Eleições na advocacia

Marcos da Costa promete discrição à frente da OAB-SP

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7 de março de 2012, 18h26

Spacca
Atual vice-presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcos da Costa participou das três últimas gestões de Luiz Flávio Borges D’Urso, que se afasta da presidência para concorrer à prefeitura de São Paulo. Além de vice-presidente, o advogado ocupou o cargo de diretor-tesoureiro da entidade e a presidência da Comissão Especial de Assuntos do Judiciário e foi responsável pela implantação do ISO na OAB-SP.

Ele é descrito pelos amigos como o “carregador do piano” da gestão. De perfil técnico, Marcos da Costa se apresenta como um administrador que já visitou todas as subseções da Seccional pelo menos uma vez. Ele teria sido presenteado no último encontro de dirigentes com uma lista onde 210 dos 224 presidentes de subseções hipotecaram apoio à sua candidatura. Mas, como candidato situacionista, Marcos não se anima a antecipar o debate eleitoral, alegando que é “muito cedo”.

Eleições à parte, também é difícil tirar posicionamentos definitivos do candidato, que parece sempre favorável ao debate. Sobre a atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), assunto que estampou as capas dos jornais de todo o país, o advogado faz distinção entre casos envolvendo juízes de primeira instância e desembargadores. Para Costa, o CNJ deveria ter papel subsidiário às corregedorias regionais no que diz respeito à investigação de juízes de primeira instância, mas, em relação à segunda instância e aos tribunais superiores, o poder do órgão deve ser concorrente. Ele afirma que tal posicionamento vem se firmando no CNJ desde 2004, apesar de decisões do Supremo Tribunal Federal firmadas no início desse ano não fazerem tal distinção.

A marcha puxada pela OAB nacional para contestar a decisão liminar do ministro Marco Aurélio, que havia decidido pela subsidiariedade do Conselho foi vista com bons olhos pelo pré-candidato. Para ele, a manifestação não foi para contestar a decisão judicial, mas para promover um debate. “A Ordem se posiciona de uma forma e está fazendo movimento para essa posição ganhar corpo perante a sociedade.” A posição sustentada pela entidade foi combatida por associações de magistrados, criando conflitos públicos entre juízes e advogados. Na visão de Costa, os conflitos entre as classes diziam respeito apenas à defesa de posições e não deveria ser encarado como uma briga, mesma opinião de D’Urso, atual presidente da OAB-SP.

Ainda sobre decisões do STF, ao comentar a Lei da Ficha Limpa, julgada constitucional pelo tribunal, o pré-candidato diz que, apesar de ter uma opinião favorável ao controle social sobre candidatos, não acha que a lei respeita a presunção de inocência prevista na Constituição Federal. “Há um choque entre o interesse social, para que aquele que se candidata tenha condições morais de se candidatar, com o interesse individual, daquele que tem o interesse e o direito de ser votado”, explica o advogado. Só o trânsito em julgado poderia dar a certeza de que um possível candidato “não reúne condições de idoneidade”, diz Costa, para quem a “trava de segurança” da ficha limpa deveria ser o encerramento do processo.

A defesa da cidadania e do direito de defesa, que fica explícita nesse posicionamento do advogado, está interligada ao que ele diz considerar o principal papel da OAB: “A defesa da advocacia e, assim, a defesa da cidadania.” A missão corporativa, diz ele, deve estar abaixo da “missão institucional” da entidade. “A grande bandeira” da OAB, no entanto, é a defesa das prerrogativas profissionais do advogado, segundo Costa, que cita inclusive o “projeto de lei que tramita no Congresso Nacional, idealizado pelo presidente D’Urso, que criminaliza a violação das prerrogativas”.

Marcos da Costa cita realizações da gestão de D’Urso e coloca o presidente como um dos três maiores ídolos no Direito. Além do presidente da OAB-SP, que é tido como “referência ética do comportamento de dirigente da Ordem”, Costa diz ser grande admirador de Ives Gandra Martins, pela expressão jurídica e social alcançada pelo advogado. Outro ídolo é o advogado e professor Rui Barbosa Nogueira, em cujo escritório Costa trabalhou como office-boy, até ser convencido pelo advogado a cursar Direito, passando a ser o primeiro da família a ter formação universitária.

