Ideias do Milênio

"A negação da realidade é comum nos países em crise"

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28 de setembro de 2012, 8h00

Entrevista concedida pelo professor de Harvard e ex-economista-chefe do FMI Kenneth Rogoff, ao jornalista Jorge Pontual, para o programa Milênio, da Globo News. O Milênio é um programa de entrevistas, que vai ao ar pelo canal de televisão por assinatura Globo News às 23h30 de segunda-feira, com repetições às 3h30, 11h30 e 17h30. 

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A possibilidade de ganhar ou perder quantias maiores que o PIB de muitos países movimentou durante anos o mercado financeiro. A aposta era baseada na crença quase inabalável de que o livre mercado garantiria lucros para sempre. A crise de 2008, inicialmente vista como uma breve recessão, mostrou que o risco é muito maior do que se acreditava. Gradualmente os principais centros econômicos do mundo foram afetados. Na zona do euro, a dificuldade dos países de pagarem as dívidas ameaça a sobrevivência da moeda comum. Do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos enfrentam uma situação delicada. A recuperação econômica é anêmica e o desemprego continua alto. E em todo o planeta, as projeções de crescimento dos países emergentes caem a cada estimativa. O economista Kenneth Rogoff, autor do livro This Time is Different, Desta Vez é Diferente, analisou mais de oito séculos de crises e mapeou o comportamento errático da evolução da economia e descobriu que a crise atual não tem nada de diferente das anteriores. Seguiu e segue os mesmos ciclos, o que de um lado é animador, porque, como as anteriores, esta terá um fim. Mas preocupa, porque quase todos os envolvidos seguiram, e seguem, cegos o mesmo caminho que levou a tantos desastres ao longo da história.

Jorge Pontual — É interessante seu livro ter sido publicado no Brasil com o subtítulo como título principal: Oito Séculos de Delírios Financeiros. O que é “delírio financeiro”?
Kenneth Rogoff —
A arrogância e a ignorância humana por trás das crises financeiras. Durante o boom, todos dizem que tudo está maravilhoso. O governo diz que está fazendo um excelente trabalho, os investidores dizem que são gênios, o povo está muito contente, todos estão consumindo muito. E há vezes em que as coisas estão indo tão bem que você deveria desconfiar: “Espere aí. Eles deveriam ir mais devagar.” Assim, surgiu essa expressão. Claro que o título principal, Desta Vez é Diferente, é uma ironia. Não há nada diferente, mas as pessoas sempre dizem que é diferente, antes da crise ou depois.

Jorge Pontual — Explique para nós o que você e Carmen Reinhart descobriram nessas crises ao longo de oito séculos, que é comum a todas elas.
Kenneth Rogoff —
Um traço que encontramos, e que nos surpreendeu, foi a universalidade das crises. Tanta gente acreditava — e mesmo acadêmicos — que elas eram típicas da América Latina, talvez de alguns países centro-europeus. Mas analisando um período mais longo da História, todo tipo de crise atingiu os países mais avançados. A Espanha deixou de pagar a dívida com os estrangeiros 13 vezes! A França, nove vezes. Isso não é novidade. E na Grécia, nós descobrimos… Não que a Grécia seja um país desenvolvido, mas eles estão em moratória ano sim, ano não desde sua independência, em 1828. É algo universal. Outra descoberta que fizemos, especialmente ao falarmos de crises bancárias — que é o nosso caso recente —, elas nunca têm fim nos países desenvolvidos. Elas são muito parecidas, não só em termos de queda de rendimentos como de aumento do desemprego, como o que acontece com o preço dos imóveis, das ações. Nós ficamos pasmos. Há aspectos para os quais você tenta encontrar alguns paralelos, mas ao começarmos a criar os gráficos e tabelas com base nesses dados históricos, nós não podíamos acreditar. E tínhamos estudado a vida toda crise da dívida e crises financeiras. Mas não tínhamos esse conjunto de dados que compilamos. Nós levamos sete anos para escrever o livro. Muito desse tempo foi árido e maçante, mas, em alguns momentos, você vê a coisa se desdobrar. E isso é inacreditável. Estes são os dois aspectos que se destacam: a universalidade e a semelhança das crises.

