No caminho do petróleo

"Municípios afetados devem recebem mais royalties"

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4 de novembro de 2012, 8h40

Spacca
Felipe Burnhuldt - 01/11/2012 [Spacca]Em matéria de royalties do petróleo, o advogado Rodrigo Bornholdt é dos poucos que conhecem bem o outro lado do balcão. Foi vice-prefeito de Joinville (SC) e chegou a concorrer ao cargo de prefeito, em 2008. No poder público, foi procurador-geral do município. Agora dedicado totalmente ao escritório de advocacia da família, o Bornholdt Advogados, o ainda  presidente do PDT da cidade, usa o conhecimento que acumulou para defender prefeitos. Seu principal campo de batalha ainda tem a ver com política. A exploração de petróleo e gás sempre rendeu royalties a municípios vizinhos a plataformas continentais, até que, em 2002, uma resolução da Agência Nacional do Petróleo enxugou a lista de beneficiários. Desde então, o escritório acumula decisões judiciais que têm garantido essas rendas aos prejudicados, enquanto a batalha aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal. 

Para se defenderem, mais de 20 municípios se uniram em uma entidade, a Associação dos Municípios Excluídos do Rol de Recebedores de Royalties de Petróleo e Gás, a Amroy, da qual Bornholdt é secretário-executivo. A entidade, criada no primeiro semestre, pleiteia no Congresso Nacional a inclusão da discussão dos royalties do petróleo já explorado no projeto de lei que definirá os pagamentos relacionados ao pré-sal, cuja exploração ainda depende do marco regulatório. O debate caminhou no Senado e agora espera votação pelo Plenário da Câmara. O assunto está pautado para a próxima terça-feira (6/11) na casa. 

Os municípios querem ver definidos em lei o que são instalações de embarque e desembarque de petróleo e gás. Isso porque a ANP mudou, por meio de norma técnica, a classificação de algumas instalações, o que acarretou na perda dos royalties para alguns. A Amroy pede que os deputados digam se monoboias, piers de atracação, cais acostáveis, tanques de armazenamento e pontos de transferência de gás (citygates) são as instalações previstas na Lei do Petróleo para o pagamento das compensações.

Os valores pleiteados são estimados em R$ 15 milhões por mês para cada município. A lista é formada por Canoas (RS); Cidreira (RS); Imbé (RS); Osório (RS);  Guararema (SP); Estância (SE); Laranjeiras (SE); Nossa Senhora do Socorro (SE);  Rosário do Catete (SE); Cabo de Santo Agostinho (PE); Camaragibe (PE); Goiana (PE); Igarassu (PE); Jaboatão dos Guararapes (PE); Paulista (PE); Aracati (CE);  Caucaia (CE); Horizonte (CE); Icapuí (CE); Maracanaú (CE); e Pacajus (CE).

Leia a entrevista:

ConJur — O senhor tem conseguido, na Justiça, o pagamento de royalties de petróleo e gás para municípios que deixaram de receber essas receitas por conta de uma mudança normativa da Agência Nacional do Petróleo em 2002. O que aconteceu?
Rodrigo Bornholdt —
A ANP excluiu, de uma lista de mais ou menos 55 municípios, quase 40 do rol dos que recebiam royalties. A agência reinterpretou a legislação dizendo que instalações de embarque e desembarque, previstas como geradoras do direito de receber royalties, eram apenas aquelas que estivessem mais próximas da plataforma continental. Deixaram cidades essenciais para o processo de produção do petróleo e do gás natural sem qualquer margem para o recebimento.

ConJur — Quem ficou de fora, por exemplo?
Rodrigo Bornholdt —
No Rio de Janeiro, as cidades de Japeri e Barra do Piraí; Aracruz, no Espírito Santo; Guararema, em São Paulo; Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco. Alguns casos envolvem petróleo e outros, gás. Nos que envolvem petróleo, o abuso é nítido. Há tanques imensos concentrando petróleo nas cidades, que correm riscos grandes antes que o produto chegue à refinaria. Esses municípios estão entre o mar e a refinaria, mas simplesmente deixaram de receber. Mas conseguiu-se restabelecer, pela via judicial, a maioria dos pagamentos.