O pré-candidato elenca problemas nos tribunais paulistas, como falta de acessibilidade, condições precárias de segurança e falta de manutenção dos ambientes “muitas vezes insalubres”. Mesmo enfrentando tais dificuldades para trabalhar, o mercado de trabalho oferece boas oportunidades, na visão de Costa. Ele vê o aumento do acesso à Justiça com bons olhos, trazendo o crescimento da demanda por advogados cada vez mais especializados.

Leia a entrevista:

ConJur — Vamos falar de eleição?
Marcos da Costa
— O processo eleitoral tem um momento certo para ser disparado, visando preservar a própria administração da entidade para que os debates importantes para a gestão não sejam contaminados por questões eleitorais.

ConJur — E a ideia é começar quando?
Marcos da Costa —
Entendo que o segundo semestre seria o momento ideal para que os candidatos coloquem suas propostas para a classe e debatam suas ideias.

ConJur — Qual á o principal papel da OAB, na sua visão?
Marcos da Costa —
É a defesa e a valorização da advocacia. Certamente, isso está interligado à defesa da cidadania. Não se pode, porém, desconsiderar bandeiras históricas que a entidade tem e conquistas que ela teve em relação à sociedade, até em função do próprio Estatuto da Advocacia, que coloca a missão institucional dela acima da corporativa.

ConJur — E quais são as bandeiras essenciais para a OAB hoje?
Marcos da Costa —
Continua sendo uma grande bandeira a prerrogativa profissional. A preocupação da entidade de que sejam preservadas as prerrogativas, com o esclarecimento de que preservar prerrogativa é respeitar o Estado Democrático de Direito, preservar prerrogativa não é exercer só direito de defesa. Essa é a grande bandeira. Nós temos projetos, inclusive no Congresso Nacional, que foi idealizado pelo presidente D’Urso, que criminaliza a violação das prerrogativas nacionais. E essa é sempre a bandeira maior da OAB.

ConJur — A defesa dos interesses do advogado entra nisso ou é uma bandeira à parte?
Marcos da Costa —
Essa é uma bandeira que ganha contornos próprios pela importância dela. Temos frentes relevantes para a profissão, que vão desde as condições de trabalho nos fóruns e outros prédios públicos, até a estrutura da Justiça e melhoria da prestação jurisdicional, e questões do dia a dia do advogado. Há a preocupação, por exemplo, com convênios que permitam a ele acesso a equipamentos de informática mais baratos, principalmente ao advogado que está iniciando a carreira.

ConJur — Nesses convênios, como seria a questão do acesso?
Marcos da Costa —
A OAB-SP tem um braço assistencial, a Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (Caasp), hoje presidida pelo advogado Fábio Romeu Canton Filho, um grande dirigente, que tem buscado promover diversas parcerias para facilitar o acesso por parte do advogado. São parcerias que garantem, por exemplo, cursos de idiomas mais baratos, cursos de teatro para desinibição daquele advogado que tem dificuldade maior em termos de expressão. Temos também parcerias com outras empresas, como fornecedoras de equipamentos de informática, que propiciam facilidade de crédito, preço mais em conta e condições mais fáceis de pagamento.

ConJur — Qual sua opinião sobre o clamor público para o aumento dos poderes do CNJ, do Coaf, do Fisco, do Ministério Público e da Polícia Federal?
Marcos da Costa —
São órgãos com missões diferentes. O CNJ faz parte da estrutura do Poder Judiciário e é composto por representantes da magistratura, mas também por representantes do Ministério Público, da advocacia e da sociedade, tendo a função institucional importantíssima de fiscalizar. O órgão foi criado e idealizado dentro da OAB, que lutava havia muito tempo pela criação de uma estrutura que pudesse suprir necessidades de fiscalização no Poder Judiciário. Os outros órgãos, que não têm esse foco do Judiciário, mas de fiscalização, como Receita Federal e Coaf, têm papeis importantes também, mas que, até por força de uma legislação própria, têm regras de atuações distintas, que não precisam ser ampliadas. Já o Ministério Público conseguiu ampliar seu poder de investigação criminal, o que conflita com a Constituição Federal, uma vez que essa competência seria da Polícia Judiciária.