Jorge Pontual — Em que momento você se deu conta de que algo parecido aconteceria antes de o livro ser publicado?
Kenneth Rogoff —
É muito difícil determinar a hora em que acontece uma crise financeira. As pessoas que dizem que sabiam quando ela aconteceria… Se analisarmos com cuidado, todos os anos em que estavam operando, eles disseram que a crise viria. Acho que podemos dizer, quando vemos os números que vimos nos EUA, que aquilo não duraria 10 anos, que explodiria. Mas pode levar 10 dias, 10 meses. Muitos investidores, e eu não sou investidor… Muitos investidores podem ter uma grande ideia, mas, se errarem em um ano, podem perder tudo. Nós tínhamos certeza de que haveria mais crises. Não estávamos preocupados com isso, mas exatamente o que aconteceu e seus desdobramentos, nós não sabíamos.

Jorge Pontual — E acabou se tornando o que você chamou de “Segunda Grande Contração”.
Kenneth Rogoff —
Tentamos dar um nome diferente de “recessão” a isso, porque, na nossa percepção, chamar de “recessão” é fazer o diagnóstico errado. É como dizer: “Você tem uma gripe séria.” “Grande Recessão” é o termo em inglês, não sei como se chama em português. Isto não é uma gripe séria, é pneumonia! Estamos falando de outra coisa. No nosso ponto de vista, usar a terminologia errada, descrever o que está acontecendo de forma errada, aponta para soluções erradas. Em uma recessão, se a queda é muito brusca, a retomada do crescimento é muito acentuada. Se a queda é pequena, a retomada é pequena. O que todos estavam dizendo, dos assessores do presidente aos maiores economistas de Wall Street era: “Foi uma recessão terrível, mas a retomada do crescimento vai ser fantástica. Vamos ficar calmos, sem nos preocupar.” O que descobrimos na nossa pesquisa é que se tratava de outra coisa. Quando o sistema bancário desmorona, como aconteceu nos EUA — o “sistema bancário paralelo” desmoronou —, quando se tem uma crise assim, a queda é muito brusca, e a recuperação é muito lenta. Nós dissemos isso e fomos vistos como pessimistas. Mas os EUA e outros países desenvolvidos trilham esse modelo bem típico em que a recuperação é muito lenta, dolorosa. Ela pode levar uma década ou mais. Estamos bem no meio desse retorno à normalidade.

Jorge Pontual — A crise na zona do euro é parte dela, não? Há pessoas que dizem que é outra coisa. O que é na verdade?
Kenneth Rogoff —
É uma manifestação diferente da mesma crise. Uma coisa que nós também percebemos é que, quando ocorrem crises bancárias globais, ou ao menos grandes crises regionais, um dos abalos secundários, das consequências tardias, geralmente alguns anos depois, é o calote dos governos. O que começa como um fenômeno do setor privado — bancos em maus lençóis — acaba por arrastar o governo. Há duas razões para isso. Uma delas é óbvia: os governos resgatam os bancos, a economia afunda, há perda tributária, a dívida está nas alturas. Essa é uma das razões. A outra razão é que, se você toma muito dinheiro emprestado e alguma coisa assusta os mercados, você está perdido, está enrascado. De certa forma, o que aconteceu na Grécia é diferente do que aconteceu no Reino Unido e do que aconteceu nos EUA. Mas era um desastre prestes a acontecer. Eles não são robustos para enfrentar turbulências. A crise do euro, em alguns aspectos, é uma crise de dívida soberana. Ela é pior porque eles têm o euro que não é resistente a esse tipo de problema.

Jorge Pontual — O que você acha que vai acontecer?
Kenneth Rogoff —
Em relação a quem: EUA, Europa ou China?

Jorge Pontual — Primeiro, Europa.
Kenneth Rogoff —
Sobre a Europa é difícil de dizer. É um pouco como tentar entender, de fora, o casamento dos outros, eles não brigam, mas não se suportam; eles brigam o tempo todo, mas parecem se amar. Nunca se sabe. Mas é um problema político. Não é estritamente financeiro. Mas a raiz é que eles nunca deveriam ter passado tão rápido a moeda única. É muito fácil dizer isso depois de dar errado, mas foi uma péssima ideia. Ou eles consertam isso e criam um sistema de governança, uma união verdadeira, que justifique a existência de uma moeda comum, ou precisam se desmembrar. Acho que não existe meio-termo. Se eles se separassem completamente, seria um desastre. Não podemos nem explicar o quanto seria ruim, especialmente se acontecer nos próximos cinco anos. Se acontecer nos próximos 50 anos, aí, eu não sei, mas, se acontecer rápido, eles não estão preparados. Ninguém está preparado para isso.

