Punição da Conmebol

Corintiana vai à Justiça para ver jogos da Libertadores

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27 de fevereiro de 2013, 13h16

Uma torcedora do Corinthians foi à Justiça de São Paulo para tentar garantir seu direito de assistir aos jogos de seu time na Copa Libertadores da América. Ela protesta contra determinação da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) de que o Corinthians jogue sem torcida em todos as disputas do torneio, depois que um torcedor boliviano morreu atingido por um sinalizador disparado por um corintiano em partida disputada no México, na quarta-feira passada (20/2). 

A corintiana Lucelita Ferreira Vascsoncelos, representada pelo advogado Paulo Cremonesi, reclama seu direito de consumidora de assistir seu time jogar no estádio do Pacaembu, em São Paulo, pois comprou o ingresso antecipadamente, antes da proibição da Conmebol. Mais do que isso. Lucelita pede que a Justiça a autorize a ver todos os jogos do Corinthians disputados no Brasil.

A Conmebol proibiu os torcedores de ver o Corinthians jogar porque, na última partida do time na Libertadores, um torcedor do adversário San José de Oruro, boliviano, morreu, atingido por um rojão disparado por um torcedor corintiano, durante a partida.

O pedido da torcedora não se relaciona com o crime. Lucelita e seu representante afirmam que, por mais que a Conmebol seja uma entidade de Direito Privado internacional, seus direitos são regulamentados pela lei federal brasileira.

“Não obstante, não há que se falar em conflito de normas porquanto não se versa sobre tratado de Direito internacional, mas sim de uma decisão administrativa de uma entidade esportiva emanada de seu regulamento (Sem entrar aqui no mérito sobre a coerência da punição). Assim, o tratado terá eficácia apenas no âmbito externo, até que seja ‘incorporado’ internamente. Mais ainda quando se trata conflito entre uma decisão interna de uma entidade privada que se sobrepõe a direitos emanados de duas leis federais internas”, argumentam.

Lucelita também afirma que foram violados o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Torcedor. O último dispositivo diz, no artigo 40, que “a defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores em juízo de que trata o Título III da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990”. A referência é ao CDC.

Por fim, a torcedora pede a concessão de liminar para que seja liberada para assistir aos jogos do Corinthians no estádio do Pacaembu e que seja oficiada a Polícia Militar. Também pede o oficiamento do estádio, para que permita a sua entrada e requer, “caso seja necessário”, “o uso de força policial a fim de assegurar o direito da requerente”.

Leia abaixo o pedido de Lucelita Vasconcelos para ver os jogos do Corinthians:

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito do Juizado Especial Cível

Lucelita Ferreira Vasconcelos, brasileira, solteira, auxiliar de administração Rg. 40.483.929-0,CPF: 353.936.398-05 com endereço na Rua Dr Jose de Moura Resende 165 Caxingui, São Paulo Capital, por seu Advogado que esta subscreve, vem à presença de Vossa Excelência ajuizar a presente MEDIDA CAUTELAR em face de CONFEDERAÇÃO SUL AMERICANA DE FUTEBOL, cuja sigla é CONMEBOL, entidade de direito privado internacional com representação no Brasil, mais especificamente em São Paulo na pessoa de Hildo Nejar, em sede na Vice Presidência de Relações Internacionais da Federação Paulista de Futebol, com endereço na Rua Federação Paulista de Futebol, 55 – Barra Funda CEP 01141–040 São Paulo/SP, pelos motivos de fato e de direito abaixo mencionados e a seguir expostos conforme seguem:

Prefacialmente

A requerida, Confederação Sul-Americana de Futebol (espanhol: Confederación Sudamericana de Fútbol), mais conhecida pelo acrônimo CONMEBOL, ou CSF, é a entidade que organiza todos os campeonatos futebolísticos que envolvam os países da América do Sul.

Está sediada na cidade de Luque, (perto da capital Assunção) no Paraguai mas mantém representações nos países afiliados, como no caso em questão.

Os campeonatos mais conhecidos são a Copa Libertadores da América, disputado por clubes e a Copa América, disputado por seleções.

Histórico

Neste ano, de 2013, a entidade requerida faz realizar mais uma edição da COPA LIBERTADORES DA AMÉRICA, com participação de vários clubes, dentre eles o Sport Clube Corinthians Paulista.

Neste sentido e, seguindo o calendário de jogos, no último dia 20 de fevereiro, em jogo realizado na Bolívia, um torcedor ainda não oficialmente identificado pelas autoridades Bolivianas, em circunstâncias ainda em apuração, fez lançar um dispositivo conhecido como “sinalizador”, artefato que, por sua natureza, causou a morte de um torcedor de nacionalidade boliviana.