ConJur — E sobre a questão de quebra de sigilo por esses órgãos?
Marcos da Costa —
No que diz respeito a essas entidades como Coaf e Receita Federal, há o dever de sigilo profissional. No Ministério Público, esse sigilo passa também por um controle. Há uma posição na entidade no sentido de que o Ministério Público não tem poder de investigação por força da própria Constituição. Há órgãos no Estado para que isso ocorra, como a própria Receita Federal. No caso do CNJ, o sigilo impera no que diz respeito ao nome, a informações críticas em relação a determinado magistrado, mas esse sigilo não deve limitar a transparência da atuação do CNJ como um todo. Então, por exemplo, informações de natureza pessoal, que dizem respeito à privacidade do magistrado, devem ser preservadas. Já as informações que dizem respeito à atuação dele como agente público precisam ter total transparência.

ConJur — Na sua opinião, o CNJ é concorrente ou subsidiário às corregedorias regionais?
Marcos da Costa —
O CNJ foi criado com a ideia de que se fosse um órgão de fiscalização do Poder Judiciário inteiro. As decisões que o CNJ vem adotando desde a sua criação é no sentido de que, no que diz respeito à primeira instância, o papel inicial é do corregedor e da corregedoria do Tribunal de Justiça. O CNJ, então, fiscaliza se a corregedoria vem cumprindo ou não a sua função. Em relação à segunda instância e aos Tribunais Superiores, isso não se aplica, porque, tradicionalmente, não têm corregedoria. Eles não têm instrumentos de controle da atividade de seus próprios pares. E aí o CNJ vem para ocupar esse espaço, agindo como uma Corregedoria Nacional dos tribunais de segunda e de última instância. A limitação dos poderes, nesse caso, me parece absolutamente equivocada e tira do CNJ um papel muito relevante.

ConJur — Sobre essa questão do CNJ, houve muito conflito entre associações de juízes e a OAB. Qual é a sua opinião a respeito disso?
Marcos da Costa —
Não entendo que houve briga, mas um salutar debate sobre a atuação do CNJ. São posições muitas vezes antagônicas, visões diferentes sobre o mesmo problema. Isso tende agora a se acomodar à medida que o Supremo já se manifestou sobre a matéria e o Conselho Nacional de Justiça saiu fortalecido para fazer o controle externo do Judiciário e fixar metas futuras.

ConJur — O senhor é favorável à Lei da Ficha Limpa?
Marcos da Costa —
Eu sou amplamente favorável ao controle social por parte daqueles que concorram a um cargo de Legislativo. Há de se ter cautela no que diz respeito à presunção de inocência, para que não haja um apressamento de punição, porque será vedado um exercício de cidadania, que é se colocar à disposição para ser votado pela população. Há de se encontrar um ponto de equilíbrio. A Lei da Ficha Limpa reclama a ponderação em segunda instância, buscando que haja pelo menos uma segunda condenação, ou uma segunda manifestação do próprio Judiciário em relação aquele candidato. Ela não pede o trânsito em julgado.

ConJur — Esse ponto é um bom ponto de equilíbrio?
Marcos da Costa — A minha opinião pessoal é que o trânsito em julgado seria conveniente. Porque aí haveria certeza, segurança absoluta de que aquele que está sendo impedido de se candidatar efetivamente não reúne condições de idoneidade para tal.