Jorge Pontual — E a China? Todos estão preocupados.
Kenneth Rogoff —
É engraçado…

Jorge Pontual — O motor está crepitando.
Kenneth Rogoff —
Eu sou visto como um cético com relação à China. Eu falo, escrevi artigos no New York Times e no Financial Times dizendo que os chineses são fantásticos, a China é a economia do futuro, mas só pode ser brincadeira achar que eles vão decolar, sem nunca se desacelerar, nunca passar por uma crise. Isso não é possível. Havia tão pouca gente dizendo isso alguns anos atrás que eu era citado oito meses depois, já que não achavam ninguém que tivesse dito a mesma coisa. Então, basicamente, você pode acreditar no que eu disse, que isso não acontece. Esse é o argumento mais poderoso. Mas é difícil dizer quando vai acontecer. E o problema com a China é que eles exageram os dados, manipulam os dados. Talvez nunca saibamos quando ela acontecer, mas está muito claro que eles estão se desacelerando. Para os mercados emergentes, seria preocupante se ela acontecesse rápido.

Jorge Pontual — Em 2009, no início desse ano, o presidente Lula esteve em Nova York, e eu o entrevistei. E ele disse: “Isso não vai nos atingir. Fizemos nosso dever de casa, estamos em terreno firme, desta vez é diferente. Nós não vamos ser atingidos. Nós vamos crescer.” No ano seguinte, o Brasil teve um crescimento recorde, e eles disseram: “Não falamos? Nós somos os melhores, nós vamos continuar crescendo.”
Kenneth Rogoff —
Em primeiro lugar, o Brasil realmente fez o dever de casa e criou macroestabilidade, mas é como se o meu filho tivesse feito o dever de casa três anos atrás. Se não fizer o dever de casa este ano, não vai acompanhar a turma. E a velocidade com que o Brasil está fazendo o dever de casa diminuiu. Eles não fizeram a reforma tributária, não fizeram a reforma da Previdência, há muitas obras de infraestrutura a serem feitas, mas há tanta corrupção nos estados e no governo que não podem ser feitas com facilidade. Há coisas que o Brasil precisa fazer para poder ir mais longe. Contanto que a China esteja se expandindo, e que vocês sejam flexíveis para exportar commodities…

Jorge Pontual — Como parceiros, certo?
Kenneth Rogoff —
Mas a economia chinesa está se desacelerando. Vocês precisam buscar outros caminhos. Com certeza, o Brasil agora está em outro nível, isso está claro. Mas, por outro lado, é preciso continuar crescendo, continuar se expandindo, e este é um momento preocupante.

Jorge Pontual — O que o Brasil poderia fazer diferente agora? Uma coisa que me preocupa… 36%, 38%… Os número mudam.
Kenneth Rogoff —
O tamanho do governo.

Jorge Pontual — A carga tributária: 36%. Quase 40%. É possível crescer… Um mercado emergente pode crescer com uma carga tributária desse porte? Ninguém no Brasil reclama disso. É estranho. “Tudo bem.”
Kenneth Rogoff —
Ouço muita gente reclamando disso.

Jorge Pontual — Nos EUA?
Kenneth Rogoff —
Não. Muitos dos meus amigos são economistas no Brasil. Todos apontam isso como a principal vulnerabilidade. Não é só o tamanho, mas a inflexibilidade do governo. Cerca de 80% dos gastos do governo são com transferências, pagamentos de funcionários públicos, coisas que não podem ser mudadas. Portanto, o Brasil não tem muita flexibilidade devido a isso. Obviamente, diminuir o Estado propiciaria o crescimento. Claro que um sistema tributário mais eficiente propiciaria o crescimento. Um dos maiores enigmas da economia internacional é entender taxas de juros tão altas durante tanto tempo. Elas estão baixando muito, mas um dos motivos para terem sido tão altas tem a ver com as pessoas ficarem ansiosas quanto à história, quanto à inflexibilidade. Obviamente, há muitas coisas que o Brasil pode fazer, mas é preciso energia nova para realizá-las. Compreendo que não é fácil em uma democracia. Não que estejamos avançando nos EUA. Estamos bem paralisados. Estou muito preocupado com o nosso futuro.

