Produtos com defeito

Recall é questão de segurança, mais do que de consumo

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27 de novembro de 2012, 7h00

Instituído em 1990 como parte do Código de Defesa do Consumidor, o recall vem se tornando uma prática presente nas relações de consumo. Segundo estudo realizado pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça, o volume de recalls feito no Brasil, em 2011, mais que dobrou em comparação a 2003, chegando a 75 ocorrências. O número, apesar de crescente, ainda está distante dos obtidos em outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, onde o recall existe desde a década de 1960, somente no último mês de dezembro foram feitas 60 campanhas.

A indústria automotiva sempre esteve no topo da lista brasileira de recall. No ano passado foi responsável por 55 chamamentos, incluindo veículos e motocicletas. De acordo com levantamento feito pelo site estradas.com.br, de 2000 até abril deste ano, mais de 8 milhões de veículos foram convocados para reparos. De janeiro até agora, BMW, Honda, Nissan, Volvo, Porsche, Kawasaki, Chery, Maserati, Volkswagen e Renault anunciaram recall.

Os custos de uma campanha de recall podem somar milhões de dólares entre despesas com peças, mão de obra e divulgação. Todos eles são pagos pelas montadoras, que podem fazer uso do direito regressivo para cobrarem do fornecedor da peça os valores despendidos.

A legislação brasileira determina que o recall seja gratuito para o consumidor, efetivo e amplamente divulgado em rádio, jornal e TV, de maneira que alcance todos os públicos expostos aos riscos. Na indústria automotiva, no caso de marcas e modelos globais, o fabricante do veículo tem a obrigação de comunicar ao Ministério Público a existência de recall no exterior, mesmo que o procedimento não venha a ser feito no Brasil.

O governo e o Poder Legislativo têm apresentado medidas para tornar a prática de recall ainda mais rígida e eficaz. Em janeiro desse ano, oito projetos sobre o tema tramitavam na Câmara dos Deputados. Em abril, o Ministério da Justiça determinou que as campanhas de mídia tragam a foto do produto que deve passar por reparo e que as mensagens sejam claras em relação ao defeito e suas implicações. Além disso, lançou um sistema informatizado que enviará, para os consumidores que desejarem, um e-mail sobre novos processos de chamamento. O site do DPDC, desde o dia 16 do mesmo mês, publica a existência de novos recalls.

As ações não visam somente o fabricante. Uma portaria conjunta do Ministério da Justiça e do Denatran, em vigor desde 2011, estabelece responsabilidade ao proprietário do veículo pela realização do recall. As campanhas não atendidas no prazo de um ano constarão no Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo.

Indenizações e multas
Quando um acidente é causado por defeito de peça, as montadoras podem ser condenadas a pagar indenizações milionárias. A família do cantor e compositor Chico Science, morto em um acidente de carro em 1997, fechou acordo com a Fiat e recebeu ressarcimento por danos morais e materiais. Em reportagem da Agência Folha, de fevereiro de 2007, o advogado da família, Antônio Campos, afirma que “foi a maior indenização paga a pessoa física pela indústria automobilística do país”. O valor não foi revelado, mas as partes informaram que ficou abaixo de R$ 10 milhões.

Um dos casos mais polêmicos da história envolve a japonesa Toyota. A demora em reconhecer o problema — o tapete dos carros travava o acelerador, impedindo que o motorista freasse — rendeu à empresa uma multa de cerca de R$ 27 milhões. Além disso, a companhia fez um acordo fora dos tribunais e pagou US$ 10 milhões aos parentes de uma das vítimas, um policial que morreu com sua família na Califórnia, em 2009, em um acidente provocado pela aceleração descontrolada de seu veículo.

As causas que envolvem responsabilidade civil em acidentes de automóveis são complexas. As montadoras devem se preparar para garantir elementos suficientes para pleitear o ressarcimento da indenização paga ao consumidor em futura ação de regresso, contra o fabricante da peça. Um dos meios é promover a produção antecipada de prova técnica pericial, via ação cautelar, quando o veículo for submetido ao reparo.

