Além das fronteiras

STF não esgota matéria ao julgar coligadas no exterior

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10 de abril de 2013, 21h09

Depois de mais de dez anos e sem encerrar por completo a discussão da matéria, o Supremo Tribunal Federal definiu que é inconstitucional a tributação de empresas sediadas no exterior e coligadas a multinacionais brasileiras antes da distribuição dos lucros aos acionistas no Brasil, contanto que estas não estejam sediadas em paraísos fiscais. O STF também definiu, nesta quarta-feira (10/4), que, no caso de empresa controlada sediada em paraíso fiscal, é constitucional a tributação no momento da apuração do lucro líquido ainda no exterior. Apenas para estes dois modelos o STF proclamou a decisão com efeito vinculante.

Porém, os ministros não decidiram se o artigo 74 da Medida Provisória 2.158/01 — que estabelece a tributação — vale para empresas coligadas situadas em paraísos fiscais, já que o julgamento desta questão na Ação Direta de Inconstitucionalidade empatou (com cinco votos a cinco) e não pôde ser desempatada, porque não era objeto dos Recursos Extraordinários que tratavam do mesmo tema. Para as controladas sediadas em países sem tributação favorecida (que não são paraísos fiscais), o tribunal decidiu que a norma vale, mas, como não houve efeito vinculante, a decisão apenas abre um precedente para decisões futuras.

Vale dizer que o tribunal manteve o que dispõe a Lei Complementar 104/01 e a Medida Provisória 2.158/01, que autorizam a tributação, por meio do Imposto de Renda de Pessoa Física e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, ainda no momento da apuração do lucro no exterior, no caso de empresas controladas, independente de estarem ou não sediadas em países de “legislação favorecida”, embora a decisão só tenha eficácia erga omnes no caso de controladas em paraísos fiscais.

Uma sociedade coligada é aquela em que a multinacional exerce sobre ela influência relevante, geralmente com uma participação superior a 20%, embora esse percentual não seja previsto em lei. A controlada está subordinada diretamente à multinacional, a ponto desta poder tomar decisões administrativas, inclusive em relação à escolha de diretores.

O STF encerrou nesta quarta-feira o julgamento conjunto da matéria, que era tratada em uma ADI e em dois Recursos Extraordinários. A ADI 2.588 foi ajuizada há quase 13 anos pela Confederação Nacional da Indústria. Seis ministros aposentados já haviam votado sobre seu mérito quando, na semana passada, o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, relator da ação, proferiu seu voto-vista também pela procedência parcial da ADI, reconhecendo a inconstitucionalidade da norma posta pelo artigo 74 da MP 2.158, contanto que as coligadas não estejam em paraísos fiscais. Como a ministra aposentada Ellen Gracie também havia votado pela procedência parcial da ação, mas num sentido diferente, o STF encerrou o julgamento da ADI, na quarta passada, sem conseguir proclamar o resultado.

Sem definição em relação a ADI, o presidente do tribunal chamou a julgamento os Recursos Extraordinários, o que gerou impasse em relação à tese que prevaleceu na primeira ação e em relação às consequências de se prosseguir com o julgamento dos REs sem se definir o processo anterior.

Em um esforço de proclamar o resultado, o ministro Teori Zavascki iniciou a sessão desta quarta tentando explicitar o que fora definido até aquele momento. O ministro reconheceu que, com o julgamento de semana passada, havia maioria para declarar a inconstitucionalidade da norma nos casos de coligadas situadas fora de paraísos fiscais e que também se formou maioria para declarar a constitucionalidade da norma nos casos de controladas com domicílio em paraíso fiscal (6 votos a 4 em ambos os casos).

Do mesmo modo, Zavascki admitiu empate no caso de se declarar a constitucionalidade da regra para coligadas situadas em paraísos fiscais e sua inconstitucionalidade no caso de controladas fora de paraísos. Na sessão anterior, o ministro Dias Toffoli já havia proposto algo semelhante, na intenção de reconhecer pelo menos a procedência parcial da ADI.

O Plenário do STF acabou declarando a procedência parcial da ação, prevalecendo a tese formulada no voto-vista do ministro relator. Apenas Ricardo Lewandowski, que havia votado pela procedência integral da ADI, não acompanhou o entendimento de Joaquim Barbosa quanto à legalidade da norma apenas para empresas coligadas sediadas em paraísos fiscais.

Recursos Extraordinários
Por maioria de votos, vencido apenas o ministro Marco Aurélio, o STF decidiu negar provimento ao RE 611.586, ajuizado pela Coamo Agroindustrial Cooperativa contra a União. A maioria dos ministros entendeu, deste modo, que a multinacional recebe recursos de coligada sediada em paraíso fiscal. A decisão não tem efeito vinculante, valendo apenas para o caso específico.

No caso da outra ação, o RE 541090, foi dado provimento parcial ao recurso da União contra a decisão do TRF-4 favorável à Empresa Brasileira de Compressores (Embraco). A decisão neste último caso divide-se em duas. Na questão de mérito, restaram vencidos os ministros Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que entenderam que a União não pode tributar a Embraco com base na mera apuração do lucro líquido.

Como os ministros começaram a discutir a questão da superioridade dos tratados internacionais em relação a lei fiscal interna, que protege países signatários do risco de bitributação, — ponto não atacado pelo tribunal de origem — o Plenário decidiu remeter o processo para o TRF-4, a fim de que lá se avalie se a incidência da norma prevista pela medida provisória desconsidera, naquele caso específico, algum tratado que possa vir a impedir a tributação nestes termos.

“A empresa brasileira, confiante em marcos regulatórios internacionais, com essa decisão contra os interesses da recorrida, vai ser apenada com uma execução em milhões”, disse o ministro Ricardo Lewandowski, pouco antes dos ministros decidirem a baixa dos autos para o tribunal de origem, com o fim de que se analise a questão acerca da legislação internacional que combate a dupla tributação. Apenas o ministro Marco Aurélio, que havia votado contra a União, acabou vencido no entendimento de se baixar os autos para o TRF-4, já que havia votado em sentido diverso e assim entendeu que não deveria se manifestar.

Para advogados e juristas que acompanharam o julgamento desta quarta-feira, do ponto de vista prático, a decisão de hoje foi considerada favorável à Fazenda, em razão de a maioria do regime de subordinação de empresas no exterior por multinacionais brasileiras ocorrer por meio do modelo de controladas. “O tribunal validou uma política de combate à elisão e à evasão fiscal e evitará que essas empresas migrem”, comemorou Luís Inácio Adams, advogado-geral da União, após o julgamento.

 

 

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