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Advogado de sindicato não pode cobrar honorários

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3 de novembro de 2012, 13h30

Advogado trabalhista credenciado em sindicato presta serviço à agremiacão e não ao trabalhador que representa no caso. Com esta fundamentação, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou sentença que condenou uma trabalhadora de Pelotas (RS) a pagar 15% de honorários aos sucessores do seu primeiro advogado, que faleceu no curso do processo. A trabalhadora é beneficiária da assistência judiciária gratuita, pois declarou que não tinha condições financeiras de pagar as custas do processo e nem os honorários de advogado.

A relatora da Apelação na corte, desembargadora Catarina Rita Krieger Martins, explicou que, na esfera trabalhista, a Lei 5.584/1970 disciplina a concessão e a prestação de assistência judiciária na Justiça do Trabalho. Em seu artigo 14, a lei dispõe que a assistência será prestada pelo sindicato da categoria profissional. Já o artigo 16 diz que os honorários do advogado, pagos pela parte vencida, reverterão em favor do sindicato assistente. O artigo 18 ainda ressalva que a AJG ‘‘será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo sindicato’’.

A desembaragadora transcreveu, literalmente, os fundamentos expostos pela colega de corte Ana Maria Nedel Scazilli em julgamento similar, e que reflete a posição da câmara: "Visa, a legislação, proteger o empregado, para que perceba o valor líquido que lhe é devido diante da natureza alimentar da importância que lhe foi sonegada pelo ex-empregador e é o único caso em que são fixados honorários de sucumbência a serem suportados por este último, se vencido e, caso reste vencedor, o advogado nada tem a receber, porque atua sob contrato de risco porque, ao atuar mediante credenciamento pelo Sindicato, defendendo trabalhador dito hipossuficiente, está ciente dos termos e do objetivo da Lei, que é protetiva quanto à percepção da integralidade do crédito trabalhista".

E arrematou a relatora: "Assim, atuou o falecido advogado, por contrato de risco de receber somente os honorários da sucumbência, que são os honorários de AJ (assistência judiciária), os quais foram fixados na sentença na esfera trabalhista. Nada mais lhe é devido". O acórdão foi proferido dia 25 de outubro. Cabe recurso.

O caso
Na Ação de Arbitramento de Honorários Advocatícios que tramitou na 3ª Vara Cível da Comarca de Pelotas, a sucessão do advogado falecido alegou que foi firmado um contrato de prestação de serviços com a autora em dezembro de 1996. Três anos mais tarde, o advogado veio a falecer, sendo nomeado outro procurador para dar sequência ao atendimento da reclamatória trabalhista. No fim do processo, entretanto, nenhum valor foi repassado à sucessão, a título de honorários.

Em juízo, a autora apresentou contestação. Disse que o trato foi de que o advogado somente receberia os honorários da parte vencida na ação trabalhista, desde que conseguisse se credenciar no sindicato de sua categoria – o que efetivamente ocorreu. Informou que os honorários de sucumbência — R$ 9.020,13, em valores de setembro de 2008 — foram pagos pela empresa reclamada não ao sindicato, mas à sucessão do advogado. Logo, não poderia se falar em honorários contratuais, porque não entabulados formalmente.

Com base na documentação apensada aos autos, o juiz Alexandre Moreno Lahude se convenceu de que houve, efetivamente, a contratação e a prestação do serviço. ‘‘O fato de inexistir contrato escrito não tira da parte autora o direito de pleitear os honorários advocatícios por serviços prestados pelo advogado falecido, eis que a prestação de serviços judiciais é facilmente identificada pela documentação coligida aos autos’’, frisou.

Neste sentido, destacou que a atividade do advogado é de meio, e não de fim. Logo, o profissional tem direito a receber honorários, qualquer que seja o resultado de sua atuação profissional – salvo se o contrário estiver expresso no contrato, o que não foi o caso dos autos.

Assim, com base nas determinações da Resolução 007/2009 – que dispõe sobre a remuneração mínima dos advogados gaúchos –, o magistrado fixou honorários de 15%. O percentual deve incidir sobre o valor atualizado da condenação estabelecida na demanda trabalhista, como determina o artigo 20, parágrafo 3º., do Código de Processo Civil (CPC).