ConJur — Por que a discussão dos royalties do petróleo é importante para municípios que recebem valores decorrentes da exploração atual?
Rodrigo Bornholdt —
O objetivo dos municípios que defendemos é fazer com que as mudanças a serem implementadas pelo Congresso não prejudiquem os valores que os municípios hoje recebem. Isso tem um fundamento constitucional e político, já que se tem agora o pré-sal. Não há justificativa para se fazer uma nova divisão dos royalties em algo que já tinha sido licitado e que já vinha sendo pago regularmente aos municípios e aos estados. Ainda que não seja uma receita certa em termos de valores, porque depende da produção, ela é uma receita mensurável. O perigo é haver um corte abrupto nessas receitas, o que pode gerar um problema para muitos municípios.

ConJur — A ideia é aproveitar essa discussão e também rever as mudanças feitas pela ANP que mitigaram o pagamento de royalties a alguns desses municípios?
Rodrigo Bornholdt —
É isso e ao mesmo tempo garantir a receita para os municípios com a entrada do restante dos municípios na conta. Na verdade, existe já um fundo que destina uma parte dos royalties a todos os municípios da federação. A questão é que é um valor pequeno e os municípios querem um aumento disso.

ConJur — Quais municípios sofreriam maior perda de receita?
Rodrigo Bornholdt —
Os da baixada fluminense. Quanto maior o município, quanto mais dependente dos royalties, maior o impacto que ele sofre.

ConJur — Uma redistribuição dos royalties não beneficiaria municípios mais pobres?
Rodrigo Bornholdt —
A reivindicação dos demais municípios de ter uma parcela dos royalties é justa apenas em termos. Eles não têm o direito, seja pela Constituição, seja por uma questão de justiça, de receber o mesmo valor daqueles municípios que sediam instalações ou que são afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e que, por isso, sofrem prejuízo ambiental, econômico e social. De certa forma, essas atividades interferem na vocação dos municípios. E como estamos tratando de um recurso finito, em determinado momento isso vai ter que ser alterado. Os municípios precisam fazer investimentos para poder diversificar suas fontes de geração de renda.

ConJur — Os royalties são compensações?
Rodrigo Bornholdt —
Sim, sem dúvida. Originalmente, os royalties eram chamados de indenizações. A Lei 2.004, de 1953, que cria a Petrobrás e institui determinados royalties, os chamava de indenizações. A ideia é justamente essa, de uma compensação.

ConJur — É forte a tendência de que os royalties do pré-sal sejam distribuídos igualitariamente entre os municípios. Sua proposta é que essa regra valha só para as próximas licitações e não para as áreas já exploradas?
Rodrigo Bornholdt —
É basicamente isso. Eu pontuaria ainda que mesmo no pré-sal nós entendemos que deve ter uma diferença também. É preciso ser mais igualitário, mas não completamente igual. Municípios produtores e afetados deveriam receber 60% ou 70% dos royalties, e os outros, o restante. Tem de haver uma diferenciação para não se violar o dispositivo constitucional que fala da compensação pela exploração, mesmo em plataforma continental, porque são esses municípios próximos que permitem que o petróleo seja usufruído depois pela população.

ConJur — Embora o petróleo traga riscos para municípios próximos, também traz benefícios, como geração de empregos, renda, serviços e, consequentemente, impostos. Isso também não é uma compensação?
Rodrigo Bornholdt —
Os prejuízos são fundamentalmente ambientais e sociais. Uma concentração de pessoas que vai para determinado município acaba impactando no desenvolvimento dessa cidade. O poder público precisa prover a cidade com mais serviços e infraestrutura adequada para receber mais gente. Há benefícios, mas também há consequências. Em termos econômicos, talvez prejuízo não seja a melhor palavra, mas sim a preocupação com uma redefinição da vocação do município no momento em que o petróleo deixar de ser explorado. Talvez isso não ocorra nos próximos cinco ou dez anos, mas em 15, 30 ou 40 anos certamente ocorrerá.

ConJur — Em quanto é estimada a receita com os royalties?
Rodrigo Bornholdt
— Depende do município. Há vários critérios para aferição disso. Há os municípios produtores, que são os que mais recebem. Há também os portadores de instalações de embarque e desembarque e os afetados pelas operações, que são os vizinhos. Para esses há o risco de dano ambiental. Esses valores dependem também do volume de petróleo e de gás natural movimentado. Há duas bases de cálculo para pagamento dos royalties: uma que vai até 5% da produção e que é distribuída igualitariamente entre os municípios afetados. Quanto ao percentual acima de 5% da produção, entre 5% e 10% dos royalties pagos pelas empresas à ANP, que repassa aos municípios, há diferenciação pelo volume movimentado. Por exemplo, municípios do Rio e de São Paulo recebem mais royalties do que os do Rio Grande do Sul ou do Nordeste, porque mais petróleo é movimentado na região Sudeste.

