Arrocho nos subsídios

Não se pode desmoralizar um Poder da República

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7 de novembro de 2012, 18h18

Como tem noticiado amplamente os órgãos de imprensa, os magistrados da União — juízes do Trabalho e federais comuns — paralisam suas atividades por dois dias, em 7 e 8 de novembro, para protestar contra a desvalorização de suas carreiras, que sofreram perdas remuneratórias de 28,86% desde 2005, quando foi implantado o subsídio em parcela única. Tampouco participarão da “Semana Nacional de Conciliação”, programada pelo Conselho Nacional de Justiça para os dias 7 a 14 de novembro. As conciliações serão retomadas após o dia 14 de novembro; e, de todo modo, os juízes estarão presentes nas unidades judiciárias, durante os dias 7 e 8, para atendimento ao grande público nos casos de emergência.

Sobre esse movimento que mais uma vez se deflagra, repetindo (e intensificando) aquele havido em 30 de novembro de 2011, mais uma vez é preciso prestar esclarecimentos à população. Para isso, este artigo.

Os juízes têm o direito constitucional à irredutibilidade de subsídios, exatamente para a garantia da independência do Poder Judiciário (artigo 95, inciso III, da Constituição). Essa irredutibilidade, porém, vem sendo garantida apenas formalmente. Na prática, amargam já trinta por cento de perdas estimadas em seu poder de compra. Em várias unidades jurisdicionais, se não em sua maioria, juízes titulares e substitutos já vêm recebendo apenas o terceiro ou quarto maior vencimento, sendo superado por servidores que funcionalmente se subordinam aos primeiros e não detêm as mesmas responsabilidades funcionais. Esse estado de coisas compromete, no limite, o próprio sentido de hierarquia.

A Constituição também assegura aos juízes, e a todos os servidores, o direito de ter anualmente revisados os seus vencimentos, como se lê textualmente na parte final do artigo 37, inciso X, da Constituição Federal. Tampouco este direito tem sido atendido, conquanto se trata de dever constitucional da União.

É certo, ademais, que a mobilização segue padrões éticos muito claros. Os juízes do Trabalho não vão simplesmente “parar”, no sentido etimológico da palavra. Redesignarão audiências, é verdade; mas o farão para breve, de modo a causar mínimo prejuízo. Na sequência, voltarão a conciliar, como historicamente fazem desde a década de quarenta, com os maiores índices de conciliabilidade dentre todos os ramos do Poder Judiciário.

Entendemos, enfim, que o recurso à paralisação e à chamada “semana sem conciliação” é a consumação de um derradeiro ato de resistência legítima, ínsita à própria natureza humana (artigo 8º, n. 1, "d", do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas), quando outros instrumentos não se revelam mais viáveis. A Constituição só o nega às carreiras militares (artigo 142, parágrafo 3º, inciso IV, da CF); e a norma constitucional restritiva há de ser interpretada restritivamente. Na mesma esteira, a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho garante aos servidores públicos em geral “os direitos civis e políticos essenciais ao exercício normal da liberdade sindical, sujeitos apenas às obrigações decorrentes de seu regime jurídico e da natureza de suas funções”, o que evidentemente inclui o máximo direito de resistência no campo profissional.

Com tais protestos, os juízes querem sinalizar ao Poder Executivo, ao CNJ — idealizador e patrocinador das semanas nacionais da conciliação — e ao Supremo Tribunal Federal que não se pode mais transigir com metas e campanhas que exijam redobrado esforço dos magistrados, quando os seus reclamos mais comezinhos, ligados a garantias constitucionais explícitas, são ignorados. Não se pode mais seguir com uma atitude colaboracionista, quando o Poder Judiciário é posto de joelhos e sequer a proposta orçamentária do presidente do STF, que previa reposição inflacionária de cerca de 21% do valor dos subsídios (menos, portanto, que o efetivo desgaste monetário do período), é respeitada. Afinal, outra vez o Executivo encaminhou ao Congresso Nacional a sua própria proposta, ignorando a vontade institucional de um poder autônomo. E, não bastasse, seguem sem solução os mandados de injunção impetrados pelas associações nacionais para a revisão dos subsídios, que há meses tramitam pelo STF sem pautamento.

A quem mais poderíamos recorrer?

Sempre fizemos valer os direitos do povo. O que agora pedimos é que o povo nos compreenda, por um átimo que seja, e nos permita reivindicar nossos próprios direitos. Não restaram outros caminhos.

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