Código de Mineração

Projeto de lei quebra estabilidade das relações jurídicas

Autor

  • Paula Guimarães Figueiredo

    é advogada associada do escritório Grebler Advogados especialista em direito ambiental imigração licitações e contratações públicas mineração e siderurgia. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos e pós-graduanda em Regime Jurídico dos Recursos Minerais pela Faculdade de Direito Milton Campos.

31 de agosto de 2013, 7h00

Após quase três anos desde os primeiros anúncios sobre o tema, o Governo Federal encaminhou ao Legislativo, no dia 19 de junho, o Projeto de Lei para o Novo Marco Regulatório do Setor Mineral Brasileiro. O texto, com 59 artigos, propõe a alteração completa do sistema atual aproveitamento dos recursos minerais.

Atualmente, um dos princípios basilares do Direito Minerário é o chamado direito de prioridade, segundo o qual, em termos gerais, aquele que primeiro requerer uma área para a realização de pesquisa terá a outorga do Poder Público para lavrar o minério que porventura for identificado, desde que observe a cadência de atos coordenados que norteiam a concessão mineral.  A principal alteração proposta pelo Projeto de Lei é a modificação desse regime, que praticamente deixaria de existir, dando lugar ao sistema de concessões precedido por licitação ou chamada pública.

Referida proposta é motivo de preocupação para o setor, já que a eliminação do direito de prioridade culmina na eliminação de um importante valor na cadeia exploratória mineral. Explica-se: a pesquisa mineral é atividade de alto custo e risco, sendo o investimento em pesquisa premiado com o direito de extração do mineral. Os empreendedores que assumem o risco da pesquisa em áreas até então desconhecidas podiam negociar suas descobertas, viabilizando a extração por eles ou terceiros, bem como o reinvestimento em pesquisas em novas áreas. Não apenas no Brasil, as atividades de pesquisa e exploração não raro são desempenhadas por agentes distintos. As atividades de pesquisa concentram-se em empresas com perfil exploratório, e as de extração e aproveitamento com outras. Portanto, o direito antes negociado pelas empresas de exploração deixa de existir, o que representa eliminação de direito com valor econômico, mas também alteração na própria sistemática da pesquisa e extração, que agora seriam concentradas pelo requerente que saísse vencedor do procedimento de concorrência pública, o qual assinaria contrato de concessão para as fases de pesquisa e de extração.

A alteração proposta, de certo, afetará as decisões relativas a investimento em pesquisa no país. Considerando-se que a extração mineral é precedida pela atividade de pesquisa, e que o território nacional é muito pouco pesquisado se levados em conta o potencial e a extensão territorial, a alteração proposta pode representar impactos na extração, pelo menos em médio prazo.

Em curto prazo, para os investimentos e projetos em curso, importa entender o regime de transição entre a legislação atual e a proposta, caso seja aprovada. Os direitos de lavra já outorgados serão mantidos. Contudo, nos casos de cessão desses direitos minerários, ou de alteração societária que implique em alteração direta ou indireta de controle, o interessado terá de se submeter ao contrato de concessão nos moldes da nova legislação, em todos os seus encargos e obrigações.

No caso de requerimentos em que já tiver havido outorga do alvará de pesquisa, será garantido ao titular o direito de apresentação do relatório final de pesquisa, o qual, se aprovado, dará ao titular o direito de lavrar, mediante assinatura do contrato de concessão segundo os moldes da nova legislação. A mesma sistemática será aplicada para casos em que já tiver havido apresentação do relatório final de pesquisa e para casos em que já houver relatório final de pesquisa aprovado e requerimento de lavra apresentado mas ainda não aprovado. Aponta-se, ainda, que no caso de pesquisas não iniciadas, o projeto prevê a concessão de prazo de sessenta dias contados da publicação da Lei para seu início, sob pena de revogação da autorização de pesquisa. Com respeito à renovação de alvarás de pesquisa outorgados anteriormente, a proposta prevê a possibilidade de prorrogações pelo prazo adicional de apenas um ano, e desde que comprovada a realização dos trabalhos de pesquisa durante o período anterior.

A controvérsia ficaria instaurada quanto aos requerimentos em que os alvarás de pesquisa ainda não tenham sido deferidos. Segundo o Projeto de Lei, os titulares desses requerimentos teriam que manifestar interesse no prosseguimento de seus pedidos em um prazo de noventa dias contados da publicação da lei e promover as adaptações necessárias nela previstas. Caso as manifestações de interesse em prosseguimento dos processos estejam conformes, seriam então recebidas como pedidos para a instauração de procedimento de chamada pública para a exploração/extração mineral na área.

Portanto, os titulares de requerimento de pesquisa deixariam de ter prioridade sobre as áreas objeto de seus requerimentos, as quais serão oferecidas em igualdade de condições para terceiros interessados. Neste ponto, o projeto de lei, a nosso ver, quebra a estabilidade das relações jurídicas na medida em que não respeita a prioridade do interessado que primeiro requereu determinada área para pesquisa, o que, até então, lhe garantiria o direito de outorga de alvará de pesquisa e portaria lavra desde que observasse os trâmites legais. Sem dúvida, a proposta provocará, se aprovada, uma enxurrada de questionamentos judiciais sobre o tema. No entanto, a volatilidade do fluxo de investimentos pode impactar negativamente o volume de investimentos em mineração no Brasil, o que deve ser levado em conta pelos legisladores ao analisar o tema. O esvaziamento dos investimentos impactaria negativamente não somente o setor de mineração, mas todos os que dele dependem.

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    é advogada associada do escritório Grebler Advogados, especialista em direito ambiental, imigração, licitações e contratações públicas, mineração e siderurgia. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos e pós-graduanda em Regime Jurídico dos Recursos Minerais pela Faculdade de Direito Milton Campos.

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