ConJur — Quantos municípios são seus clientes?
Rodrigo Bornholdt —
Em torno de 15. 

ConJur — E de quanto estamos falando em royalties para eles?
Rodrigo Bornholdt —
De R$ 15 a R$ 20 milhões por mês para serem distribuídos a todos. Para um município pequeno, é um valor que impacta. 

ConJur — No Congresso, existe a chance de se alterar também a distribuição dos royalties para beneficiar esses municípios já nas próximas rodadas?
Rodrigo Bornholdt —
Existe. O novo marco regulatório deve ser aprovado até novembro ou dezembro, já que a ANP lançou a rodada de licitação para maio e o governo já disse que a rodada não sai sem que estejam definidos os royalties. Então, isso deve ser aprovado agora. Já foi aprovado no Senado um projeto de lei que contempla parcialmente a nossa proposta. Na Câmara, esse projeto está sendo votado. Se nós não conseguirmos as mudanças necessárias na Câmara, vamos lutar para que pelo menos não se destrua aquilo em que o Senado já avançou.

ConJur — No que uma mudança legislativa pode ajudar?
Rodrigo Bornholdt —
Definindo que os municípios são afetados por razões ambientais, sociais e econômicas, garantindo que eles não sofram diminuição do que recebem e que não haja ambiguidade que permita à ANP interpretar livremente a lei de modo a definir quais são os municípios que devem receber o dinheiro. Porque, do ponto de vista constitucional, ela não pode fazer isso, tem que estar vinculada a parâmetros legais, porque senão há uma delegação disfarçada do poder, em que o Legislativo deixa de legislar. O trabalho da ANP não pode ser mais do que regulamentar.

ConJur — Como está o placar na Justiça?
Rodrigo Bornholdt —
Até 2009, estávamos ganhando praticamente tudo. Porém, no Nordeste, já havia algumas derrotas em casos um pouco diversos. Em 2010, perdemos no STJ um caso emblemático que estávamos ganhando. O STJ acabou fazendo uma declaração escamoteada de inconstitucionalidade, ao usar um fundamento constitucional para reduzir o alcance da lei. Tentamos esclarecer isso com Embargos de Declaração, mas eles não aceitaram. Então, fizemos uma Reclamação no Supremo, já que, para declarar inconstitucionalidade, é preciso decisão da Corte Especial do STJ, e não de Turma. O desafio foi mostrar ao STF que houve, de fato, uma declaração parcial de inconstitucionalidade, o que conseguimos. Obtivemos uma liminar no fim de 2010, cuja relatora foi a ministra Ellen Gracie (aposentada). Desde então, os efeitos da decisão do STJ estão suspensos. Outras duas Reclamações ajuizadas no Supremo, uma de nossa autoria, tiveram fim diferente, já que outros ministros entenderam diferentemente. Mas temos ações nas mais variadas instâncias.

ConJur — Quais são os argumentos das ações?
Rodrigo Bornholdt —
Os de ordem formal implicam, por exemplo, ausência do devido processo legal. Os municípios só foram avisados de que perderiam o direito. A ANP fez esse esclarecimento, mas não abriu um processo administrativo propriamente dito. Quando você suprime um direito, precisa dar oportunidade de defesa para quem vai perdê-lo. Outro argumento é a mudança de interpretação feita pela ANP. Havia uma interpretação consolidada da lei pelo órgão administrativo, que não pode simplesmente alterar a interpretação prejudicando aqueles municípios por regulamento. Mas foi isso que a ANP fez. O próprio regulamento tem alguns vícios formais. Foi aprovado sem as devidas cautelas e há ofensas na razoabilidade de igualdade. Há municípios que sofrem os mesmos efeitos que outros, mas não recebem o mesmo. O artigo 20 da Constituição, no parágrafo primeiro, obriga a ANP a considerar os efeitos da exploração do petróleo que os municípios sofrem. Cito, como exemplo, os parques de armazenamento.

ConJur — O que é um parque de armazenamento?
Rodrigo Bornholdt —
Imagine tanques gigantes que recebem petróleo. Por Guararema, por exemplo, passam basicamente 40% do petróleo nacional, vindo de São Sebastião. O petróleo passa por uma tubulação que não é simples. Ali fica armazenado todo o petróleo. Portanto, ainda que a ANP tivesse possibilidade de eleger quais são as instalações que se enquadram para o pagamento de royalties — e ela não pode porque já havia herdado uma interpretação existente —, não pode ignorar determinados dados da realidade. Quando se tem uma situação fática tão contundente que é evidente que ela se enquadra no dispositivo legal, o órgão administrativo não tem condições de excluir isso.

