Margem de lucro

Redução do spread bancário também depende do governo

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21 de novembro de 2012, 14h01

Têm sido comuns as declarações da presidente Dilma Rousseff e de outros membros do governo no sentido de que o spread bancário brasileiro é injustificadamente alto e prejudica a expansão do crédito no país. De fato, o spread dos bancos que operam no Brasil é um dos mais altos do mundo e não se discute que isso denota desvios que devem ser corrigidos. Igualmente unânime, com a provável exceção dos banqueiros, é a opinião de que esse spread deve ser diminuído. Antes de qualquer conclusão definitiva sobre o assunto, no entanto, é necessário entender o que é o spread bancário e o que ele nos diz sobre a atividade bancária no Brasil.

É comum a definição do termo spread bancário como o lucro dos bancos pela sua atividade, o que não é inteiramente verdade. Também é corriqueiro nos depararmos com o enunciado de que o spread bancário é calculado através da diferença entre o que bancos ganham e o que os bancos pagam pelo dinheiro captado no mercado. Esse enunciado, embora verdadeiro, não é de fácil entendimento e pode induzir a erro.

Genericamente, o termo inglês spread pode ser traduzido como “margem” e designa a diferença entre o preço de venda e o preço de compra de um título, de uma ação ou de uma transação monetária. O spread bancário, assim, é a diferença entre a taxa de juros cobrada pelo banco aos seus tomadores de crédito e a taxa de juros paga pelo banco aos seus depositantes. Obviamente, a primeira, a taxa de empréstimo, é superior à segunda, a taxa de captação, de modo que o spread apresenta-se sempre como um valor positivo, representando uma receita do banco.

Ocorre que nem todo o spread bancário é, de fato, lucro da atividade do banco. Ao contrário, o spread é tradicionalmente decomposto em cinco fatores diversos, que traduzem cinco possíveis destinações dos recursos obtidos com a diferença entre as taxas de juros praticadas. Parte do spread é utilizada para custear despesas administrativas do banco, como salários de funcionários, manutenção de agências e caixas eletrônicos, publicidade, etc.; outra parte dessa margem é usada pelo banco para provisionar empréstimos não pagos; uma terceira parte é usada para os depósitos compulsórios exigidos pelo Banco Central, subsídios a créditos e pagamentos ao Fundo Garantidor de Créditos; uma quarta parcela do spread presta-se ao pagamento de impostos; e somente o último fator, o resíduo, pode ser considerado como lucro efetivo dos bancos.

Tem-se, portanto, que um spread bancário alto não necessariamente significa um lucro alto dos bancos, uma vez que, das cinco possíveis destinações do spread, apenas uma pode ser considerada como margem líquida das instituições financeiras. Isso, contudo, não quer dizer que os lucros dos bancos que operam no Brasil não sejam realmente injustificadamente altos. A decomposição do spread bancário no Brasil de 2000 a 2010 demonstra que a parcela dirigida ao pagamento de impostos tem se mantido relativamente constante, enquanto a parcela relativa ao custo administrativo dos bancos vem sofrendo sensível redução. Cresceram nesses dez anos, entretanto, as parcelas relativas ao depósito compulsório e ao provisionamento da inadimplência, muito em virtude das crises de 2008 e 2009, bem como, e aqui sim cabe a crítica do governo, a margem líquida dos bancos. A comparação do spread bancário brasileiro e do lucro da atividade bancária no Brasil com outros países confirma que o Brasil pode ser considerado o paraíso de qualquer banqueiro.

É certo que, historicamente, o governo tem tomado inúmeras medidas com intuito de reduzir os diversos impactos sobre o spread bancário, mas o fato é que nenhuma dessas medidas alcançou com êxito o objetivo final de fazer com que os bancos reduzissem a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras ao tomador de crédito. As reiteradas reduções da taxa Selic promovidas pelo Banco Central também não têm tido o resultado esperado nesse particular. Isso significa que o suposto relaxamento das pressões sobre o spread provavelmente vem se transformando em lucros maiores dos bancos.

As justificativas para essa manutenção das taxas de juros ao consumidor, e consequentemente para a não redução do spread, são as mais diversas e vão desde a alegação de falhas na legislação, que protegeria excessivamente o inadimplente, até expressões de significado vago como “incertezas no ambiente macroeconômico”. Os críticos já identificam na não redução do spread um sintoma típico de um mercado bancário concentrado e oligopolizado que, naturalmente, favoreceria a fixação artificial de lucros altos para as instituições financeiras.

Seja qual for a explicação adotada por cada um para explicar o alto spread bancário, o fato é que não se pode negar que bancos, como qualquer empresa, visam à maximização dos seus lucros e se de fato eles estão transformando relaxamentos na pressão sobre o spread em lucros maiores é porque há espaço para isso no mercado. Tanto isso é verdade que, quando o governo forçou a diminuição dos juros praticados pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal, esse movimento foi quase imediatamente seguido pelos bancos privados, receosos da perda de mercado entre os consumidores, que dariam preferência aos bancos com taxas de juros mais baixas.

A lição para o governo, que parece estar começando a ser aprendida, é clara. Não basta apostar na diminuição das pressões sobre o spread, como melhor gestão e redução dos gastos administrativos dos bancos, leis mais duras contra a inadimplência ou redução de impostos ou do depósito compulsório. Os bancos só diminuirão seus lucros quando, além da diminuição da pressão sobre o spread, não encontrarem espaço no mercado para traduzir esse relaxamento em margens líquidas maiores.

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