ConJur — Em termos de mercado de trabalho, o advogado está protegido? Há alguma ameaça à atuação dele na Justiça paulista hoje em dia?
Marcos da Costa —
Considerando-se a atuação do advogado com base nas normas processuais, instrumentos que ele tem para atuar profissionalmente, assegurando-se que a atuação do advogado se dará com paridade de armas, acredito que há instrumentos para garantir esse exercício profissional. Se a questão diz respeito ao relacionamento do advogado, no embate diário com a estrutura do Poder Judiciário, acho que ainda não há a devida proteção a esse exercício profissional, sem que haja a aprovação do projeto de lei para criminalizar a violação das prerrogativas profissionais. Ainda falta um instrumento que propicie aos advogados proteção legal no embate diário com essas autoridades. E, por fim, no que diz respeito à estrutura que o Poder Judiciário tem como um todo para que esse profissional possa trabalhar, a estrutura em São Paulo é extremamente deficitária. Muitos fóruns estão em péssimas condições, faltam juízes e servidores, além de infraestrutura deficiente. A OAB-SP tem proposto, desde o início da gestão do presidente D’Urso, melhorias gerais para o quadro do Poder Judiciário.

ConJur — Quanto a essa estrutura deficitária em relação a fóruns, servidores e juízes, o senhor poderia explicar melhor o que falta para o advogado?
Marcos da Costa —
Por exemplo, um advogado que tem deficiência física e não consegue ingressar no Fórum porque há uma escadaria. Como ocorre no Fórum da Lapa, onde um cadeirante não consegue entrar na sala de audiência. Ou até um ambiente muitas vezes insalubre, com condições extremamente precárias, inclusive em termos de segurança. Há fóruns precisando de reforma pelo Estado inteiro. Isso causa um desconforto ao exercício profissional.

ConJur — Como está o mercado de trabalho para o advogado?
Marcos da Costa —
Tem havido uma modificação grande no mercado de trabalho nas últimas décadas. O mercado da advocacia tem se expandido. Novos ramos do Direito surgiram, sem prejuízo dos ramos tradicionais, mas que também têm reclamado da parte do advogado, como um todo, um nível maior de especialização. Cada vez mais me parece que o mercado reclamará do advogado uma atuação mais focada em determinada área. O advogado tem de estudar mais, se especializar. Por conta da expansão dos negócios no Brasil, das oportunidades que trarão a exploração do pré-sal, a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Certamente, abrirão muitas possibilidades no mercado de trabalho advocatício.

ConJur — Fala-se do aumento do acesso à Justiça como um dos motivos que levou os tribunais a estarem superlotados de processos. Isso é positivo ou banaliza a profissão?
Marcos da Costa —
O problema não está na ampliação do acesso à Justiça. Nós tivemos desde a Constituição de 1988 uma grande reforma na legislação brasileira: a chegada de novos códigos, a reforma de códigos tradicionais, Estatuto do Idoso, Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Defesa do Consumidor. Enfim, uma modificação muito grande no quadro jurídico do país, em sua base legislativa. Paralelamente, tivemos uma ampliação dos instrumentos de acesso à Justiça. aqui em São Paulo, o acesso à Justiça para o cidadão carente dá-se por força dos 50 mil profissionais que atuam no convênio do Judiciário. A OAB-SP tem 313 pontos de acesso ao carente espalhados pelo estado. De um lado, temos uma melhoria, uma ampliação dos direitos do cidadão; do outro lado, a facilidade do acesso à Justiça. Isso é extremamente positivo. Mostra que o país caminha para uma democracia plena, quando as pessoas levam ao Poder Judiciário os seus dilemas, as suas angústias, e buscam ali a paz social. Agora, qual é o problema disso? É que o Judiciário não teve a sua estrutura adaptada, adequada, ampliada, para atender a essa demanda. O problema não está na demanda, mas sim na oferta do serviço Judiciário. E nós vimos exatamente o oposto. Ao longo dos anos, o próprio orçamento do Judiciário foi caindo sensivelmente, com sua participação no orçamento do estado. Este é o grande problema: o Judiciário não ter se estruturado como gestor da Justiça. E também a falta de um apoio maior dos outros poderes no sentido de que a estrutura acompanhasse o crescimento dessa demanda.