SEM ENTRAR NO MÉRITO QUANTO A ATITUDE TIDA COMO CRIMINOSA DO AUTOR DOS FATOS ATÉ AQUI NARRADOS, a entidade requerida, sumariamente e a título de punição AO CLUBE CORINTHIANS, DETERMINOU QUE ESSA AGREMIAÇÃO REALIZASSE OS JOGOS DA COMPETIÇÃO SEM NENHUM TORCEDOR NO ESTÁDIO, escudada em suposto item do regulamento da competição.

Em resumo, ao contrário de punir O CLUBE PARTICIPANTE e que é signatário do regulamento, OPTOU A REQUERIDA POR PUNIR A TORCIDA, I N D I S T I N-

T A M E N T E.

Assim o fazendo, GEROU A REQUERIDA CONSEQUÊNCIAS DANOSAS AOS TORCEDORES DA EQUIPE PUNIDA, GENERALIZANDO A MÁCULA OCASIONADA POR UM CIDADÃO ISOLADAMENTE, MESMO DIANTE DA GRAVIDADE DO ATO PRATICADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS.

As pessoas de bem, que trabalham honestamente e são exemplos de cidadania e que fazem do espetáculo futebolístico momento de lazer, SÃO CRIVADAS POR UMA DECISÃO GENÉRICA em razão de um ato praticado por alguém que, obvio, tem perfil e comportamento COMPLETAMENTE DIVERSO DA REQUERENTE.

DO DIREITO

Neste diapasão, A REQUERENTE, já no final do ano de 2012, ADQUIRIU INGRESSOS ANTECIPADOS, ENTÃO VENDIDOS E PAGOS (conforme demonstram os documentos anexos) para diversos jogos da competição.

Vê agora a requerente seu direito violado, como efetivamente está e conforme será demonstrado a seguir.

É cediço que o regulamento da entidade requerida se constitui de uma cártula de direito internacional PRIVADO e os direitos da requerente encontram repouso em LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ESPECÍFICA, qual seja, o Estatuto do torcedor, Lei LEI No 10.671, DE 15 DE MAIO DE 2003 e o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8078/90.

A Constituição brasileira, por não dispor de cláusula indicativa da supremacia do direito internacional face ao direito interno, deixa para a jurisprudência a importante tarefa de definir um posicionamento a respeito da questão do conflito entre normas.

Não obstante, não há que se falar em conflito de normas PORQUANTO NÃO SE VERSA SOBRE TRATADO DE DIREITO INTERNACIONAL MAS SIM DE UMA DECISÃO ADMINISTRATIVA DE UMA ENTIDADE ESPORTIVA EMANADA DE SEU REGULAMENTO (Sem entrar aqui no mérito sobre a coerência da punição) .

Mesmo se assim fosse, se a questão versasse sobre um tratado internacional em conflito com duas leis federais, invocamos a teoria DUALISTA que surgiu no fim do século XIX, tendo como principais expoentes Carl Heinrich Triepel , na Alemanha e Dionisio Anzilotti, na Itália. No Brasil, destacamos Amílcar de Castro e Nádia de Araújo.

Para esta tese, os dualistas levam em consideração que o DI é a relação entre Estados, enquanto que o direito interno regula a conduta entre Estado e seus indivíduos. Assim, o Tratado terá eficácia apenas no âmbito externo, até que seja "incorporado" internamente.

Em outras palavras, o dualismo imagina o direito interno e o direito internacional como duas ordens jurídicas diferentes e independentes entre si. Não se fala em conflito de normas, já que o direito internacional só terá validade para o ordenamento jurídico nacional a partir do momento em que aquele for incorporado neste.

Assim, o direito internacional não ingressará automaticamente na órbita jurídica interna do Estado, a partir da ratificação, mas tão somente mediante incorporação ou internalizarão (transposição da norma de origem internacional para o sistema interno através de uma manifestação legislativa).

Devido ao aspecto da incorporação, surgiram duas subdivisões ao dualismo :

A) DUALISMO RADICAL – nesta modalidade, só terá valor jurídico interno o Tratado que for internalizado mediante lei stricto sensu. Ex. Na Itália ocorre a ratificação seguida da lei de aprovação.

B) DUALISMO MODERADO – nesta modalidade, a internalização prescinde de lei (pode se dar através de simples Decreto), embora seja necessária a observância do procedimento previsto no direito interno. Ex. No Brasil ocorre a ratificação e a promulgação presidencial via Decreto.

