Mudança de prazos

Lei sobre recuperação judicial precisa de ajustes

Autor

  • Fernando Pompeu Luccas

    é advogado em São Paulo membro da comissão de estudos sobre Direito Recuperacional e Falimentar da subseção de Campinas da OAB especialista em Direito Processual Civil pela Puc de Campinas e pós-graduando em Direito Empresarial pela Escola Paulista de Direito e em Recuperação de Empresas e Falências pela Fadisp

17 de agosto de 2013, 8h28

Dispõe o artigo 59 da Lei 11.101/2005 que o plano de recuperação judicial aprovado em assembléia e homologado pelo juiz implica novação dos créditos a ele sujeitos.

No artigo 61, a lei prevê que, da decisão de concessão da recuperação judicial, o devedor permanecerá em recuperação até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem em até dois anos.

Por sua vez, o parágrafo 1º do mesmo artigo diz que durante o período, o descumprimento de qualquer obrigação prevista acarreta na convolação da recuperação em falência; na sequência, o parágrafo 2º prevê que, convolando-se em falência, os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias, nas condições originalmente contratadas, deduzindo-se os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial.

Por conta disso, costuma-se salientar que a novação prevista na Lei 11.101/2005 possui diferenças em relação ao instituto previsto no Código Civil, pois existe esta previsão das dívidas retornarem às condições originais em caso de convolação em falência.

Tal previsão, por sua vez, mostra-se justa, posto que, pelos credores, são assumidos consideráveis ônus que visam desonerar o devedor, com o intuito maior de promover a recuperação da empresa viável, nos termos do artigo 47 da lei; entretanto, no caso de descumprimento do plano, tais ônus não devem permanecer a cargo dos credores, justificando-se, assim, o retorno das dívidas às condições originais.

No entanto, existe uma questão pontual a se debater: essa condição de retorno das dívidas às condições originais só se opera se o descumprimento ocorrer durante o período de até dois anos da concessão da recuperação; caso o descumprimento ocorra depois, caberá ao credor requerer a execução específica ou a falência do devedor, porém com base no crédito novado.

Ou seja: se há previsão, por exemplo, de deságio de 50% nos créditos de determinada classe, e o devedor deixa de honrar com os pagamentos no período de dois anos, o crédito retorna aos 100% (deduzidos os valores já pagos); ao passo que, superado esse prazo, mesmo que seja no mês seguinte, o credor terá seu crédito reduzido à metade, podendo cobrar a empresa apenas por esse montante em caso de descumprimento.

Conforme costumamos observar, mostra-se muito comum, por exemplo, a previsão de carência de dois anos para pagamentos nos planos de recuperação, prazo exatamente igual ao período de trâmite pós-concessão; hoje em dia se observa, inclusive, nova modalidade, que se pode denominar de “carência maquiada”, prevendo-se pagamentos ínfimos nos primeiros dois anos com a justificativa de crescimento paulatino do faturamento.

Nesses dois casos, o que ocorrerá, na prática, será que nenhum ou quase nenhum pagamento será efetuado no período bienal, concedendo-se a diminuição da dívida, quase que automática, com a concessão da recuperação, por conta da novação conforme é prevista atualmente na lei.

Isso não se mostra justo, considerando-se também que os planos de recuperação costumam ter prazos muito mais longos que dois anos.

Dessa forma, vê-se que a lei precisa de alguns ajustes, que passam pela reflexão do período efetivo que a recuperação deve tramitar em juízo e da própria sustentação da novação, em caso de descumprimento futuro.

Quanto ao prazo de dois anos, parece-nos que a lei trouxe tal previsão inspirada no Decreto-Lei 7.661/45, equiparando ao prazo da concordata.

No entanto, a prática nos mostra que os planos duram muito mais tempo, razão pela qual cabe reflexão no sentido de se alterar a lei, prevendo-se que a recuperação tramitará em juízo pelo período previsto no plano; em caso de descumprimento, convolar-se-ia o procedimento em falência, retornando os créditos ao status quo ante.

Essa reflexão certamente causará muita discussão, visto que o trâmite por longo tempo pode gerar ônus ao judiciário, custos ao devedor etc.

Outra alternativa, um pouco menos polêmica e que tornaria a questão da novação mais justa, seria mantê-la apenas caso se desse o cumprimento total do plano. Efetuados todos os pagamentos previstos, nada mais seria devido aos credores por parte do devedor; ao passo que, em caso de descumprimento, mesmo após os dois anos da concessão, os débitos retornariam às condições originais, deduzindo-se o que já tivesse sido pago, possibilitando aos credores ingressarem com as execuções e os pedidos de falência por esse montante.

Tal alteração legal se mostra coerente e justa, visto que o descumprimento do plano durante os dois anos ou após esse período culmina no mesmo rompimento de avença, que jamais poderia premiar o infringente, considerando-se o esforço dos credores em concurso para a desoneração do devedor em prol da manutenção da empresa.

Seria uma forma de resguardo do interesse dos credores, conforme previsto no artigo 47, reforçando-se a necessidade do cumprimento integral do plano, como forma de se solidificar a recuperação efetiva da empresa viável e a própria norma.

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  • é advogado em São Paulo, membro da comissão de estudos sobre Direito Recuperacional e Falimentar da subseção de Campinas da OAB, especialista em Direito Processual Civil pela Puc de Campinas e pós-graduando em Direito Empresarial pela Escola Paulista de Direito e em Recuperação de Empresas e Falências pela Fadisp

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