ConJur — O quinto constitucional da advocacia deve ser revisto?
Marcos da Costa —
O quinto constitucional é um instrumento importantíssimo na estrutura e na definição dos membros do Judiciário. É um instrumento de democratização, e hoje faço uma defesa do quinto constitucional, por compreender sua importância em oxigenar a Justiça. Em outros países, o magistrado pode ser escolhido por uma votação. No Brasil, contudo, a forma de a sociedade participar do Poder Judiciário é via quinto constitucional. Como qualquer instrumento jurídico, ele sempre é passível de discussão, de melhorias, de ponderações. Qualquer instrumento jurídico está sujeito a um debate constante, que eventualmente possa trazer melhorias. Mas o quinto, na estrutura jurídica do Poder Judiciário hoje no Brasil, é fundamental, porque traz a visão do advogado para a magistratura, ampliando a perspectiva.

ConJur — A OAB deve restringir a atuação da Defensoria Pública para reserva de mercado?
Marcos da Costa —
Primeiro não é a OAB que restringe, mas a Constituição Federal e a Constituição do Estado. Restringe a quê? À obrigação do estado de prestar assistência judiciária ao cidadão carente. E aí não é restrição. A Defensoria é um instrumento de que o Estado dispõe para prestar esse serviço, para que essa obrigação seja cumprida. O que há é uma restrição por parte da Constituição, segundo a qual o Estado é obrigado a prestar esse serviço apenas para o cidadão carente. E, no estado de São Paulo, a Defensoria é um dos instrumentos. O outro é o Convênio de Assistência Judiciária.

ConJur — E esse instrumento do Estado tem sido usado com a finalidade para a qual é devido ou ele tem extrapolado a sua finalidade?
Marcos da Costa —
Há um controle que é feito pela Defensoria e pela OAB-SP. Quando o carente procura a Ordem ou a Defensoria são observados alguns parâmetros, como a remuneração familiar máxima de três salários mínimos. Do ponto de vista da OAB, ela cuida para que esse parâmetro não seja deixado de lado. Então, se alguém procura a OAB, nesses 313 pontos, sem ser carente, a OAB não faz o atendimento. E aí essa pessoa tem que procurar um advogado privado, e creio que a Defensoria também faça isso. A preocupação que tenho com a Defensoria não é propriamente de ela ultrapassar seus limites, porque há regras e ela precisa observá-las. O que me preocupa é que houve por parte da Lei Orgânica da Defensoria a concessão de alguns instrumentos para atuação de defensores que podem significar uma quebra de paridade de armas com relação ao exercício do direito de defesa. Foram dados instrumentos para a Defensoria Pública agir dentro do processo que podem levar à quebra do princípio da igualdade de armas. A Defensoria tem, por exemplo, o poder de requisitar documentos junto aos órgãos públicos. O advogado não tem esse poder. Como a Defensoria atende ao interesse privado de uma parte e o advogado atende ao interesse privado da outra parte, as armas têm que ser iguais. Se houver desequilíbrio dessas armas, o exercício do direito de defesa estará comprometido. Essa é uma preocupação que tenho.

ConJur — As formas extrajudiciais de solução de conflitos são interessantes para a OAB?
Marcos da Costa —
A conciliação, a arbitragem e a mediação são instrumentos já consagrados em outros países e devem ser empregadas em maior escala no Brasil. A advocacia pode orientar o jurisdicionado, sugerindo que no próprio contrato exista uma cláusula compromissória em relação à determinada forma de solução de conflitos previamente estabelecida. São instrumentos que a sociedade dispõe no mundo inteiro e que, no Brasil, por conta da morosidade e do déficit de estrutura do Poder Judiciário, ganha maior relevo. Entendo que o advogado deve se preparar, conhecer as estruturas de mediação e arbitragem para orientar e defender seu cliente. Defendo que seja obrigatória a presença do advogado em todas as formas alternativas de solução de conflito.