ConJur — E quanto ao enquadramento dos citygates, também contestado nas suas ações?
Rodrigo Bornholdt —
Antes da ANP, quem destinava os royalties era a própria Petrobrás. Ela sempre entendeu que o regulamento prevê cinco tipos de instalações. Uma delas é a instalação de coleta e de transferência de petróleo e de gás natural. A Petrobrás enquadrava os citygates e os parques de armazenamento nessa categoria. Não é coletar no sentido de transferir, mas no de pegar de um lugar e armazenar e depois transferir. A ANP fez uma interpretação restritiva disso, mas ela mudou uma interpretação que já estava consolidada. A interpretação da lei não está condicionada ao regulamento. O regulamento exemplifica alguns pontos de recebimento, algumas instalações, mas ele não pode ser tomado de modo exaustivo, porque a lei está acima do regulamento. Especificamente, os citygates recebem o gás natural e fazem um controle da pressão. Eles medem o gás natural. O gás entra, sofre uma transformação e de lá continua. Por isso a Petrobrás entendia que eles se enquadravam dentro da categoria de coleta e transferência de gás natural.

ConJur — Se o marco regulatório discutido no Congresso não contemplar essas mudanças, a lei pode ser questionada no Supremo quanto à sua constitucionalidade, haja vista os argumentos usados nas suas ações?
Rodrigo Bornholdt —
Sem dúvida.

ConJur — O que diz a jurisprudência do Supremo a respeito?
Rodrigo Bornholdt —
O Supremo tem essa compreensão ampla do artigo 20, parágrafo primeiro, de que os royalties servem para a compensação pelos efeitos ambientais, econômicos e sociais acarretados pela exploração do petróleo. Sempre que o STF se manifestou sobre isso, tratou da lavra em terra, ou seja, em que a instalação está no próprio município em que se dá a exploração. A ANP tem uma compreensão restritiva do artigo 20, parágrafo primeiro, da Constituição. Nós entendemos que não é assim. É uma questão de lógica, de razoabilidade. A exploração na plataforma continental não está no território de nenhum município. Portanto, a compensação que está prevista no artigo 20, parágrafo primeiro, tem de ser feita àqueles que recebem o petróleo oriundo da plataforma continental.

ConJur — Se a nova legislação distribuir os royalties da maneira como querem esses municípios, isso acarretará custo para as futuras concessionárias do pré-sal?
Rodrigo Bornholdt —
Não, porque esse é um tema de destinação dos recursos, não de arrecadação. A alíquota que elas vão pagar é a mesma.

ConJur — Há alguma preocupação sobre os royalties desses municípios no Ministério de Minas e Energia?
Rodrigo Bornholdt —
Não, eu não tenho conhecimento de discussão sobre isso no Ministério de Minas e Energia. Eles têm discutido a questão estratégica da indústria do petróleo e as questões referentes às licitações, definição de quando saem, quais vão ser os blocos a serem explorados, como vai ser feita a divisão dos blocos. O que eu sei também é que existe um movimento, justo a meu ver, de que os royalties sejam destinados, pelo menos parte deles, à educação. Essa é justamente uma maneira que os municípios teriam para ter essa compensação, uma vez que o recurso é finito e a vocação econômica pode mudar repentinamente. Seria uma forma de propiciar um capital intelectual para a população nesse período, que permita a ela diversificar as fontes de renda e de geração de emprego. Não vejo oposição nenhuma dos prefeitos quanto a isso.

