Observatório Constitucional

Momento convida a pensar um 'direito constitucional vivo'

Autores

  • André Rufino do Vale

    é doutor e pós-doutor em Direito líder do Grupo de Estudos e Pesquisas Observatório Constitucional (IDP/CNPq) e procurador federal da AGU.

  • Fábio Lima Quintas

    é editor-chefe do Observatório da Jurisdição Constitucional pós-doutor em Ciências Jurídico-Processuais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra doutor em Direito do Estado pela USP mestre em Direito do Estado pela UnB professor no curso de graduação em Direito no mestrado e no doutorado acadêmico do IDP (Brasília) e advogado.

10 de agosto de 2013, 8h00

Há um ano, na primeira semana de agosto de 2012, o Observatório da Jurisdição Constitucional, do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), inaugurou sua coluna Observatório Constitucional neste prestigiado portal da revista eletrônica Consultor Jurídico, com uma série semanal de artigos produzidos primordialmente pelos membros de seu Conselho Editorial. As colunas, publicadas sempre aos sábados, produziram notícias e reflexões críticas a respeito dos principais acontecimentos da jurisdição constitucional, no Brasil e em outros países, e sobre a teoria que em torno dela se desenvolve. Ao completarmos um ano, queremos ressaltar mais uma vez a importância de manter canais abertos para a reflexão em torno de nossas práticas constitucionais, especialmente no âmbito da jurisdição constitucional. E o fazemos num momento muito especial para a consolidação da democracia e do constitucionalismo no Brasil, que são estas vésperas do 25º aniversário da Constituição de 1988, no próximo dia 5 de outubro de 2013. O esforço do Observatório, desde 2007, ano em que foi criado, é exercitar um olhar próprio sobre a jurisdição constitucional, que se volta à reflexão sobre a atuação concreta das instituições políticas, especialmente das cortes constitucionais, e assim retratar um “direito constitucional vivo” (tomando como referência a distinção entre o “law in the books” (lei nos livros) e o “law in action” (lei em ação) a que muito se referia Roscoe Pound).

Essa atividade de observação constante da prática institucional tem uma importância fundamental para uma teoria constitucional que depende cada vez mais de dados empíricos a respeito do funcionamento de fato de nossas instituições. E isso tem impactos relevantes, por exemplo, já no crucial debate sobre as relações entre jurisdição constitucional e democracia, que desde algum tempo tem notoriamente ganhado muita atenção dos constitucionalistas brasileiros. Não se pode mais negar que as questões sobre as relações entre jurisdição constitucional e democracia são hoje menos normativas e mais empíricas.

De fato, pode-se dizer que as relações entre democracia e constitucionalismo, ao invés de suscitarem um debate filosófico que busque um modelo ideal (normativo) de relação (de tensão ou de conciliação) entre si, devem pressupor cada vez mais o conhecimento em concreto das diferentes realidades políticas, dependendo crescentemente da aferição empírica das práticas e dos resultados que os diferentes modelos institucionais proporcionam nas diversas democracias. Nessa perspectiva, o Observatório quer estar atento a olhares como o do historiador britânico Tony Judt, para quem

“Como intelectuais ou pensadores políticos, é provável que nos vejamos confrontados com uma situação na qual nossa principal tarefa não é imaginar mundos melhores, mas pensar em como evitar piores. E essa é uma espécie ligeiramente diferente de situação, na qual o tipo de intelectual que delineia grandes quadros de situações idealizadas e improváveis talvez não seja a pessoa a quem mais vale a pena dar ouvidos.
[…]
Tudo isso é duro para os intelectuais, a maioria dos quais se imagina defendendo e propondo grandes abstrações. Mas penso que nas próximas gerações o modo de defender e propor grandes abstrações será defender e cuidar de instituições, leis, normas e práticas que encarnam nossos melhores esforços em relação a essas grandes abstrações. E os intelectuais que se importarem com elas serão as pessoas que terão mais importância.”[1]

O Observatório se mostra sensível, pois, a esse desafio e busca revisitar as relações entre a jurisdição constitucional e a democracia não a partir de uma abordagem normativa e universal, mas empírica e contextual, atenta aos diversos contextos políticos e ao desenvolvimento em concreto das instituições democráticas.

É o que se procurou alcançar nas diversas colunas apresentadas pelos articulistas do Observatório aos exigentes leitores da ConJur, que, de parte a parte, nunca se furtaram de se posicionar em debates controvertidos[2]. Serviram, por exemplo, de pretexto para essa investigação (1) decisões polêmicas do Supremo Tribunal Federal, (2) o embate entre o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, (3) aspectos da jurisdição constitucional em outros países, e, de forma geral, (4) as nossas práticas constitucionais, envolvendo questões como interpretação, federalismo, a relação entre os diversos órgãos do Poder Judiciário com o Supremo Tribunal Federal e a função do Conselho Nacional de Justiça.

Nesse momento em que a Constituição está prestes a completar seu quinto lustro, uma visão retrospectiva, considerando a amplitude de temas e a profundidade das discussões, parece indicar que a jurisdição constitucional se desenvolveu de forma vertiginosa nos últimos anos, especialmente no último quinquênio (2008-2013). Quinquênios podem converter-se em boas oportunidades para se produzir reflexões a respeito de nossas práticas institucionais, isto é, para pensarmos e avaliarmos criticamente o quanto estamos avançando nos objetivos primordiais de fortalecimento das instituições democráticas, na proteção e efetivação dos direitos fundamentais e no cultivo da força normativa de nossa Constituição.

Agradecendo a todos que colaboraram com esta coluna, sobretudo aos seus leitores, e aproveitando esse marco, em que a Constituição de 1988 completará o seu primeiro quarto de século e esta coluna completa seu primeiro ano de existência, renovamos o convite para que prossigamos nesse debate público, em que, apesar de (ou com as) profundas divergências que cercam nossas opiniões, se pode identificar o compromisso comum, que nos reúne neste projeto de “instituir um Estado Democrático” que seja apto a promover “uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”, repensando, a cada momento, nossas práticas constitucionais.


[1] JUDT, Tony (com SNYDER, Timoty), Sobre intelectuais e democracia, Revista Piauí 67, Seção Tribuna da História, abril de 2012. Disponível em http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-67/tribuna-da-historia/sobre-intelectuais-e-democracia , último acesso em 6 de agosto de 2013. Texto extraído do livro Thinking the twentieth century, New York, Penguin Books, 2013.
[2] Confira no seguinte link a lista de todos os artigos publicados: http://www.conjur.com.br/secoes/colunas/observatorio-constitucional

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