Decisão sem resultado

Advogados avaliam impasse em julgamento de coligadas

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9 de abril de 2013, 18h36

O Supremo Tribunal Federal retoma, nesta quarta-feira (9/4), o julgamento que deve definir a questão da tributação do lucro de empresas coligadas e controladas no exterior por companhias brasileiras. Ao voltar a discutir a matéria na semana passada, que é objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade e de dois Recursos Extraordinários, o Plenário do STF enfrentou a situação insólita de encerrar o julgamento de umas das ações, a ADI, sem conseguir alcançar o consenso para proclamar o resultado. Não houve empate formal, porém, os ministros não conseguiram formar maioria em relação às diferenças de fundamentação em seus votos.

A ADI e os REs discutem a constitucionalidade do artigo 74 da Medida Provisória 2.158/2001, que autoriza a tributação de coligadas e controladas, por meio do Imposto de Renda de Pessoa Física e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, justamente no momento da apuração do lucro. A norma é questionada por empresas sob o argumento de que, como os impostos referidos incidem sobre renda, a tributação só deve ocorrer quando o lucro for distribuído aos sócios no Brasil — a incidência do tributo, ainda na fase de verificação do lucro no exterior, configuraria dupla tributação.

A ADI 2.588 foi ajuizada em 2001 pela Confederação Nacional da Indústria. Até então, quatro ministros haviam votado pela procedência da ADI (Sepúlveda Pertence, aposentado, Celso de Mello, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski) e outros quatro por sua improcedência (Nelson Jobim, Eros Grau, Cezar Peluso, aposentados, e Ayres Britto). Apenas a ministra Ellen Gracie, também aposentada e então relatora da ação, havia votado pela procedência parcial, concluindo que a expressão “ou coligadas”, contida no artigo 74 da MP 2.158/01, estava mal posta e incorria, portanto, em inconstitucionalidade. 

O ministro Joaquim Barbosa também votou pela procedência parcial da ADI, com uma fundamentação distinta da ministra Ellen Grace, considerando, de tal modo, que cabe a tributação na data do balanço apenas quando se tratar de coligadas situadas em paraísos fiscais. Foram colhidos apenas dez votos, porque o ministro Gilmar Mendes estava impedido de votar na ADI.

Impasse
Com um placar de quatro votos pela procedência, quatro pela improcedência e dois pela procedência parcial fundamentados de forma diversa, o presidente do STF chamou a julgamento o primeiro dos dois Recursos Extraordinários, sem que se chegasse a um consenso em relação à proclamação do resultado do julgamento da ADI. O fato provocou surpresa e muitas dúvidas em advogados e juristas que acompanhavam a sessão da última quarta-feira, que chegaram a questionar sobre precedentes na corte de se ter um julgamento encerrado, mas o resultado desconhecido. 

“Não vejo contradição no Supremo, mas uma dificuldade material de definir a inconstitucionalidade. O problema, então, não é a falta de precedentes, mas a dificuldade de se proclamar o resultado em função das fundamentações diversas em cada voto”, disse o tributarista e constitucionalista Ives Gandra da Silva Martins à revista Consultor Jurídico. Para o advogado, é possível afirmar que a tese que saiu vitoriosa foi a da ilegalidade de se tributar o lucro antes de sua distribuição efetiva, embora não tenha sido possível fundamentar aquilo que foi definido em Plenário.

Gandra entende que os julgamentos dos dois REs poderão ser decididos com base na decisão sobre a ADI, mesmo sem a devida proclamação daquela primeira decisão.Prevaleceu a tese correta com fundamentações diferentes”, afirmou. “Nos Recursos Extraordinários é que  eles irão explicitar o entendimento. Os REs não devem ser diferentes daquilo que foi consagrado na ADI, embora o resultado não tenha sido proclamado”.

Caso incomum
Já para o advogado Alexandre Gleria, do Aidar SBZ Advogados, seria um fato incomum os ministros seguirem com o julgamento dos REs sem proclamar antes a decisão quanto à constitucionalidade da ADI. “Caso não se chegue a um consenso na ADI e se julgue diretamente os REs, na prática, equivale a deixar de lado os dez votos proferidos na ação de inconstitucionalidade e começar de novo o julgamento. O que seria extremamente sui generis”, afirmou Gleria.

Contudo, o advogado também entende que, se for para extrair um entendimento dominante, é possível concluir que ao menos estaria garantida a exclusão da incidência de tributação na data de balanço no caso de coligadas que não estiverem situadas em paraísos fiscais. Gleria também lembra o plenário cogitou discutir melhor a questão, inclusive com o convite para que seis ministros aposentados esclareçam seus votos.

O tributarista Alexandre Nishioka, também entende que seria incomum concluir o julgamento dos REs sem antes declarar o resultado do julgamento da ADI. “Existe uma relação de causa e efeito entre as ações. Seria estranho simplesmente desconsiderar a ADI. O contrário poderia acontecer, os REs restarem prejudicados, mas não a ADI”, observa.

Entre os entre os votos convergentes, há diferenças pontuais de fundamentação. O ex-ministro Ayres Britto, por exemplo, foi o único que votou pela constitucionalidade absoluta do dispositivo. “Há várias linhas, que não se encontram”, diz o advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara, do Bichara, Barata & Costa Advogados. “Malgrado a atipicidade da conduta, eu entendo que agiu bem o STF ao esperar o julgamento dos REs, pois é ali que verdadeiramente se terá a compreensão da corte sobre o tema”, disse.

“Não parece ser possível extrair dos votos já proferidos um núcleo mínimo a alicerçar a proclamação.  E, em segundo lugar, a maioria dos ministros que votaram não está mais lá. Hoje, não só os julgadores são outros como os problemas concretos decorrentes da norma impugnada também são”, avalia.

Possibilidades
Para a maioria dos juristas ouvidos pela ConJur, se o STF concluir que seis votos são suficientes para declarar, ainda que parcialmente, a inconstitucionalidade do artigo 74 da Medida Provisória, os ministros também terão de reconhecer a ilegalidade da norma dos Recursos Extraordinários. Na última quarta, o ministro Dias Toffoli apontou para a possibilidade de se reconhecer a maioria de seis votos para declarar a inconstitucionalidade da norma nos casos de empresas domiciliadas em países que não são paraísos fiscais. Entretanto, os ministros não chegaram a um consenso sobre isso.

Outro receio de advogados que esperam pelo reconhecimento da inconstitucionalidade da norma é que a Fazenda alegue a ocorrência de um empate com base no artigo 146 do Regimento Interno do STF. O artigo prevê que, em caso de empate em razão da ausência de um ministro na votação de matérias que dependem de maioria absoluta, “considerar-se-á, julgada a questão proclamando-se a solução contrária à pretendida ou à proposta”, ressalvados os casos de natureza criminal.

Os advogados também apontam para o risco de os ministros prosseguirem com a análise dos Recursos Extraordinários sem declararem a decisão da ADI. A indefinição da proclamação do resultado abriria espaço para a Fazenda entrar com embargos a fim de pleitear a permanência da constitucionalidade da lei.

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