Falta de discernimento

Justiça autoriza esterilização temporária de menor

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26 de outubro de 2012, 11h50

O Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas, em Porto Alegre, fez um implante hormonal contraceptivo reversível numa adolescente moradora de rua que teve seu bebê recentemente. A cirurgia de esterilização foi pedida pelo Ministério Público estadual e autorizada pela juíza de Direito Rosaura Marques Borba, titular da 2ª Vara da Infância e Juventude da Capital. O método tem uma vida útil de três anos. O processo corre em segredo de Justiça.

O promotor Júlio Almeida, que ajuizou a ação, disse que o implante hormonal contraceptivo é o meio mais adequado para dar cumprimento ao comando constitucional de proteção às crianças e adolescentes previsto no artigo 227 da Constituição Federal. Com isso, não se permitirá que crianças sejam geradas por quem não reúne condições de ser mãe.

No caso concreto, a adolescente não tem família, é completamente analfabeta, usuária de drogas, portadora do vírus HIV, padece de retardo mental moderado e já gerou seu segundo filho em pouco mais de um ano. O primeiro filho foi encaminhado para adoção, e o que deu recentemente à luz está internado em estado grave em decorrência da má formação fetal causada pelo efeito do crack durante a gestação.

‘‘Evidente que, devido ao seu distúrbio mental, a adolescente não possui o necessário discernimento para gerir os atos de sua vida, encontrando sérias dificuldades em construir e/ou manter laços afetivos ou mesmo de entender o significado das responsabilidades intrínsecas de ter, cuidar, criar e educar um filho’’, justificou o agente do MP na inicial.

No seu entendimento, outra gravidez não planejada, sem qualquer exame pré-natal e sem a interrupção do uso de drogas, acabaria por ocasionar um enorme risco para a menina e para o futuro bebê — que muito possivelmente seria infectado pelo vírus HIV e nasceria com vários problemas de saúde.

A laqueadura tubária, utilizada nestes casos, foi descartada em respeito aos direitos reprodutivos da jovem, na perspectiva de que venha a apresentar condições plenas para o exercício da maternidade. Conforme o promotor, por ser de caráter temporário, o método contraceptivo aplicado compulsoriamente poderá ser suspenso em caso de eventual melhora do quadro de drogadição e do estado mental da adolescente.

Precedente na Justiça gaúcha
O caso de Porto Alegre não é único. Em março deste ano, num processo originário da Comarca de Giruá, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça reformou sentença para autorizar a laqueadura tubária numa jovem com deficiência mental, que dera à luz há três meses. Naquela situação, o pedido foi feito pelos familiares da menor e indeferido pela Justiça da Comarca, com o apoio do MP.

O laudo médico apontou indicação expressa da laqueadura como única alternativa para o caso, pois a autora não consegue utilizar contraceptivos orais ou injetáveis. Além disso, o Dispositivo Intra Uterino (DIU) foi tido como contraindicado, pela situação de promiscuidade em que vive a jovem.

Na decisão do TJ-RS, o relator da apelação, Luiz Felipe Brasil Santos, justificou que, caso não autorizada a laqueadura, muito em breve o Judiciário poderá estar julgando processos de destituição de poder familiar dos filhos da adolescente — notoriamente incapaz de exercer a maternidade responsável.

O desembargador também considerou que o contexto familiar em que a adolescente se encontra inserida tem um longo histórico de acompanhamento pelo Conselho Tutelar, em razão da vulnerabilidade social.

‘‘Não pode o Judiciário permitir que esta jovem, doente mental, inserida num contexto familiar completamente comprometido e vulnerável, esteja sujeita a repetidas gestações, trazendo ao mundo crianças fadadas ao abandono, sem falar nos riscos à própria saúde da gestante que, por todas as suas limitações, sequer adere ao pré-natal’’, afirmou na ocasião.

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