ConJur — Como o senhor vê a nomeação de advogados da União e da Fazenda Nacional ao STJ e ao STF?
Marcos da Costa —
O advogado público ou privado, na hora em que veste a toga, deve passar a agir como magistrado. Portanto, não deve atuar em defesa do interesse de qualquer das partes. A nomeação predominante de procuradores da Fazenda e da AGU para o Supremo e o STJ, por si só, não representa um selo de qualidade que justifique que esses profissionais tenham algum tipo de preferência. Não creio que haja preferência por isso. Nós temos grandes advogados na área privada e na área pública, que podem também exercer de maneira bastante adequada as missões de julgar o próximo nas cortes superiores. Havendo uma tendência de predominância nas nomeações de advogados públicos ligados à Fazenda, essa tendência passa a gerar preocupação. Primeiro, em relação à experiência profissional, à formação profissional que esse advogado público ao longo da sua trajetória profissional de vida está agregando. O Supremo tem que buscar, na sociedade, profissionais qualificados e com condições para enfrentar todas as questões que são encaminhadas para aquela Alta Corte. Então, uma prevalência de profissionais que atuam em um determinado segmento pode gerar uma deficiência no que diz respeito à somatória de experiências que todos os ministros devem levar para enfrentar questões de todas as naturezas.

ConJur — O advogado público deve receber honorários de sucumbência?
Marcos da Costa —
Deve receber os honorários de sucumbência tal qual o advogado privado também deve receber. Os honorários de sucumbência representam uma remuneração justa pelo empenho que aquele advogado teve na dedicação à defesa dos interesses do seu cliente, seja do Estado, seja do particular.

ConJur — O Exame de Ordem deve ser revisto?
Marcos da Costa —
O Exame de Ordem é um instrumento de proteção da sociedade, no sentido de exigir que o advogado que ingresse no mercado esteja tecnicamente preparado. A necessidade do Exame de Ordem está comprovada, tanto que vem sendo instituído por outras carreiras profissionais, como também em outros locais do mundo. Portugal, recentemente, criou seu exame de Ordem. Enquanto instituição é um instrumento importante que não deve acabar. Muito pelo contrário, um julgamento recente do STF, inclusive, por unanimidade, declarou constitucional o Exame de Ordem. Agora, como qualquer instituto, evidentemente sempre está sujeito a debates, discussões e a melhorias. Essas propostas de melhorias são sempre bem-vindas. O grau de dificuldade deve ser adequado diante do volume de bacharéis que nós temos e, infelizmente, diante dessa qualidade muito ruim de algumas faculdades de Direito. Muitos, infelizmente, não conseguem, no curso de graduação, ter uma base para atingir a qualificação técnica adequada para exercer a advocacia o que leva a uma reprovação no patamar médio de 80% dos candidatos.

ConJur — O senhor concorda com eleições diretas para o Conselho Federal?
Marcos da Costa —
Essa discussão é importante. A classe tem que debater os caminhos da representação que a entidade vai ter, da eleição de seus dirigentes. E esse debate já está colocado no Conselho Federal. Entendo que esse é o momento para o debate, de conhecer os argumentos que têm sido empregados para a eleição direta, e também analisando aqueles eventuais argumentos que venham a buscar outra forma de definição da representação. A discussão está se iniciando agora e tem que ser amadurecida. A classe deve buscar o caminho que melhor representará o advogado.

ConJur — Quem são seus maiores ídolos do Direito?
Marcos da Costa —
Tenho alguns. É difícil definir um. Entrei na advocacia pelas mãos de um grande professor, um grande advogado, que foi Rui Barbosa Nogueira, já falecido. Eu era office-boy no escritório dele. Na minha família, sou o primeiro que tem formação universitária. Meus irmãos não têm, meus pais não têm, meus avós não têm, tanto do lado do pai quanto do da mãe. E ele [Rui Barbosa Nogueira] me convenceu a fazer o curso de Direito, entendendo que eu tinha perfil para ser um advogado. Tenho um segundo nome, que, pela expressão jurídica e pela expressão social que ele conquistou também me serve de exemplo, o Ives Gandra Martins. Tenho por ele profundo respeito. Na época de estudante, li os artigos dele, e não imaginava que um dia pudesse vir a conhecê-lo pessoalmente. E, pela dimensão política também que ele alcançou, pelo meu relacionamento de tantos anos com ele, e pela referência ética do comportamento de dirigente da Ordem, o próprio presidente Luiz Flávio Borges D’Urso. Para mim, ele também é uma referência como líder classista e como advogado. Tenho outros, vim para a Ordem pelas mãos do Rubens Approbato Machado. O Criador colocou na minha frente grandes advogados, que me inspiram até hoje.

