Justiça Tributária

Só cortar tributos não resolve. Isso é ridículo!

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

12 de novembro de 2012, 17h19

Spacca
Por qualquer ângulo que se olhe para o problema da tributação no Brasil a visão é uma só: um sistema que já troca a arrecadação pelo confisco, assim estimulando as mais fantasiosas tentativas de sonegação, transformando a questão toda numa verdadeira doença mental.

O governo federal anunciou recentemente sua disposição de simplificar a cobrança do PIS e da Cofins e criar meios para que os estados reduzam a chamada guerra fiscal.

Não basta juntar as duas contribuições sociais, que oneram ainda mais as operações já oneradas pelo ICMS e IPI. Também não é razoável supor que a União possa pressionar estados para que abram mão de receitas, ainda que a pretexto de eliminar a tal guerra fiscal.

Sempre é bom lembrar que os incentivos regionais concedidos no âmbito estadual são necessários, pois o governo federal não tem distribuído os benefícios da arrecadação geral de forma adequada às unidades da Federação. Além disso, temos governadores perdulários e irresponsáveis, que utilizam de forma demoníaca os recursos.

O financiamento de festas religiosas cujo custo deveria ser suportado apenas pelos crentes é um exemplo de farra com dinheiro público, vindo dos impostos. De igual forma, os inúmeros desvios em obras suntuosas, museus inúteis e até mesmo obras desnecessárias levantadas para inflar o ego de políticos medíocres.

Mas, além disso tudo, ainda há meios de se melhorar a arrecadação federal, regulamentando-se o IGF — imposto sobre grande fortunas — que poderia compensar boa parte das desonerações necessárias. Desde 1988 a Constituição prevê esse tributo, no artigo 153, mas inexplicavelmente não se implantou a legislação complementar. Já tivemos oportunidade de comentar essa matéria aqui, na coluna publicada em 31 de outubro de 2011 (clique aqui para ler).

Parece ser absolutamente contraditório que um governo supostamente de esquerda, preocupado com justiça tributária como um dos elementos de distribuição da riqueza, possa não utilizar tributo sobre as grandes fortunas, ao mesmo tempo em que mantém a cobrança do IPI — imposto sobre produtos industrializados — onerando medicamentos, alimentos, roupa e tantos outros artigos que pesam mais nas finanças dos pobres.

Por outro lado, as reduções de IPI sobre veículos, por exemplo, embora sejam necessárias, também favorecem os bancos, pois a maior parte dos veículos novos são financiados. Tudo indica que a Receita seja conduzida pelos integrantes da esquerda escocesa, aquela que só toma uísque do bom.

Claro que justiça tributária tem seu maior problema na carga. Dizem que temos uma carga atual de 35% do PIB. Mas em vários ramos de atividade esse número é maior, pois não são incluídas diversas taxas e outros acréscimos que decorrem do mau funcionamento do estado e que acabam onerando o contribuinte.

Um desses custos indiretos, que não compõem aqueles 35%, são as perdas que decorrem da péssima infraestrutura. Produtores de soja, por exemplo, sofrem grandes perdas por falta de boas rodovias e portos adequados. Outros enfrentam problemas terríveis, como o custo excessivo da energia elétrica, burocracia excessiva e irritante, e até mesmo os custos necessários para treinar funcionários que saem da escola pública sem saber ler, contar e pensar com alguma qualidade.

Se atualmente todos os tributos arrecadados no Brasil representam 35% do PIB, vale lembrar que desse bolo todo 69% são tributos federais, 26% são do estado e apenas 5% dos municípios. Assim, não estamos num verdadeiro estado Federativo, mas num arremedo de Federação, onde o prefeito anda de chapéu na mão junto aos governos estaduais e estes com o pires na mão, pedindo ao federal. República isto não é. Pois a coisa toda não é distribuída proporcionalmente às responsabilidades e encargos de cada um. Isso é o que fez com que a maior cidade do país tivesse que ficar pendurada no Tesouro Nacional, com uma dívida que é cerca do dobro de sua arrecadação anual.

Editorial deste domingo (11/10) da Folha de S.Paulo, analisa a suposta tentativa que se faz de simplificar e desonerar a carga. Um item relevante é o que registra as despesas da União (que recebe 69% dos tributos), onde vemos que as de pessoal representam 4,3% do PIB. Tal volume não se justifica, na medida em que há ministérios claramente inúteis, gastando verbas apenas para acomodar interesses políticos. De outro lado, só se fala em aumento do número de servidores. Um setor curioso é o da Receita, onde mesmo com avanços tecnológicos expressivos, sempre se contrata mais gente. Ora, a tecnologia foi criada para simplificar o serviço e reduzir o trabalho das pessoas, não é mesmo?

Finalmente, no mesmo editorial assinala-se que o investimento da União é de apenas 1,1%. Isso é ridículo!

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    é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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