Ato acabado

TCU não pode analisar anistias previamente

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15 de novembro de 2012, 8h07

O Tribunal de Contas da União não pode apreciar, para fins de registro, a concessão de indenizações a anistiados políticos. A corte reverteu, na última quinta-feira (8/11), decisão de 2010, segundo a qual as reparações econômicas dadas a vítimas de perseguição do Estado brasileiro entre 1946 e 1988 se equiparam a pagamentos previdenciários. Com o acórdão, o órgão de controle continua a poder fiscalizar os pagamentos, mas não de ofício, para fins de registro, e sim de auditoria, com a análise posterior de casos por amostragem ou para averiguar denúncias.

A decisão é fruto de um pedido de reexame feito ao TCU pelo Ministério da Justiça, a Associação de Luta dos Não Anistiados e Anistiados da Portaria 1.104/GM-3 e Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo. O acórdão do TCU anterior, de número 1.967/2010, mantido pelo Acórdão 3.038/2010, afirmava, atendendo a representação do Ministério Público do TCU, que “as concessões de reparações econômicas concedidas com recursos do Tesouro Nacional a anistiados políticos efetuadas mediante prestações mensais, contínuas e permanentes, com base no artigo 1º, inciso II, da Lei 10.559/2002, estão sujeitas à apreciação para fins de registro, nos termos do artigo 71, inciso III, da Constituição Federal”, o que obrigava o órgão a avaliar a legalidade de todos os benefícios concedidos.

Na prática, o que se queria era que, além do Ministério da Justiça — que reconhece a anistia — e dos Ministérios da Defesa e do Planejamento — que pagam aos anistiados — o TCU funcionasse como um terceiro órgão chancelador, que completasse o ato, analisando os casos de ofício e não por provocação. A tarefa seria tão complexa que, desde 2010, o TCU encarregou sua área técnica de elaborar uma norma que permitisse esse tipo de análise. A decisão nunca foi executada.

Segundo números levantados pelo Ministério Público, até dezembro de 2007, as reparações concedidas em parcela única — cujo teto é de R$ 100 mil — somavam R$ 124,8 milhões. Os pagamentos retroativos somavam R$ 2,4 bilhões e as prestações pagas aos beneficiários, R$ 29 milhões por mês, com impacto anual projetado em R$ 377,9 milhões, incluindo 13º salário. Desde a promulgação da Lei 10.559/2002, que instituiu regime próprio para os anistiados, diferenciando os pagamentos do regime previdenciário, dez diferentes ministros da Justiça concederam benefícios em mais de 70 mil requerimentos à Comissão de Anistia.

A lei outorgou ao ministro da Justiça a competência para conceder anistia política aos atingidos por atos de exceção durante os períodos de ditadura, e dar reparações econômicas em relação aos danos causados pela ação ou omissão de agentes públicos. De acordo com a norma, o ato político de anistia torna-se completo e acabado com a decisão do ministro da Justiça. Segundo o MJ, o atual Programa de Reparação do Estado brasileiro compreende iniciativas de reparação individual e coletiva, moral e econômica, material e simbólica, não somente com indenizações, mas também com apoio psicológico, políticas de memória, de educação e de reconhecimento das vítimas, como as Caravanas da Anistia, o projeto Marcas da Memória e as Clínicas do Testemunho.

Por isso, de acordo com o pedido de reexame apresentado pela Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça e pelo presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, “seria inoportuno e injustificável para as vítimas o Estado valer-se hoje da criação de um novo procedimento de registro e de revisão das decisões proferidas, diferente daquele instituído pelo legislador democrático por meio da Lei 10.559/2002”. Ainda de acordo com o pedido, “não se pode concordar em transformar uma análise política realizada pelo Poder Executivo, com evidente respaldo legal, em um exame meramente contábil”.

No processo, o MJ ressalvou que não se estava dizendo que o TCU não pode fiscalizar as concessões de reparações, seja em prestação única, seja em prestação mensal permanente, mas sim que o órgão não pode questionar a legalidade dos atos com fundamento no inciso III do artigo 71 da Constituição.

O relator do pedido de revisão, ministro José Múcio Monteiro, concordou. “Os parâmetros envolvidos no pagamento de indenizações aos anistiados políticos não guardam qualquer conformidade com os elementos informativos que são prestados, nos formulários do sistema Sisac, para fins de apreciação dos atos de concessão de aposentadorias e pensões comuns, inexistindo também tabelas remuneratórias fixadas por lei, como acontece no caso dos servidores públicos”, afirmou em seu voto.

Segundo o ministro, analisar a legalidade dos atos de concessão de cada benefício “seria de todo contraproducente e estaria em desacordo com os princípios da racionalidade administrativa, da eficiência, da eficácia, da economicidade, entre outros, que devem nortear a atuação dos órgãos públicos”. A melhor maneira de fiscalizar os pagamentos, afirmou, é a utilização de técnicas de amostragem, que permite maior celeridade nos exames dos processos administrativos.

Clique aqui para ler a decisão.

Processo TC 017.239/2008-7
Acórdão 3009/2012

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