AP 470

STF define penas de prisão de Dirceu, Genoíno e Delúbio

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12 de novembro de 2012, 19h19

O Supremo Tribunal Federal encerrou, nesta segunda-feira (12/11), a definição das penas de prisão do chamado núcleo político da Ação Penal 470, o processo do mensalão. Na soma das penas, José Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil no governo Lula, foi condenado a dez anos e dez meses de prisão pelos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa. Pelos mesmos crimes, os ministros apenaram José Genoíno, ex-presidente do PT, com seis anos e 11 meses de prisão. Para Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do partido, a pena total foi de oito anos e 11 meses de prisão.

Nas palavras do relator da ação, ministro Joaquim Barbosa, o então tesoureiro aderiu ao esquema desenhado por Dirceu para “alugar” as legendas para “os propósitos reprováveis constatados ao longo desta ação penal”. Cumprido um sexto da pena, os condenados têm direito a progressão de regime.

Segundo Barbosa, Delúbio atuou para distribuir recursos milionários a parlamentares levando a cabo a “subjugação do Legislativo”. Era ele, disse o relator, quem dizia ao publicitário Marcos Valério, condenado como o grande operador do mensalão, a quem, quanto e quando deveriam ser pagos “os valores a título de propina”.

Troca de réus
O ministro Joaquim Barbosa surpreendeu ao retomar o julgamento começando pela dosimetria do chamado núcleo político. Na semana passada, Barbosa disse em plenário que continuaria o julgamento com a dosimetria do núcleo financeiro, composto pelos ex-dirigentes do Banco Rural.

A mudança repentina fez o revisor da ação, ministro Ricardo Lewandowski, protestar. Ele afirmou que o relator “surpreende a corte a todo o momento” e ressaltou que os advogados de Dirceu não estavam em plenário exatamente porque todos esperavam a continuação do julgamento pelo núcleo publicitário, como anunciado anteriormente.

Iniciou-se uma discussão áspera, como de costume, entre relator e revisor. Barbosa acusou Lewandowski de tentar obstruir o andamento do processo: “Eu que estou surpreendido com a ação de obstrução de Vossa Excelência, que leu um artigo de jornal na sessão passada”. O revisor respondeu mais uma vez lembrando que o tribunal foi surpreendido com a chamada do núcleo financeiro. E clamou por transparência nos trabalhos.

O presidente do STF, ministro Ayres Britto, saía em defesa de Barbosa e de Lewandowski, a depender dos argumentos usados. Britto disse ao revisor que o relator tem a prerrogativa de impor a ordem dos trabalhos. E afirmou a Barbosa que ninguém está tentando obstruir os trabalhos. Depois de mais alguns minutos de discussão, Lewandowski pediu uma retratação de Barbosa, que a negou. O revisor, então, deixou o plenário, já que não votava em relação a Dirceu e Genoíno por ter inocentado os dois.

O ministro Marco Aurélio afirmou que “o que exteriorizou o ministro Ricardo Lewandowski é um sentimento generalizado”, em relação à inversão na ordem de decisão sobre a dosimetria. Mas ressaltou que estava preparado para votar em relação a qualquer um dos réus. Barbosa respondeu que decidiu retomar o julgamento pelo núcleo político porque “são apenas seis penas” e que “superado esse núcleo, seguiremos mais rápido com o julgamento”.

Em seguida, o decano Celso de Mello e o ministro Gilmar Mendes disseram que a intimação dos advogados é contínua e, por isso, não se pode cogitar de cerceamento de defesa no caso. Ou seja, os advogados foram intimados para o julgamento e a ordem de votação proposta pelo tribunal não influi na sua decisão de estar presente ou não à sessão.

Marco Aurélio também voltou a reforçar seu entendimento de que não é possível aplicar a agravante do artigo 62, inciso I, do Código Penal para aumentar a pena pelo crime de formação de quadrilha e, depois, usar a mesma agravante para majorar a pena de outros crimes. Mas ficou vencido. De acordo com a regra do artigo 62, o juiz pode agravar a pena de quem “promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes”.

Núcleo político
Segundo Joaquim Barbosa, o ex-ministro José Dirceu, como articulador político do governo, era quem “batia o martelo” nas negociações de compra de apoio da base aliada do governo Lula. Ainda segundo ele, Dirceu permanecia à sombra para esconder sua participação no esquema enquanto as ações visíveis eram implementadas por Delúbio Soares e Marcos Valério.

O relator também disse que José Dirceu costurou “a simulação de empréstimos bancários que se somaram às quantias desviadas dos cofres públicos” para dar aparência lícita ao dinheiro. E que o fato de negociar dentro do gabinete da Casa Civil fez com que ficassem “diminuídos e enxovalhados pilares importantíssimos da nossa institucionalidade”.

