Primeiros passos

Canadenses dão dicas sobre processo eletrônico

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20 de março de 2012, 18h28

Aplicada apropriadamente, a tecnologia vai reduzir o tempo de um processo judicial em 75%. Também vai reduzir o tempo e o volume de trabalho, bem como os custos, do Judiciário, da promotoria e da advocacia e, consequentemente, os custos das partes. Em resumo, esses são alguns dos argumentos que alguns juízes canadenses estão usando para convencer o governo do país a investir na adoção do processo eletrônico. Mas, para isso, "o Judiciário precisa da ajuda dos advogados", declarou o juiz do Tribunal Superior de Ontário, Arthur Gans. 

"Os advogados precisam fazer pressão, porque muitos dos meus colegas ainda estão relutantes ou não apreciam totalmente os benefícios do processo eletrônico em um julgamento e porque o Ministério da Advocacia Geral ainda não se engajou nessa causa", ele disse, segundo artigo publicado no jornal da Ordem dos Advogados do Canadá (Canadian Bar Association). Por isso, o Canadá está ficando para trás de outros países, embora já haja alguns experimentos, em alguns tribunais. E alguns bons estudos: pesquisadores do Laboratório da Ciberjustiça (Laboratoire sur la Cyberjustice) da Universidade de Montreal estão desenvolvendo um software que permite às partes negociar pela Internet, em casos em andamento nos tribunais de pequenas causas. 

O juiz citou um caso em que uma teleconferência com uma testemunha que estava em São Francisco, na Califórnia, resultou em economia de 5 mil dólares canadenses. Às vezes, a resistência também vem de advogados, esclareceu o juiz. Em um caso, uma testemunha teve de atravessar o país para servir em um julgamento, porque o advogado não abriu mão de sua presença, em carne e osso, no tribunal. No final das contas, a testemunha foi dispensada. Depois do voo de volta, surgiram novos fatos que exigiram o depoimento da mesma testemunha. Dessa vez, o advogado concordou com a realização de uma teleconferência. E depois se convenceu de que isso poderia ter sido feito desde o início. 

De acordo com o artigo da CBA, fica mais fácil para advogados e promotores trazer especialistas para o banco das testemunhas, quando os depoimentos e inquirições podem ser feitos por teleconferência. Muitas vezes, eles não querem se afastar do trabalho, por diversas razões, para comparecer a um julgamento em outras cidades, especialmente as distantes. Segundo o artigo, muitos custos jurídicos podem ser cortados, com o uso de meios eletrônicos. Se há necessidade de juramento, uma questão é se ele poderia ser feito, junto com a teleconferência, em um tribunal local. 

Modelo nacional
O Brasil parece estar à frente. Na Região Sul, por exemplo, a Justiça Federal já vive as facilidades do processo eletrônico, como mostrou reportagem publicada pela ConJur. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede em Porto Alegre, oferece um leque de opções de trabalho remoto, como sustentações orais e julgamentos não presenciais. Advogados e procuradores, por exemplo, não precisam mais ir até a sede do tribunal para participar das sessões. Todas as salas de audiências possuem telas onde os desembargadores assistem a transmissões feitas das seções judiciárias nos municípios onde há Justiça Federal, às quais os representantes comparecem para subir à tribuna. Os desembargadores também usam a tecnologia quando não podem estar na sala de julgamentos, e julgam à distância. Todos receberam, no início do mês, tablets para acessar os processos de casa. 

O peticionamento e o protocolo de peças funcionam de forma diferente do modelo ainda vigente nas demais cortes do país. Enquanto em tribunais dos mais modernos, como o Superior Tribunal de Justiça, os documentos são divididos em volumes, que mesmo digitais seguem a lógica do processo físico, no TRF-4 todo o processo é visualizado como uma só peça. Petições e decisões são registrados em eventos. Além disso, por meio de assinatura digital, é possível aos advogados e procuradores protocolar documentos digitalizados a distância, online.

Recentemente, os grandes escritórios de advocacia ganharam uma ferramenta própria. Desde o dia 5 de março, o e-Proc, como é chamado o sistema de processo eletrônico, criou o escritório virtual destinado a bancas com grande volume de processos na corte.

As facilidades têm mudado a rotina nos escritórios. Como o protocolo de documentos e a vista de processos não dependem mais do deslocamento até as varas, o número de estagiários tem caído. Já há escritórios médios que trabalham sem nenhum. Até o recebimento de honorários está sendo afetado. Com a velocidade das decisões — há processos em que elas saem em menos de um mês —, o acerto comum de receber metade do valor no início da ação e outra metade no fim pode pesar no caixa mensal dos clientes.