ConJur — O senhor é presidente do PDT de Joinville e já foi vice-prefeito da cidade. Como avalia a classe política, o julgamento do mensalão e as primeiras eleições sob a égide da Lei da Ficha Limpa?
Rodrigo Bornholdt —
Tenho visto com muita preocupação a falta de legitimidade da classe política. Não vejo o povo ou os grupos sociais se projetando na classe política, exceto grupos de interesse. No Executivo, o uso excessivo de medidas provisórias é um vício. A medida provisória é um instrumento excepcional, mas vem sendo usada para todo tipo de necessidade do governo, não importa qual governo que seja. Ninguém resiste à tentação de utilizá-la. O [José] Sarney não resistiu, o [Fernando] Collor não resistiu, o Fernando Henrique Cardoso, que era crítico enquanto senador, não resistiu, o PT que era crítico quando oposição, não resistiu. No caso do mensalão, acredito que o Supremo tem de ser uma corte constitucional. Ele já tem mais de duzentos artigos da Constituição para interpretar. Casos como o do mensalão deveriam ser julgados pelo STJ ou por algum outro tribunal criado para evitar que o Supremo concentre todas essas atribuições. O Supremo está parado há três meses julgando isso. Mandado de Segurança contra presidente do Tribunal de Contas da União é julgado pelo Supremo. Mandado de Segurança contra presidente da Câmara é julgado pelo Supremo. Não tem como 11 seres humanos, por mais capacitados que sejam, darem conta de um volume desses. Quem perde com isso é o Estado Democrático de Direito. Tudo isso está relacionado, porque, na medida em que se tem o Congresso sendo pautado pelas medidas provisórias, acontece o que o professor Friedrich Müller falou, lá em 1999 em um congresso da OAB: uma “desparlamentarização” e uma “desdemocratização” do país. Porque os parlamentares acabam corroborando ou rejeitando. Não têm tempo e acabam não se preocupando com aquilo que é fundamental para o país, acabam entrando na pauta do Executivo. No mundo inteiro, as populações estão um pouco cansadas das democracias, mas felizmente não propõem nada autoritário em troca disso.

ConJur — No Brasil, também acontece isso?
Rodrigo Bornholdt —
No Brasil é mais preocupante porque vimos de uma tradição autoritária. As medidas provisórias são fruto de um país que viveu praticamente metade do seu período republicano sob regimes autoritários. Muitas vezes os atores político-eleitorais já não estão mais decidindo, as decisões estão vindo dos grupos de interesse. É uma característica das sociedades de massas, é uma característica das democracias de massas. Se é certo que uma atuação mais forte do Supremo acaba, em certo sentido, judicializando a política, pelo menos aí se tem uma influência do conjunto de direitos e de garantias instalados na Constituição e de programas previstos pela Constituição que acabam engessando, no sentido positivo da palavra, a atuação política dos atores políticos.

ConJur — O que acha da interferência do TSE e do STF nas questões políticas?
Rodrigo Bornholdt — A Justiça Eleitoral é uma das mais céleres do país. O fato de o TSE julgar candidatos eleitos e mudar o resultado das urnas se deve à falta de um registro prévio das candidaturas. Por que não se permite registro de campanha seis meses antes? Nos Estados Unidos, Obama e o Romney estão em campanha há um ano e meio. Toda a parte burocrática já se pode resolver em março, com as eleições em outubro. Aí o TSE tem tempo para julgar questões de ficha limpa. De todo modo, o TSE e o Supremo fizeram algo que os políticos deveriam ter feito há muito tempo, que foi a questão da fidelidade partidária, que é um tema essencial. A contribuição da Justiça tem sido mais positiva do que negativa na política.

ConJur — O que acha do financiamento público de campanhas?
Rodrigo Bornholdt —
Acho que é o caminho. Nunca se conseguirá coibir completamente o financiamento privado, vai haver sempre caixa 2. O ideal seria até ter uma margem de financiamento privado, mas o recurso tem que ser predominante público, em uma escala assim de 80% para 20%.

ConJur — Por que é impossível evitar o caixa 2?
Rodrigo Bornholdt —
Porque a cultura política do Brasil ainda é muito forte nesse sentido. Agora, se você tem um processo mais aberto, menor fica o caixa 2. Também precisaríamos caminhar para uma legislação que fosse severa na questão da origem dos recursos que o candidato recebe, mas que desse a ele uma liberdade maior. Tenho a esperança de que a internet vá baratear as campanhas. Estou vendo que nesta eleição em Joinville, por exemplo, a internet não ficou restrita à classe média. Ou vamos falar de outra forma: a classe média se expandiu também. Então, a internet chegou a mais pessoas, mais lares e isso pode ajudar a baratear a campanha.

ConJur — Como administrador público, acha que a Lei de Licitações precisa de uma reforma?
Rodrigo Bornholdt —
Ela está um pouco desatualizada porque precisa ser mais setorial. A crítica que se faz à Lei de Licitações é que ela sempre foi voltada basicamente para obras, para engenharia. Nós precisamos de uma lei que abrangesse serviços com maior propriedade.

ConJur — O senhor já enfrentou problemas por prestar serviços de advocacia aos municípios?
Rodrigo Bornholdt —
Já tivemos questionamentos, mas eles foram superados. Mas outros colegas já sofreram com isso.

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