Acidentes de trabalho

Justiça do Trabalho deve divulgar cultura de prevenção

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14 de março de 2012, 11h19

O início da segunda década do Século XXI revela no Brasil um quadro de irônica e lamentável contradição: os promissores indicadores econômicos – com a constatação de que somos a sexta economia do planeta – e os profundos problemas sociais. É inegável o crescimento da economia, a ascendente produção e o aumento do consumo, fatores que acarretam a geração de novos empregos. Entretanto as estatísticas mais recentes apontam que cerca de sete trabalhadores morrem por dia no país, vitimados por acidentes de trabalho.

Atento a essa realidade, o Tribunal Superior do Trabalho e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), em ação conjunta, lançaram no ano de 2011 o Programa Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho, que conta com a parceria de entidades públicas e privadas, com vistas à “formulação e execução de programas e ações nacionais voltadas à prevenção de acidentes de trabalho e ao fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho”

O principal objetivo do programa é “reverter o cenário de crescimento do número de acidentes de trabalho presenciado no Brasil nos últimos anos”. É o novo e necessário olhar da Justiça do Trabalho sobre um tema que, tristemente, comparece nas ações processadas e julgadas nesta esfera, com maior expressão desde quando foi consolidada a competência material com o advento da Emenda Constitucional 45/2004.

Os conflitos normalmente chegam à Justiça quando não é mais possível reverter o quadro fático, pois o trabalhador já teve ceifada sua vida, sua saúde, sua capacidade laborativa ou sua integridade física, psicológica e moral nas ações indenizatórias.

Mesmo que haja a condenação pecuniária indenizatória, essa não restitui o bem jurídico maior que foi cruel e irreversivelmente subtraído. Não raro esses valores deixam de ser pagos, o que se constitui em dupla penalização ao trabalhador. Só restam os danos e prejuízos de toda ordem, causados e não reparados ao cidadão trabalhador.

E o sofrimento não é exclusividade do trabalhador e dos que com ele convivem. Onera o Estado, que normalmente arcará com benefícios previdenciários muitas vezes até o final da vida daquele indivíduo, ou o sistema de saúde pública, abarrotado com filas intercaladas de doentes e acidentados. Assoberba o Judiciário com amontoados de ações reparatórias. Abala o empresário economicamente, não somente com as despesas para tratamento ou, quem sabe, de sepultamento, com as reparações pecuniárias em prol da vítima ou seus sucessores. Mais ainda com a desagregação do ambiente de produção, a substituição do acidentado por um outro empregado destreinado, com risco de repetição do evento danoso, o prejuízo material no próprio ambiente laborativo, seja por danos físicos ao patrimônio da empresa, seja por danos a sua imagem.

Há também os reflexos indiretos do desequilíbrio experimentado pelo conjunto de elementos que dependem do empreendimento: os demais empregados, fornecedores, clientes, um município ou uma região econômica inteira dependendo da relevância daquela atividade, reproduzindo o impacto indesejado na sociedade.

Tais circunstâncias vêm sendo hodiernamente refletidas, debatidas e combatidas. É o pensamento contemporâneo de responsabilidade social, reafirmando ideais de cidadania e justiça, momento em que se percebe que as mazelas sociais são reflexos das ações ou omissões de todos. Em sintonia com essa realidade, o juiz do Trabalho deve buscar sempre o indispensável e cotidiano exercício do seu relevante papel de agente de transformação social, incrementando ações não apenas repressivas e reparadoras dos danos causados pelos acidentes do trabalho, mas principalmente com medidas preventivas deles.

A expectativa é de que o juiz, com seu conhecimento e experiência, contribua para a formação e disseminação de uma cultura prevencionista, auxiliando no rompimento de conceitos ultrapassados de eficiência, do ponto de vista socioeconômico, estimulando uma gestão voltada à preocupação com homens e mulheres, não apenas como mera força de trabalho, mas como destinatários da cidadania.

A estratégia é aproximar o magistrado do cidadão, levando-o aos ambientes físicos laborais, para que ouça e fale com o trabalhador e com o empresário. Seja para conhecer as experiências bem sucedidas em matéria de segurança e saúde no trabalho, quiçá apoiar o aperfeiçoamento ou a elaboração de novas medidas, seja para levá-las até aqueles ambientes que ainda não avançaram neste campo.

Essencial ainda o contato com sindicatos, órgãos de fiscalização e autoridades que manejam o assunto, para que o juiz possa compartilhar vivências, conhecimento e ações, incentivando e colaborando com a instituição de políticas públicas e programas de educação, conscientização, informação. Importante também que o juiz se faça presente nas escolas em todos os níveis, contribuindo para a formação e educação de crianças, jovens e adultos, futuros trabalhadores, empresários e autoridades.

A troca é válida oportunidade de aprender e ensinar, incrementando a percepção do magistrado para o momento de julgar, aliado ao ganho social com a movimentação de boas práticas na área de prevenção e o resultado final de diminuição de demandas.

É a era do empreendedorismo social. A Justiça do Trabalho deu os primeiros passos, ao concentrar esforços na busca de uma solução compartilhada e criativa para o problema ambiental do trabalho. Já se lançou à procura das causas, fixando diretrizes, impulsionando as primeiras ações. Com planejamento, continuidade, acompanhamento, metas e organização, poderá consolidar-se como uma forte influência para uma mudança comportamental no processo produtivo.

Chegará o tempo em que a solidariedade, o respeito mútuo e o envolvimento de todos tornará possível a aproximação ao ideal de uma sociedade mais justa, equilibrada, sustentável, reafirmando os fundamentos constitucionais pétreos de cidadania, da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

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