A tecnologia do tribunal está sendo exportada para outras cortes. Além do e-Proc, para processos virtuais, o TRF-4 também é responsável pela criação do GedPro, sistema interno para acompanhamento de processos e votos de magistrados, o SMWeb, para mandados como de intimação, citação e prisão — a ideia é acabar com as cartas precatórias entre varas — e o SEI!, sistema voltado para o andamento de processos administrativos. Os quatro sistemas foram desenvolvidos por uma equipe do próprio TRF-4 e alguns são usados em tribunais de São Paulo, do Tocantins e até mesmo na Suprema Corte do Panamá.

Dicas úteis
Mas, no Brasil, como no Canadá e em todos os países, a maioria dos operadores do Direito ainda são iniciantes em processo eletrônico. Por isso, o advogado Grahan Underwood, um dos autores do livro "Prova Eletrônica no Canadá", procura ajudar os colegas que mal ingressaram na era virtual. Veja algumas dicas:

– Defina com clareza em que a tecnologia pode ajudar. Pense no que você tem de provar e, então, considere no que a tecnologia pode lhe ajudar a atingir seus objetivos, não o contrário. Não deixe a tecnologia virar uma muleta, sem a qual você não pode mais andar. Só use a tecnologia em função dos resultados que pode trazer para o processo. Não perca os fatos de vista, só por causa da tecnologia, porque seus argumentos devem ser, antes de tudo, convincentes; 

– Faça um planejamento. Discuta suas opções tecnológicas com as outras partes. Um advogado de defesa pode definir com o advogado de acusação ou promotor as tecnologias que serão usadas em um julgamento. O juiz e outros servidores do tribunal devem participar do processo: todos devem saber, com antecedência, o que vai acontecer;

– A prática faz a perfeição. Não espere até que o julgamento comece, para usar a tecnologia a sua disposição. Pratique com antecedência, para ter certeza do que vai acontecer e ser eficientes no tribunal. Se possível, pratique na própria sala de julgamento, antes de seu início; 

– Suporte técnico vem a calhar. Mesmo que todas as partes sejam versadas na tecnologia a ser empregada, é melhor ter suporte técnico à mão. O uso da tecnologia pode ser uma distração, durante o julgamento. Assim, é melhor que outra pessoa cuide dos aspectos técnicos, para que você se foque em seus argumentos; 

– O Powerpoint ajuda muito. Em uma apresentação feita no Powerpoint, se mostra muito menos para obter muito mais resultados. Use-o com moderação e sua apresentação será muito mais eficaz. Só leia o que todos podem ler em seus slides; 

– Faça uma apresentação convincente. Reúna todas suas provas em uma apresentação: documentos, fotos, vídeos, gráficos e textos. Um advogado pode usar um mapa, expandido em uma tela, para indicar onde estava a vítima, o réu, a testemunha 1, a testemunha 2, a casa no campo, a estrada de acesso… seja criativo; 

– Faça back-ups de tudo. A menos que você queira passar por uma experiência devastadora, dessas de arrancar cabelos, faça cópia de todos os seus dados em discos rígidos externos. Provavelmente, seja mais conveniente fazer back-ups através de computação em nuvem; 

– O uso de projetores e telas é a melhor opção. Uma tela que pode ser vista por todos, em vez de monitores individuais de muitos computadores, torna a comunicação mais expressiva. Nesse caso, é melhor levar um objeto para apontar detalhes do slide, em vez de usar o dedo; 

– Dois mouses podem ajudar, às vezes. Antes de iniciar a discussão de uma planilha com uma testemunha, um advogado decidiu ligar dois mouses no computador. Assim, ele e a testemunha puderam controlar a tela e o que era mostrado na planilha, de acordo com as necessidades; 

– Use um perito forense, sempre que necessário. Ele pode ajudar, por exemplo, a decifrar as provas de um computador confiscado, exatamente como elas se apresentavam quando a máquina foi levada pela polícia, usando uma tecnologia chamada "máquina virtual";

 – Não entre em pânico. Se alguma coisa sair errada, se você ser perder no meio dos emaranhados tecnológicos, avance para outra parte, até que o problema seja resolvido. Problemas semelhantes ocorrem, quando não se usa tecnologia alguma, mas sempre há uma forma de contorná-los.

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