Jorge Pontual — Você estava no FMI na época da crise do real?
Kenneth Rogoff —
Eu estive no FMI de 2001 a 2003. Não peguei a crise de 1999 quando estourou.

Jorge Pontual — Mas a de 2000, 2002.
Kenneth Rogoff —
Com certeza. Foi um momento singular. Eu fui a favor da ajuda que nós prestamos, e não fui a favor de muitas ajudas. Como fui professor, sei que se você recusar todos os pedidos de promoção, ninguém lhe dará ouvidos. É preciso ser a favor de alguma coisa. Mas eu também achei que o Brasil tinha os fundamentos de um programa que fazia sentido, que era um risco razoável. E foi um sucesso. O FMI teve fracassos. Pelo menos eu julgaria o Brasil como um sucesso.

Jorge Pontual — Por que foi um sucesso?
Kenneth Rogoff —
Foi um sucesso porque ele avançou de forma sólida. Ele avançou com força tão esmagadora que acalmou os mercados. Mas, em suma, foi um sucesso porque o presidente Lula ganhou as eleições e continuou com as mesmas políticas macroeconômicas, o que foi uma grande surpresa para os mercados. Foi o momento estabilizador. Se ele tivesse seguido políticas como as dos seus vizinhos ao sul, o programa brasileiro teria explodido, com certeza. A grande mudança foi mostrar estabilidade econômica e política. E vocês ainda estão colhendo os frutos disso. Agora as pessoas pensam, quando há uma crise econômica mundial: “Vocês tiveram uma recessão normal.” Dez anos atrás… Com certeza, 15 anos atrás, diante de uma crise econômica mundial, o Brasil ainda estaria se recuperando. Mas vocês não foram muito afetados. Creio que o grande crédito se deve a essa transição e também aos tecnocratas do Brasil que criaram um programa bastante bom.

Jorge Pontual — Voltando ao Desta Vez é Diferente. Já que você e Carmen Reinhart mostraram que não é diferente, que é sempre a mesma sequência…
Kenneth Rogoff —
Há muitos modelos.

Jorge Pontual — Sim, mas, essencialmente… Por que não aceitar… Quando você fala em “delírio”, me lembra A Marcha da Insensatez, o livro de Barabara Tuchman sobre as guerras e sobre a crença das pessoas, ao longo da História, de que, aquela vez, daria certo, e era óbvio que não. O que cega as pessoas e os governos diante da realidade? Por que essa não aceitação?
Kenneth Rogoff —
Há certo aspecto da natureza humana, um otimismo, uma vontade de enfrentar desafios que é muito boa. Tivemos crises econômicas desde os primórdios da civilização. Mas a civilização prosperou. Todos os países passam por crises econômicas gigantescas, mas a maioria deles está em situação bem melhor do que há algumas centenas de anos. Nós, humanos, temos grandes qualidades, mas não há dúvida de quê, quando as coisas vão bem, temos uma tendência a achar que somos nós, que somos gênios, que o governo é bom demais. Quando há um boom alimentado por muito crédito, muitos empréstimos, você se sente muito bem, é como usar uma droga. Quando o efeito da droga passe, você desmorona. É uma tendência muito comum. As crises são muito semelhantes, independentemente do sistema jurídico, independentemente da cultura. Elas são universais. Se você olhar os traços macroeconômicos de uma crise econômica, não importa onde você está. Isso sugeriu a mim e a Reinhart que havia algo mais profundo na natureza humana — na nossa arrogância, na nossa ignorância — que atravessa sistemas políticos, sistemas jurídicos, de que todos partilhamos. Foi muito empolgante para nós descobrir como as crises eram semelhantes. É algo que você pensa… Você fica feliz em demonstrar tendências comuns, mas ao olhar os nossos gráficos e tabelas, é impressionante.