Incorporado o Tratado, havendo conflito de normas, já não se fala mais em contrariedade de norma interna e Tratado, mas em conflito entre dois dispositivos nacionais.

A disciplina que rege a relação jurídica do estrangeiro em território do qual não é nacional é a última fronteira de exploração científica do que chamamos Direito. Por isto mesmo, remanesce inebriada em certos dogmas, mais baseados na fé de alguns expoentes "internacionalistas" do que em evidências do que o fenômeno realmente representa.

MAIS AINDA QUANDO SE TRATA CONFLITO ENTRE UMA DECISÃO INTERNA DE UMA ENTIDADE PRIVADA QUE SE SOBREPÕE A DIREITOS EMANADOS DE DUAS LEIS FEDERAIS INTERNAS.

O estatuto do Torcedor em seu artigo 40 reza:

A defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores em juízo de que trata o Título III da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990.

Neste sentido, reza o artigo Art. 22.

São direitos do torcedor partícipe:

 

I – que todos os ingressos emitidos sejam numerados; e

 

II – ocupar o local correspondente ao número constante do ingresso.

Com efeito, a requerente POSSUI INGRESSO NUMERADO (item I) e QUER VER ASSEGURADO O DISPOSTO NO INCISO II da LEI No 10.671, DE 15 DE MAIO DE 2003.

Ainda assim, e por interpretação analógica a Lei 8078/90, explicitamente mencionada no artigo 40 da Lei 10.671, DE 15 DE MAIO DE 2003.encontramos mais e total respaldo ao direito pretendido, senão vejamos:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade.

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

Assim sendo, a requerente quer ver assegurado SEU DIREITO DE ASSISTOR NO LOCAL AS PARTIDAS PARA AS QUAIS ADQUIRIU INGRESSO conforme consta dos documentos anexos e que serão especificadas ao final.

Reiteramos, uma decisão administrativa de uma entidade internacional NÃO PODE SE SOBREPOR A LEIS FEDERAIS VIGENTES NO BRASIL.

Como já demonstramos anteriormente, MESMO QUE SE IN CAUSU ESTIVESSEMOS DIANTE DE UM TRATADO INTERNACIONAL, PREVALECERIA A NORMA INTERNA.

Quanto mais uma decisão sumária de uma entidade internacional que pretende ver dentro do território nacional, suplantando normas internas federais, os efeitos de uma punição, atingindo QUEM NÃO TEM RELAÇÃO COM A REQUERIDA E NEM ESTÁ SUJEITO ÀS SUAS NORMATIZAÇÕES, ou seja, A REQUERENTE.

A medida da REQUERIDA, FERE TAMBÉM O DIREITO DE IR E VIR DA REQUERENTE, tamanha a disparidade ensejada em suas conseqüências, à luz do direito pátrio.

DO PERIGO IMINENTE

Não se trata de CANCELAMENTO, mudança de dia ou horário de um jogo de futebol.

O jogo VAI SE REALIZAR e a REQUERIDA IMPOSSIBILITA O EXERCÍCIO DO DIREITO DA REQUERENTE.

Depois de realizada, sem o efetivo exercício do direito da requerente assegurado, nada mais poderá ser feito.

DO PEDIDO

Por todo o exposto, a REQUERENTE requer a medida judicial pretendida para assegurar seu direito de estar presente como torcedora NOS JOGOS DA COMPETIÇÃO EM QUE O CORINTHIANS fizer no BRASIL DECLARANDO-SE, ASSIM, LIMINARMENTE ESSE DIREITO com a conseqüente OBRIGAÇÃO DE FAZER por parte da REQUERIDA, aliás, o que será pretendido também em campo de ação principal posteriormente.

CONCEDIDA A LIMINAR, requer seja oficiada a requerida por meio de seu REPRESENTANTE LEGAL.

Requer ainda a expedição de OFÍCIO DIRIGIDO AO COMANDANTE GERAL DA POLÍCIA MILITAR informando e determinando o ingresso da Requerente no estádio.

Expedição de OFÍCIO A ADMINISTRAÇÃO DO ESTÁDIO PAULO MACHADO DE CARVALHO situado na Praça Charles Muller s/n comunicando os termos da LIMINAR CONCEDIDA E DETERMINANDO QUE SE ASSEGURE O INGERSSO DA REQUERIDA NAQUELE LOCAL.

Requer ainda que se faça constar CASO NECESSPARIO o uso de força policial a fim de assegurar o direito da REQUERENTE, haja vista que somente multa diária tira os efeitos da eficácia da decisão proferida.

Nestes termos, pede deferimento

São Paulo, 26 de fevereiro de 2013.
Paulo Cremonesi OAB-SP 98.384

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