Conforto no trabalho

Empresa terá de indenizar por condições de alojamento

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22 de março de 2012, 16h51

Sujeitar um trabalhador a dormir no chão, em locais desprovidos de vaso sanitário, sem abrigo para o preparo de alimentos e sem qualquer condição de higiene é expô-lo à situação degradante. Sob este entendimento, a 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul confirmou sentença que mandou indenizar em R$ 15 mil um operário que teve péssimas condições de alojamento nos dois anos em que manteve contrato com empresa de instalação elétrica. Conforme o juízo de origem, o empregador violou as disposições da Norma Regulamentadora 24, do Ministério do Trabalho em Emprego (MTE), que estabelece as condições sanitárias e de conforto nos alojamentos.

O relator do processo no TRT gaúcho, juiz convocado Marcelo Gonçalves de Oliveira, reconheceu que o trabalhador era obrigado a permanecer por longos períodos sem as mínimas condições de habitabilidade, em clara afronta ao inciso III do artigo 5º da Constituição Federal. Segundo o dispositivo, "ninguém será submetido a tratamento degradante". O juiz também negou a apelação do empregador para reduzir o quantum indenizatório.

O dano moral foi pedido no bojo de uma reclamatória trabalhista ajuizada na Comarca de Palmeira das Missões, município distante 368 km de Porto Alegre. O autor trabalhou por dois anos e meio (julho de 2008 a dezembro de 2010) para uma empresa de instalação elétrica — primeiro, como servente e, após, como auxiliar.

Ele decidiu buscar seus direitos na Justiça quando, ao ser demitido, o empregador pagou a quitação com base nos rendimentos de servente — e não de auxiliar. A reclamatória incluiu pedidos como: horas extras, repouso remunerado, intervalos intrajornadas, acumulação de funções, horas de sobreaviso e dano moral, pelas péssimas condições de higiene e habitabilidade no trabalho.

No aspecto, a demanda foi considerada procedente pelo juiz do trabalho Maurício Marca, que citou vários dispositivos da Norma Regulamentadora 24 e os depoimentos apresentados nos autos. Segundo uma das testemunhas, quando em viagem, os trabalhadores se instalavam em quadras de esporte, ginásios ou igrejas: "Às vezes, não havia camas; às vezes, tinha banheiro, outras, não. (…); em uma oportunidade, o alojamento não tinha nem água, nem luz".

"O grau de culpa da reclamada é grave e se caracteriza pelo total descaso com as condições sanitárias e de conforto dos alojamentos e por ocasião das refeições", anotou o juiz na sentença. Considerando o porte da empresa — capital social de R$ 1 milhão —e as finalidades do reparo moral, o juiz arbitrou o quantum em R$ 15 mil. A decisão se deu com base nas disposições do artigo 186, do Código Civil, e 5º, incisos V e X, da Constituição Federal.

O empregador recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho, pedindo a reforma da sentença. Na questão do reparo moral, argumentou que o trabalhador não especifica o fato gerador do dano, o que é exigido pelo artigo 186 do Código Civil. Disse que o valor arbitrado afronta a razoabilidade e se afigura desproporcional à gravidade da suposta lesão. Por fim, alegou que uma testemunha confirmou que os alojamentos em que o trabalhador pernoitava, durante as obras distantes da sede de seu trabalho, atendiam as condições sanitárias exigidas pela Norma Regulamentadora 24.

O relator da apelação, juiz convocado Marcelo Gonçalves de Oliveira, confirmou a decisão do juízo de origem, mantendo o valor indenizatório. Para ele, a atitude do empregador não violou apenas a norma do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), mas uma série de dispositivos legais e convenções internacionais. 

O juiz lembrou a Convenção 120 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 24 de março de 1969, que determina que o empregador tem o dever de "tomar providências para que todos os locais de trabalho sejam instalados e mantidos de modo a não produzir efeitos nocivos sobre a saúde dos trabalhadores, que devem ser protegidos contra substâncias e procedimentos incômodos, insalubres, tóxicos ou nocivos por qualquer razão" .

Marcelo Gonçalves de Oliveira afirmou, ainda, que a exploração de atividade econômica remunerada atrai a obrigação de prover habitações, ainda que provisórias, cobertas, limpas e providas de sanitário e local adequado para o preparo e a realização de refeições. "Diante da dificuldade de acesso, deveria a reclamada [empresa] ter procedido na contratação de serviços especializados em sanitários móveis e diligenciado para que houvesse abrigo limpo e arejado para o pernoite dos trabalhadores."

No seu entendimento, a situação narrada nos autos demonstra que os empregados da empresa eram alojados onde houvesse disponibilidade pelo menor custo — ginásios, igrejas, Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) —, sem qualquer preocupação com sua segurança, conforto e condição sanitária. "É repulsiva a afirmação de que ‘cada qual levava o seu colchão’ e de que a cozinha era lavada pelos trabalhadores, pois demonstra total descaso com as condições em que se daria o acampamento nas obras realizadas em localidades distantes da sede da empresa", encerrou o juiz.

Comungaram do mesmo entendimento do relator, à unanimidade, o também juiz convocado João Batista de Matos Danda e a desembargadora Maria da Graça Ribeiro Centeno. 

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Aqui para ler o acórdão.
E aqui para ler a Norma Regulamentadora 24 do MTE

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