Jorge Pontual — É interessante ter escrito que você e Carmen Reinhart têm em comum um ceticismo com relação aos governos. O que você quis dizer?
Kenneth Rogoff —
Os governos sempre lhe dizem que está tudo bem quando não está. Se você for à Europa hoje… Vamos analisar a crise da Grécia. “A Grécia é um país europeu, nunca vai ter problemas.” “Vamos precisar de um pequeno empréstimo.” “Talvez eles tenham que perder um pouco de dinheiro para os credores particulares.” “Talvez nós tenhamos que expulsar a Grécia do euro.” A cada passo, eles negam a realidade. Isso é muito comum. Como profissionais, estudiosos de países que rumam em direção à crise, a negação da realidade é surpreendente. É um tema que se repete nos países em crise. Nós nos entrosamos naturalmente tendo essa ponte em comum, de ver o que um governo diz, e, geralmente, quanto melhor a previsão, mais você deve se preocupar.

Jorge Pontual — Eu me preocupo com a cobertura da mídia. Nós ouvimos os governos, reproduzimos o que eles dizem, mas como nós, jornalistas, podemos entender, com base no seu livro, a fazer a cobertura, a compreender a crise que aconteceu?
Kenneth Rogoff —
O livro causou comoção por vários motivos. Um deles foi por declararmos claramente: “Não, a recuperação não vai ser rápida. Esta crise vai durar muito tempo. Eis o motivo, eis o que aconteceu.” A princípio, fomos ridicularizados por dizer isso. O New York Times cobriu extensivamente, mas disse: “Eles são loucos de dizer que a crise vai durar 4 ou 5 anos, que o desemprego vai piorar, que vai levar 4 ou 5 anos para o crescimento voltar ao mesmo nível de antes. Nossa, isso é radical.” Mas, gradualmente, várias pessoas analisaram aquilo, e é uma área em que as novidades se espalham. Obviamente outros, num futuro distante, quando as dívidas estiverem se acumulando, e a economia estiver sendo achatada… Nosso livro dá referências. Quais são os sinais de alerta, quando você precisa se preocupar. Não é uma ciência, nada é absoluto, entretanto, há certos marcos históricos nos quais é preciso revisitar os fatos e se preocupar. Espero que as pessoas façam isso no futuro.

Jorge Pontual — Como quando a dívida ultrapassa 60% do PIB?
Kenneth Rogoff —
Quando se pega emprestado no estrangeiro mais de 60% do PIB sendo um mercado emergente, isso é problemático. E, para qualquer país, quando sua dívida pública ultrapassa 90% ou 100% do PIB, e muita gente ficou irritada por termos dito isso. Mas acho que documentamos isso. Um dos fatores mais originais da nossa compilação foi termos fornecido dados sobre dívida pública, sobre gastos do governo que remontam a muitos anos. Você nem imagina como foi difícil fazer isso. Você acha que os bancos mentem em seus balanços patrimoniais? Nem se compara ao que os governos fazem. Umas das maiores descobertas do nosso livro foram esses dados que permitem visualizar esses padrões.

Jorge Pontual — Voltando à minha pergunta. Seu conselho aos jornalistas, quando os governos dizem que está tudo bem, que desta vez é diferente, é não acreditar neles?
Kenneth Rogoff —
Vou dar uma resposta muito franca. Estando no FMI e tendo visto isso na prática… Um problema que o jornalismo tem em muitos lugares é que você depende dessa gente. Você pode escrever um artigo dizendo: “Pedro Malan não estava dizendo a verdade.” No dia seguinte, tente fazer uma entrevista com ele. Se você não tem acesso, não pode fazer a cobertura. Existe um jogo muito sutil de gato e rato entre o jornalista e o governo. Se você questionar demais ou o seu jornal questionar demais, ou a sua TV questionar demais, eles se recolhem. Acontece no mundo todo. Todos sabem disso. Você é “independente”, mas precisa que essa gente fale com você. É um desafio muito grande para o jornalismo.

Jorge Pontual — Muito obrigado.
Kenneth Rogoff —
Obrigado.
Jorge Pontual — Foi muito bom.
Kenneth Rogoff —
Foi um prazer.

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