Ministério Público do Trabalho gaúcho pede o fim da cobrança acumulada
A cobrança cumulada de honorários advocatícios na Comarca de Pelotas levou o Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, no início de agosto, a solicitar, amigavelmente, que os advogados locais se abstenham desta prática. O pedido foi feito em audiência pública ocorrida no prédio da Justiça do Trabalho. O encontro reuniu cerca de 60 pessoas, incluindo advogados, sindicalistas, os procuradores do MPT Fernanda Ferreira e Rogério Fleischmann e a juíza do Trabalho Ana Ilca Härter Saalfed.

Segundo denúncias da magistrada, titular da 4ª Vara do Trabalho de Pelotas, alguns advogados vêm tirando dinheiro ilegalmente de trabalhadores, com a conivência da direção dps sindicatos. Além de honorários assistenciais, alguns cobram honorários contratuais e ainda retêm parte do FGTS e do seguro-desemprego dos trabalhadores.

Ao final da reunião, os representantes de sindicatos foram notificados pelo MPT a pararem de fazer a cobrança. Se insistirem na prática, o parquet avisou que poderá tomar medidas extrajudiciais preliminares. Se ainda assim não for suficiente, ameaçou ajuizar Ação Civil Pública contra os sindicatos e advogados infratores.

O procurador Rogério Fleischmann conversou com a reportagem da ConJur. 

ConJur – Que posição o MPT levou para o encontro?
Rogério Fleischmann – A de que a cobrança cumulada de honorários é indevida. A Constituição Federal prevê, expressamente, que aquela pessoa que é pobre tem o direito de acessar a Justiça sem pagar nada por isso. É uma previsão que está no título dos direitos fundamentais inalienáveis. E ainda tem uma questão lógica: se a pessoa está declarando que é pobre, ela não é pobre só para não pagar custas, emolumentos, honorários de peritos. Ela é pobre, também, para não pagar honorários advocatícios.

ConJur – Como foi a receptividade? Alguém contrariou este entendimento?
Rogério Fleischmann – A presença maciça era de sindicalistas e de advogados contrários a nossa tese. Sofremos uma reação forte. Mas também houve manifestação favorável. O que colocamos lá? Expomos a tese claramente. Mostramos que os sindicatos, por receberem a contribuição social, que é obrigatória, têm de prestar esta assistência ao trabalhador. Qual a função do sindicato, se ele não pode nem prestar assistência ao trabalhador pobre na hora de ajuizar a ação?

ConJur – Houve uma recomendação expressa para que se abstenham da prática?
Rogério Fleischmann – Sim, porque a Procuradoria de Pelotas já tem procedimentos e inquéritos instaurados, tratando do assunto. O caminho agora vai ser no âmbito desses inquéritos. O procurador local vai chamar os sindicatos e propor um ajustamento de conduta. Se os sindicatos não quiserem, vamos ajuizar ações, como já fizemos em Porto Alegre contra alguns sindicatos. Aliás, na Capital, das duas ações ajuizadas, uma já transitou em julgado e outra está em grau de sentença.

ConJur – A Justiça do Trabalho é sui generis, porque vê o trabalhador como hipossuficiente, que necessita de uma proteção especial do estado. Esta particularidade tende a se acirrar, para evitar que ele tenha seus direitos lesados ou agravados, como no caso dos honorários?
Rogério Fleischmann — A Justiça do Trabalho é vocacionada, historicamente, à proteção do hipossuficiente, do trabalhador. Não quer dizer que ele vá sempre ganhar a ação. Mas é uma Justiça que tem toda uma orientação, inclusive com previsões legais. Não é invenção do juiz trabalhista. A legislação trabalhista é protetiva. Causa espanto ver que, dentro do Judiciário trabalhista, que é direcionado a proteger o trabalhador, esteja acontecendo uma lesão evidente de um trabalhador pobre. A Justiça, que é para proteger o trabalhador, não está protegendo o trabalhador pobre — o que é uma contradição imensa. Por isso, é bem-vinda a atuação dos juízes que estão sendo bem firmes e rigorosos neste posicionamento: “não, o trabalhador pobre, na Justiça do Trabalho, vai ser tratado como trabalhador pobre, deixando de pagar aquelas verbas que são próprias para quem tem condições de arcar com as suas despesas’’.

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