ConJur — Qual é o maior problema da Justiça brasileira?
Marcos da Costa —
Gestão.

ConJur — Quais são os problemas do processo digital?
Marcos da Costa —
Cultura. Nós não temos cultura. Antes que a própria sociedade use o instrumento digital nas suas relações, já estamos transportando a semente para dentro do processo. Falta ainda a cultura necessária para que todos, advogados, promotores, magistrados, todos estejamos tranquilos em relação a esse ambiente. Isso vai sendo conquistado a longo tempo, mas acho que ainda é o maior problema que nós enfrentamos.

ConJur — — Os Tribunais de Ética da Ordem funcionam como devem funcionar?
Marcos da Costa —
A OAB-SP descentralizou seus Tribunais de Ética e Disciplina, que foram interiorizados e têm dado uma contribuição enorme para a classe como um todo, servindo de parâmetro, procurando punir quem efetivamente não tem compromissos com a advocacia. E encarando esse desafio enorme, que é sua base de sustentação e um dos dois pilares da advocacia, que são as prerrogativas e a ética. Nos Tribunais de Ética, atuam centenas de advogados voluntários, que dedicam horas da sua vida a essa missão. Houve um aperfeiçoamento muito grande, inclusive com a informatização das atividades do tribunal, pela qual será possível ter dados estatísticos que vão permitir dirigir os investimentos, quando necessários, de uma forma mais adequada. O Tribunal de Ética de São Paulo serve de referência para o Brasil inteiro.

ConJur — O trabalho da OAB São Paulo precisa de continuidade ou de mudança?
Marcos da Costa —
Houve muitos ganhos com a gestão do presidente D’Urso, como na administração, onde houve uma mudança de paradigma. Nós saímos de uma situação financeira muito difícil, agravada pela Lei de Custas, aprovada no último dia útil do ano de 2003, e que entrou em vigor exatamente no dia de nossa posse, dia 1º de janeiro de 2004. E nós conseguimos muito avanços, tirando a Ordem de uma situação deficitária e entregando-a no final desse período com um superávit operacional, independentemente da diminuição inclusive do valor da anuidade que conseguimos alcançar ao longo do período. Houve ganhos no que diz respeito à defesa das prerrogativas profissionais, o advogado é mais respeitado, temos um melhor relacionamento com o Judiciário. Nós enfrentamos situações como poucas da história da Ordem, como a invasão dos escritórios de advocacia pela Polícia Federal, com mandados de busca genéricos, quebrando sigilos profissionais de advogados, não só para aquele cliente que estava sendo investigado, mas de todos os clientes do escritório. Houve reação da OAB-SP, com manifestação pública, medida judicial e ação junto ao Ministério da Justiça. Esse é um exemplo de que houve nesse período uma preocupação grande com as prerrogativas profissionais. Mas, evidentemente, se houve essa revolução administrativa, profissional, corporativa da entidade, essa revolução, como em qualquer outra organização, sempre está sujeita a melhorias. Outro avanço foi implantação do sistema de gestão de qualidade, a certificação pelo ISO 9001, que hoje atinge 99% da estrutura da Ordem, com uma melhoria sensível de todos os serviços prestados aos advogados, foi um grande ganho da gestão D’Urso, que não podemos perder. O próprio processo digital é algo novo que vai reclamar, evidentemente, daqui para frente, uma preocupação cada vez mais intensa por parte da Ordem e por parte da advocacia. Então, a própria dinâmica da sociedade e da advocacia já vai trazer novos desafios para os gestores da OAB daqui para frente.

ConJur — Então, vamos falar de outra eleição. Vai votar no presidente D’Urso para prefeito?
Marcos da Costa —
Se o D’Urso vier a ser candidato a prefeito de São Paulo, por conhecê-lo, pela sua ética e pela sua dedicação à causa pública, não teria dúvidas em quem votar.

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