Embargos Culturais

O americano Robert Dahl e o conceito de poliarquia

Autor

  • Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

    é livre-docente em Teoria Geral do Estado pela Faculdade de Direito da USP doutor e mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC-SP professor e pesquisador visitante na Universidade da California (Berkeley) e no Instituto Max-Planck de História do Direito Europeu (Frankfurt).

18 de novembro de 2012, 7h16

Robert Dahl é um importantíssimo cientista político norte-americano, que nasceu em 1916, e que pontificou na Universidade de Yale. A democracia é o tema central de suas preocupações, intervenções e opiniões. Concentrado nos aspectos mais empíricos da democracia, isto é, na dimensão real da ideia democrática, Dahl argumentou que as democracias contemporâneas são caracterizadas menos por uma imediata participação popular, e mais pelo controle que grupos exercem sobre líderes políticos e centros de decisão. A essa pulverização de influências Dahl denominou de poliarquia. 

Para Robert Dahl, nas poliarquias há eleições livres, que ocorrem regularmente. A competição eleitoral é regulada. Verifica-se amplo controle sobre o processo de escolha de representantes. O direito ao voto é universal. Não há limites de gênero ou de expressão censitária. Na percepção de Dahl, na poliarquia o direito de concorrer a cargos públicos é universal. 

Ainda, nas poliarquias, ao longo do processo eleitoral tem-se o direito de livre expressão, quanto a questões relevantes para a sociedade. Não há tabus ou proibições; tudo pode ser debatido. Nesse contexto, há também possibilidade para que o eleitor busque fontes alternativas de informação. Registra-se a importância, no mundo contemporâneo, do uso de meios cibernéticos de informação. 

A rede mundial de computadores pode se revelar grande aliada de iniciativas democráticas, situação já anunciada por Manuel Castells, teórico catalão que às vezes nos parece o Max Weber de nossos dias. A romântica imagem das democracias diretas, que supostamente floresceram no mundo ático do século IV A.C., pode se realizar no mundo contemporâneo, mediante simples toque em aparelhos celulares de uso cada vez mais difundido e acessível. Nas poliarquias há também o direito de livre associação.

A poliarquia nos remete a um modelo imaginário de democracia procedimental. A inclusão de todo cidadão se desdobra na igualdade do voto, na possibilidade de uma efetiva participação em fóruns de decisão, por intermédio, inclusive, da compreensão do andamento do processo eleitoral e das fórmulas de escolha. Do ponto de vista procedimental o modelo democrático se desdobra com pequenas nuances de imprestabilidade.

Porém, e aqui o núcleo do conceito de poliarquia, grupos de interesse participam organizadamente da competição eleitoral e alcançam os vários nichos do poder. Algo parecido com a teoria da captura (que em direito administrativo nos dá conta de situações nas quais os regulados tomariam conta das agências reguladoras) ocorreria de um modo mais amplo: o governado tomaria o governo. 

Tudo muito natural, isto é, se lêssemos o mundo e as coisas da vida de um modo ingênuo: seríamos todos autores de broquéis e siderações, poetas simbolistas perdidos num contexto real, parnasianos obcecados com vasos gregos e com métricas perfeitas. A realidade é outra. No pano de fundo da discussão, a revelação que poderíamos ter uma desigualdade econômica que pautaria uma absoluta desigualdade política. No combate a essa ameaça é que mecanismos de controle de governo e de burocratas devem ser formulados e de fato realizados. É essa, creio eu, uma das mensagens de Robert Dahl.

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