Pelo crime de formação de quadrilha, José Dirceu foi condenado a dois anos e 11 meses de prisão. Pelos crimes de corrupção ativa em relação a nove parlamentares e políticos, a pena fixada foi de sete anos e 11 meses, somada à multa de 260 dias-multa, em valores de dez salários mínimos à época dos crimes cada dia-multa. No total, a multa soma R$ 676 mil.

Em entrevista coletiva em São Paulo, o advogado José Luís de Oliveira Lima, que representa o ex-ministro de Lula, afirmou que irá recorrer, por meio de embargos infringentes, contra a condenação por formação de quadrilha. “Com quatro votos favoráveis, a defesa pode interpor Embargos Infringentes para modificar a decisão anterior. Posso inclusive ter a absolvição”, disse Oliveira Lima.

Continuidade delitiva
Os ministros recusaram o pedido de aplicação de concurso material pelo crime de corrupção ativa feito pela Procuradoria-Geral da República e aplicaram a continuidade delitiva, o que favorece o réu. Considera-se concurso material quando o mesmo crime é cometido diversas vezes em ações distintas. Nesse caso, é fixada uma pena para cada um dos crimes. No caso da continuidade delitiva, considera-se que a primeira ação criminosa levou à segunda, e assim por diante. Ou seja, o mesmo crime foi praticado diversas vezes de forma contínua. Aí se aplica a pena mais grave, que é ampliada de um sexto a dois terços.

O ex-presidente do PT José Genoíno foi condenado a dois anos e três meses de prisão pelo crime de formação de quadrilha, mais quatro anos e oito meses por corrupção ativa. Nas palavras de Barbosa, por ser um importante braço “na empreitada de mercantilização do mandato parlamentar”.

As penas aplicadas a Genoíno somaram seis anos e 11 meses de prisão. Alguns ministros observaram que isso garante ao condenado cumprimento de pena em regime semiaberto. Mas outros ministros ressaltaram que os regimes de cumprimento das penas dos condenados serão fixados em momento posterior e que, nem sempre, se trata de um mero cálculo matemático. Já a multa aplicada ao ex-presidente do PT somou R$ 468 mil.

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares foi condenado à pena de dois anos e três de meses por formação de quadrilha. Em seguida, a sessão foi suspensa para o intervalo porque o revisor do processo, ministro Lewandowski, ainda não havia voltado ao plenário. Como condenou Delúbio por corrupção ativa, ele vota nesta fase da dosimetria.

O relator, Joaquim Barbosa, quis dar continuidade à votação e tomar depois o voto de Lewandowski. Coube ao ministro Marco Aurélio lembrar que, nas ações penais, os juízes vogais não podem votar antes do revisor. Por isso, o presidente do Supremo chamou o intervalo.

Retomada a sessão, já com Lewandowski de volta ao plenário, o ministro Ayres Britto decidiu elogiar revisor e relator pelos trabalhos. Lewandowski agradeceu às palavras do presidente do STF e disse que as recebia como um desagravo feito em nome do tribunal.

O ministro Joaquim Barbosa se mostrou contrariado com o desagravo e perguntou: “Presidente, posso retomar meu voto?”. Ao final, prevaleceu a pena de seis anos e oito meses de prisão por corrução ativa para Delúbio Soares proposta por Barbosa. A multa aplicada ao ex-tesoureiro foi de R$ 325 mil.

Núcleo financeiro
Definidas as penas dos três condenados do núcleo político, os ministros passaram a analisar as penas dos condenados no núcleo financeiro, composto pelos ex-dirigentes do Banco Rural. Kátia Rabelo, ex-presidente do banco, foi condenada a 16 anos e oito meses de prisão pelos crimes de formação de quadrilha, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Os ministros também decidiram aplicar multa que soma pouco mais de R$ 1,5 milhão à ex-presidente do Rural. Kátia Rabelo foi condenada por 46 operações de lavagem de dinheiro e 24 operações de evasão de divisas em continuidade delitiva.

Separadas, as penas fixadas à dirigente do Rural foram de dois anos e três meses por formação de quadrilha, cinco anos e dez meses por lavagem de dinheiro, quatro anos por gestão fraudulenta de instituição financeira e quatro anos e sete meses de prisão por evasão de divisas.

Na próxima quarta-feira (14/11), o Supremo continuará a definir as penas dos outros dois ex-dirigentes do banco condenados na ação: José Roberto Salgado e Vinicius Samarane. Como Kátia Rabelo, Salgado foi condenado por formação de quadrilha, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Já Samarane foi condenado por gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro.

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