Crime continuado

Barbosa pedirá 12 anos de prisão para Marcos Valério

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17 de setembro de 2012, 20h02

O tipo penal do crime continuado, descrito no artigo 71 do Código Penal, foi aplicado pelo ministro Joaquim Barbosa a quase todos os réus da Ação Penal 470, o processo do mensalão, condenados por lavagem de dinheiro. A ação tramita no Supremo Tribunal Federal sob relatoria de Barbosa.

À exceção de Ayanna Tenório e Geiza Dias, Joaquim Barbosa pede, no voto do item 4 do processo, que fala do “núcleo operacional do mensalão”, a majoração das penas de todos os acusados por lavagem de dinheiro. O ministro contabilizou 46 operações de lavagem de dinheiro, das quais todos participaram, cada um em uma etapa.

Com isso, ele rejeitou a tese do Ministério Público, de que as penas deveriam ser acrescidas por conta da atuação de uma “organização criminosa”. Ele explica que o fato de várias pessoas estarem relacionadas às mesmas condutas “atrai a regra do crime continuado”, e não da organização criminosa.

“Daí porque, no caso, não há como incidir, também, a causa especial de aumento da pena prevista no artigo 1º, parágrafo 4º, da Lei 9.613/1998 [antiga Lei de Lavagem], que se refere à hipótese de o crime em questão ser ‘cometido de forma habitual’.”

Como noticiou a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, a dosimetria das penas do voto de Joaquim Barbosa foi publicada sem querer, junto a seu voto, no site do Supremo Tribunal Federal. Na manhã desta segunda-feira (17/9), o capítulo da dosimetria já havia sido retirada do ar, mas o documento pôde ser acessado pela ConJur por meio do Google Cache, ferramenta que permite a visualização de páginas virtuais antes de elas serem atualizadas. Uma versão em PDF do voto, com as dosimetrias, pode ser lida aqui.

Marcos Valério
De acordo com o voto do ministro Joaquim Barbosa, Marcos Valério, proprietário da agência de publicidade SMP&B Comunicação, foi o que teve a maior pena: 12 anos e sete meses de reclusão em regime fechado, majorada por conta das 46 operações de lavagem de dinheiro. Por ser o proprietário da empresa que “emitiu os cheques que propriciaram a maioria dos repasses lavados”, foi considerado por Barbosa grande chefe da parte operacional do mensalão.

O procedimento adotado pelo relator para calcular a pena de Valério é repetido em todos os demais réus do item 4. Em todos, chama atenção que “não se pode ignorar, ainda, que os valores lavados são bastante elevados”. Ainda afirma que “a culpabilidade, entendida como o grau de reprovabilidade da conduta, apresenta-se em todas as principais etapas do processo de lavagem de dinheiro”.

Depois, passa a analisar os antecedentes. Diz que a existência de “uma ou outra ação penal” não pode ser considerada antecedente, mas no caso de Valério, “se verificam não uma, mas inúmeras ações penais contra o réu, algumas delas com sentença condenatória”. Por isso, diz que Marcos Valério “ostenta maus antecedentes”.

Ramon Hollerbach e Cristiano Paz
Como, ao lado de Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz eram os diretores da SMP&B, também devem responder pelo repasse dos cheques. A pena para os dois foi a mesma: dez anos de reclusão em regime fechado e 250 dias-multa.

Foi majorada de seis anos e seis meses por conta das 46 operações de lavagem. “Não se pode ignorar, ainda, que os valores lavados são bastante elevados”, anota.

Barbosa afirma que há “ao menos” quatro ações penais contra Hollerbach, uma delas com condenação. Contra Paz, há cinco ações, duas com sentença condenatória. Portanto, “ostentam maus antecedentes”.

Rogério Lanza Tolentino
Joaquim Barbosa afirma que Rogério Tolentino, advogado de Marcos Valério, “atuou intensamente, por exemplo, na atuação de empréstimo junto ao banco BMG”. E, claro, “não se pode ignorar, ainda, que os valores lavados são bastante elevados”.

A pena determinada é de dez anos de reclusão em regime fechado, mais 250 dias-multa. Foi majorada de seis anos de reclusão, por conta das 46 operações de lavagem em continuidade delitiva.

Como há três ações penais em curso contra Tolentino, uma com sentença condenatória, Barbosa conclui que o advogado “ostenta maus antecedentes”.

Simone Reis Lobo de Vasconcelos
Simone Vasconcelos é ex-diretora administrativa e financeira da SMP&B. Para o ministro Joaquim Barbosa, ela “executava materialmente as operações de lavagem de dinheiro realizadas pelo denominado ‘núcleo publicitário ou operacional’”.

A pena foi fixada em cinco anos e seis meses de reclusão e depois atenuada para quatro anos e sete meses, já que ela atuava por ordem de Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach. Entretanto, a punição foi majorada para sete anos e sete meses por causa da “continuidade delitiva”. Não há registros de antecedentes de Simone.

Geiza Dias dos Santos
A pena sugerida para Geiza Dias, ex-gerente financeira da SMP&B foi de seis anos e 11 meses de reclusão em regime aberto e 138 dias-multa. “Embora Geiza tenha tido uma participação menor do que Simone na consecução do delito, ela tinha a função de, por exemplo, informar ao Banco Rural quem eram os verdadeiros beneficiários dos repasses dos valores lavados, cujos nomes, apesar de conhecidos, eram ocultados pela instituição financeira”, escreveu o relator.

Não foram encontrados antecedentes de Geiza. Quando o caso foi levado a plenário, Geiza foi absolvida por sete votos a três. Além de Barbosa, os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux votaram pela condenação. Os demais ministros entenderam que a inclusão de Geiza no banco dos réus foi um “erro de tipo” do Ministério Público.

Kátia Rabello e José Roberto Salgado
Para os executivos do Banco Rural, Barbosa imputou a pena de dez anos de reclusão em regime fechado. Como principais dirigentes do banco, afirma o relator, “atuaram intensamente, por exemplo, na simulação de empréstimos junto àquela instituição financeira”. “Não se pode ignorar, ainda, que os valores lavados são bastante elevados”, acrescentou.

Barbosa investigou que há ao menos sete ações penais contra Kátia Rabello em trâmite na Justiça Federal de Belo Horizonte. Contra Salgado, aponta o ministro, há ao menos 23 ações penais, também na Justiça Federal de BH.

Vinícius Samarane
Samarane era vice-presidente do Banco Rural. Como integrante da “cúpula do Banco Rural”, entendeu Joaquim Barbosa, trabalhava ao lado de Kátia Rabello e de José Roberto Salgado na omissão dos empréstimos.

A pena também é de dez anos de reclusão no regime fechado. Entretanto, Barbosa fala menos da participação de Vinícius Samarante. Não menciona antecedentes.

Ayanna Tenório Torres de Jesus
Ayanna mereceu pouca atenção de Joaquim Barbosa. Ele conta que ela responde por três repasses de dinheiro. Um, no dia 16 de abril de 2004, de R$ 50 mil, feito por meio do Banco Rural a Luiz Carlos Masano. Outro, de R$ 255 mil, também pelo banco, a Benoni de Nascimento Moura, no dia 10 de setembro de 2004. O último repasse foi de R$ 102,8 mil, também por meio do Rural, a Paulo Leite. Ela já foi absolvida no julgamento por unanimidade.

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