Origem do recall
Segundo o Código de Defesa do Consumidor, recall é o procedimento pelo qual o fornecedor informa ao público consumidor os defeitos detectados nos produtos ou serviços — após terem sido colocados no mercado de consumo. Seu objetivo é proteger e preservar a vida, a saúde, a integridade e a segurança do consumidor, bem como evitar ou minimizar quaisquer espécies de prejuízos, quer de ordem material ou moral.

A prática do recall teve início nos Estados Unidos, nos anos de 1960, depois que o advogado Ralph Nader descobriu e denunciou defeitos em um modelo de automóvel. No Brasil, o recall se tornou lei em 1990 com o lançamento do Código de Defesa do Consumidor.

Segundo levantamento feito pela revista Veja, em 2010, o primeiro recall registrado pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor aconteceu em 1998 e foi feito pela Mercedes Benz. Entretanto, ainda de acordo com a revista, “a Ford confirma que em 1970 chamou 50 mil compradores do modelo Corcel 1969 para consertar uma possível instabilidade no veículo”.

Dificuldades do recall
Apesar da obrigação de grande disseminação do recall, para que alcance toda a população, 60% dos consumidores que são afetados pelo defeito não fazem os reparos necessários para sua própria segurança e, também, das outras pessoas.

Nos últimos 10 anos, seis milhões de automóveis foram chamados para recall. De janeiro até dezembro de 2012, 28 recalls foram feitos, mas mesmo assim, quatro entre 10 consumidores não aparecem para a reparação ou troca de seus produtos, segundo o Ministério da Justiça. Cerca de 81% dos brasileiros não atenderam ao recall de seus automóveis em 2011, aumentando o risco de acidentes nas ruas, pois o número de veículos sem condições de segurança também aumentou.

Também, uma grande porcentagem das pessoas que não comparecem ao recall, são aqueles consumidores que compraram seus automóveis de segundos ou terceiros. Para a proteção do consumidor, o Denatran obriga as montadoras a mandar um relatório de atendimento do recall a eles. Assim, se algum veículo não atendeu ao recall, essa informação é gravada no Renavam e deve constar no licenciamento do carro.

O consumidor deve sempre ficar atento às chamadas de recall, para sua própria segurança. A negligência no reparo ou troca do produto comprometido pode causar problemas no licenciamento do veículo. Recall não é questão de consumo, mas de segurança!

Fontes
Cardoso, Helio. Recall, por que no Brasil é diferente?. Blog Novidades Automotivas – novidadesautomotivas.blogspot.com. Data de acesso: 18 de abril de 2012.

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Jorge, Fabio Martins Di e Castro, Rodrigo Giordano de. Licenciamento poderá exigir cumprimento de recall. Revista Consultor Jurídico, 13 de janeiro de 2012. Site www.conjur.com.br. Data de acesso: 3 de maio de 2012.

Recall tem novas regras a partir desta semana. Site do Denatran –www.denatran.gov.br. 17 de março de 2011. Data de Acesso: 2 de maio de 2012.

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Número de recalls no Brasil dobra em 8 anos. Folha Online. Data: 29 de dezembro de 2011. Data de acesso: 18 de abril de 2012.

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Rizzotto, Rodolfo Alberto. Recall – 4 milhões de carros com defeito de fabricação.
Martin, Erica.
Projeto de lei prevê punição ao motorista que não atender recall. Diário do Grande ABC. Data: 5 de janeiro de 2012.

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Ministério da Justiça implanta sistema eletrônico de alertas de recall. Site informationweek.itweb.com.br. Data: 15 de março de 2012. Data de acesso: 2 de maio de 2012.

Lana, Carlos Roberto. Prática começou nos EUA com a indústria automobilística. UOL Educação – site educacao.uol.com.br. Data de acesso: 18 de abril de 2012.

Correia, Davi. Os recalls que marcaram a história da indústria automotiva. Revista Veja. Data: 30 de outubro de 2010. Site veja.abril.com.br. Data de acesso: 18 de abril de 2012.

http://www.cnt.org.br/Paginas/Agencia_Noticia.aspx?n=8529 acessado no dia 18/11/2012

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