Batalha constante

Maior desafio da OAB é a preservação das prerrogativas

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18 de outubro de 2012, 16h50

Enquanto se aproxima o final de meu segundo mandato como presidente da OAB-RJ, chego à conclusão de que a luta contra a violação das prerrogativas dos advogados é o maior desafio que se impõe ao dirigente da classe.

As vitórias obtidas em matéria de prerrogativas, por isso mesmo, são as mais gratificantes. Como exemplos, posso citar o fim da submissão dos advogados aos detectores de metais e revista pessoal no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro; a garantia de acesso aos autos no processo eletrônico aos advogados sem procuração (o que vinha sendo negado pelo TF-2 e TJ-RJ); a anulação de diligências de busca e apreensão em escritórios de advocacia sem o acompanhamento da OAB-RJ; a garantia de uso das salas da OAB-RJ nos fóruns sem as pesadas restrições que vinham sendo impostas; bem como inúmeras outras intervenções pontuais bem sucedidas obtidas pela nossa Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas.

Se, por um lado, tais conquistas sejam aquelas de que provavelmente mais me orgulho, por outro, a preocupação com novas violações é constante. É que há sempre autoridades, por dolo ou ignorância acerca da função do advogado face à Justiça e de seu próprio papel, dispostas a cometer tais violações, não raro por meio de violência, verbal ou até mesmo física, a que corresponde a inaceitável humilhação do advogado em seu exercício profissional.

As formas de violação são as mais variadas, indo desde as mais cotidianas, tais como vedação de acesso aos autos e negativa de magistrados de receberem os advogados em seus gabinetes, até outras mais sutis, porém não menos arbitrárias e ilegais.

Ressalte-se que o Estatuto da Advocacia muitas vezes é tratado como se fosse um mero documento administrativo, tal como um regimento interno da OAB (não custa lembrar que é lei federal). Além disso, há prerrogativas do advogado espalhadas pela legislação ordinária. Talvez pela dispersão, a ilegalidade tenha maiores chances de passar despercebida.

Por exemplo, apesar da redação inequívoca do artigo 14, parágrafo único, do CPC, há decisões aplicando multa por litigância de má-fé diretamente ao advogado, o que, mais uma vez, significa desconhecimento ou desprezo pela sua função no processo.

Outro caso recorrente é o de juízes que não permitem a participação de advogados em audiência se não estiverem vestindo paletó e gravata, mesmo quando autorizados pela OAB (art. 58, XI, da Lei 8.906/94), atitude que, além de ilegal, é patentemente atávica.

Recentemente, o jornal Valor Econômico noticiou caso em que um advogado foi impedido de gravar uma audiência de que participava com um tablet. A notícia menciona, ainda, um precedente do Conselho Nacional de Justiça que socorreria o advogado nessa hipótese, inclusive assentando que o advogado pode se utilizar de fonte de energia elétrica das instalações do tribunal (por incrível que pareça, esse havia sido o fundamento utilizado pelo juiz para impedir a utilização do aparalho pelo advogado em audiência).

Em uma comarca do interior do Rio de Janeiro, Barra Mansa, ocorreu, há poucos dias, caso bem mais escandaloso. Uma advogada, devidamente habilitada em um processo que versava sobre Direito de Família, pretendeu filmar uma audiência. A juíza não apenas a impediu, como ainda convocou um truculento policial militar e determinou que apreendesse o aparelho e conduzisse bruscamente a advogada para fora da sala de audiências.

Além da humilhação e da subtração arbitrária de bem móvel, a atitude da magistrada violou prerrogativa expressa contida no artigo 417 do CPC:
“Art. 417. O depoimento, datilografado ou registrado por taquigrafia, estenotipia ou outro método idôneo de documentação, será assinado pelo juiz, pelo depoente e pelos procuradores, facultando-se às partes a sua gravação.”

Tal dispositivo foi inserido no Código de Processo Civil por ocasião das reformas processuais de 1994, as quais buscaram modernizar o processo civil brasileiro, inclusive pela previsão ampla da antecipação de tutela. A utilização da cláusula aberta “gravação” deixa claro que o legislador, incapaz de prever os avanços tecnológicos, não pretendeu restringir as formas de captação das imagens e sons de uma audiência. Não há, tampouco, qualquer restrição com relação a processos que tramitem em segredo de Justiça, desde que a gravação seja realizada pelas partes ou advogados devidamente constituídos, como é o caso.

Mais recentemente, aliás, foram incluídos parágrafos no mesmo artigo, determinando que, em se tratando de processo eletrônico, deve-se privilegiar o registro da audiência em meio digital em detrimento da tradicional redução a termo.

Esse episódio de ilegalidade e violência contra uma profissional que estava apenas exercendo sua função demonstra o despreparo e a ignorância de alguns magistrados com relação à lei, ao papel do advogado, bem como ao seu próprio papel como representante do Poder Judiciário em um Estado Democrático de Direito.

Em nossa luta cotidiana pelo respeito às prerrogativas da advocacia, esse caso será tratado como paradigmático. Exigiremos dos órgãos correicionais que tomem enérgicas providências em desfavor da magistrada que protagonizou mais esse episódio lamentável da história do Poder Judiciário Fluminense.

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