitivas como pano de fundo para soluções imaginárias é um salto relativamente pequeno, e seguramente descuidado. O espírito científico não vive de crendices, superstições ou preconceitos lombrosianistas, ainda que a imaginação humana seja pródiga em ver coisas em que e no quê simplesmente elas não acontecem, ou acontecem em face de uma outra natureza, abordada em desfoco. Quanto a isto, certas proposições traduzem simples absurdos éticos e abominações cognitivas, nada obstante a inteligência costumeira dos críticos. A propósito, a inteligência nem sempre serve a razão, e basta que alguma razão corporativa ou de Estado se insinue para que esta ceda àquela, inapelavelmente, sob as sombras dos mais refinados sofismas de acidente ou de ciladas dialéticas bem postos para aparelhar os incauto ou os celerados. Eles omitem, de ordinário e por alguma necessidade retórica de natureza utilitária, que há muitas outras formas de criminalidade que nem de longe passam, também ordinariamente, nas considerações de alguém que habita a classe média (peleguismo social), sobretudo a classe média alta (domínio econômico das superestruturas), como argumento de Justiça, sempre sectário.

Desse prisma não pode haver abordagem panóptica que projete a visão dos objetos conforme as suas inúmeras perspectivas, e nem proveja suas soluções com inteira razoabilidade. Hoje e desde o advento da Cristandade, razoabilidade alguma se impõe eticamente sem a perfeita observância da Doutrina Universal dos Direitos Humanos.

Ressocializar é preciso, por mais complexo que seja o processo individual de reconstrução da cidadania. Pois, não se justifica que, a pretexto de combater o crime, sejamos criminosos também. Isto é uma abominação ética absolutamente inconciliável com os tempos contemporâneos em que vivemos.

Em que pesem as boas intenções dos que se indignam, com razão, em face da violência e sem querer de nenhum modo justificá-la, é claro que se deve discordar desse discurso do ódio e da intolerância — para quem: “bandido bom é bandido morto” — que agrava o fosso social entre as classes e valoriza a fiscalização estatal como milícia de alguns.

Está errado!

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