O novo ministro

É atribuição do juiz tomar decisões impopulares

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27 de novembro de 2012, 11h34

“Quem tem que aferir a vontade do povo são os integrantes de poderes do Estado que são eleitos com essa missão. O dever do juiz é aplicar as leis, as regras legítimas”. A afirmação é do ministro Teori Zavascki, que na próxima quinta-feira (29/11) deixa sua cadeira no Superior Tribunal de Justiça para ocupar o cargo de juiz do Supremo Tribunal Federal.

Em entrevista coletiva concedida na manhã desta terça-feira (27/11) na sede do STJ, em Brasília, o ministro afirmou que entre as atribuições do juiz está a de, às vezes, tomar decisões impopulares. “O papel do juiz é fazer juízo sobre a legitimidade dos atos em face de normas. Ele tem de levar em conta as regras estabelecidas, até porque é muito complicado imaginar que um juiz possa avaliar, em um julgamento, o que seja a opinião do povo”, afirmou Zavascki.

O ministro disse que se os juízes observassem estritamente a vontade popular, em determinadas circunstâncias não teriam condições de aplicar muitas leis em matéria penal, por exemplo: “Eu diria até que se fosse levar em conta a vontade popular, nós teríamos implantada no Brasil a pena de morte há muito tempo”. Zavascki ressaltou que o juiz não deve tomar sempre decisões impopulares: “Mas, às vezes, para aplicar a lei não se escapa da impopularidade. Por isso é que a Constituição assegura aos juízes a prerrogativa de serem vitalícios e inamovíveis”.

Para Teori Zavascki, as relações entre o Judiciário e a sociedade hoje são de uma visibilidade que, algumas vezes, vão além da publicidade. De acordo com o novo ministro do Supremo, há pontos positivos e negativos nas transmissões ao vivo das sessões plenárias do STF. Um ponto negativo, para ele, é justamente o excesso de exposição que, “às vezes, não colabora com o julgamento tranquilo sereno”. Ele frisou que não é contra a publicidade dos atos, mas “entre publicidade e transmissão ao vivo, acho que existe um meio caminho”.

O novo ministro ainda comentou o papel do Supremo no arranjo institucional e disse que o sistema caminha para que as decisões do STF tenham eficácia universal para casos iguais. Teori Zavascki evitou comentar sobre a Ação Penal 470, o processo do mensalão. Se limitou a dizer que não votará na fase final da dosimetria e comentou, em tese, a questão da perda de mandato de parlamentares condenados. Ele afirmou que defendeu, na década de 1990, em um trabalho doutrinário, que a condenação penal suspende os direitos políticos, “mas em relação a parlamentares não suspende necessariamente o mandato”.

De qualquer forma, o ministro disse que não podia “fazer juízo sobre o caso que está em julgamento” e que a posição do doutrinador pode ser diferente da do juiz. “A decisão judicial se produz em contraditório, com a participação de ao menos duas partes”. Teori Zavascki ainda brincou com o fato de ser considerado muito reservado. “Dizem que sou muito reservado. Talvez seja um cacoete de juiz. Eu não me acho nada reservado, mas o juiz aprende que é muito importante na formação das decisões de um juiz, ouvir mais do que falar”.

Zavascki ainda não esteve no Supremo, mas de acordo com sua assessoria assumirá o gabinete com um volume considerável de processo, que varia entre cinco e seis mil casos. De acordo com o ministro, o volume se assemelha ao que ele deixará para o seu sucessor no STJ.

Confira a opinião do novo ministro sobre outros temas:

Prerrogativa de foro
Do ponto de vista constitucional e doutrinário é uma questão polêmica, e os prós e os contras são muito circunstanciais. A prerrogativa de foro existe desde a Constituição do Império e sua ideia e garantir um julgamento que seja justo e imparcial. Mas talvez se devesse pensar em reduzir um pouco a quantidade de autoridades com prerrogativa de foro. Em muitos casos, a prerrogativa de foro não é nenhum privilégio. As pessoas que são julgadas originariamente por um juiz de primeiro grau, acabam tendo acesso ao Supremo Tribunal Federal. Em tese, do ponto de vista de demora do julgamento, o caminho a ser percorrido no caso de julgamento originariamente em primeira instância é muito mais longo do que aqueles que são julgados originariamente por um tribunal. Temos visto muita gente querendo não ter a prerrogativa de foro, não ter esse privilégio. O fato de pessoas não quererem ter esse privilégio indica algo. A Constituição é sábia na maioria dos casos em estabelecer prerrogativas, foros por prerrogativa de função.

Indenização para vítimas de lentidão judicial no Brasil
Em tese, é possível haver indenização. Há vários exemplos na Europa. Se há uma lentidão injustificada e ilegítima, em tese, não se pode descartar a hipótese de indenização. Aliás, a hipótese de indenização dessa natureza se assemelha à hipótese de indenização por erro judiciário. Não é novidade no nosso sistema. Nossa legislação penal prevê que se alguém é condenado injustamente, depois obtém uma revisão e é inocentado, o tribunal que o inocentou pode desde logo fixar uma indenização.

PEC da Bengala
É uma questão de política legislativa. Deve ser vista em um conjunto, não só em relação aos tribunais superiores. Seria casuístico e sem sentido aprovar uma emenda que fosse favorecer e contemplar apenas ministros de tribunais superiores. Isso tem de ser visto no conjunto. Talvez devêssemos pensar a conveniência para o Estado de pagar aposentadorias a pessoas, a servidores não só do Judiciário, mas a servidores de modo geral, quando completam 70 anos. Mas é uma questão de política legislativa que interessa principalmente do ponto de vista fiscal e previdenciária.

Judicialização da política e ativismo judicial
A diferença entre a atividade do juiz e a do legislador é que o juiz atua sobre os casos concretos. O legislador atua para situações futuras. O legislador, quando faz lei, ele imagina o que vai acontecer no futuro, em regra atua por intuição. E há coisas perfeitamente previsíveis, que o legislador tem tempo pra prever, mas tem coisas imprevisíveis, que o legislador não tem tempo pra prever. Quando um problema novo vem para o juiz e a respeito dele não há uma prévia atuação legislativa, o juiz não pode se eximir de julgar. Nós temos um artigo expresso no Código de Processo civil que diz que o juiz não pode se eximir de julgar alegando falta de lei ou obscuridade da lei. E o sistema dá orientação para o juiz, como ele deve trabalhar nesse caso. Ele vai atuar com analogia, com os princípios e com os costumes. A única coisa que ele não pode fazer é deixar de fazer a regra, a norma para o caso concreto. Esse é um componente que faz parte da atuação do juiz: eventualmente produzir uma norma para o caso concreto. Se essa norma tem efeitos pra outros casos semelhantes, é até salutar que tenha, principalmente quando emanada do Supremo.

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