Honorários advocatícios

Entidades se manifestam sobre defesa de Cachoeira

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30 de maio de 2012, 20h45

Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) entrou no ringue para a luta travada em torno da investigação dos honorários recebidos pagos ao criminalista e ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos pelo seu cliente Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. A ANPR emitiu nota de apoio a Manoel Pastana, procurador que propôs uma representação contra o advogado na Procuradoria da República em Goiás na última segunda-feira (28/5).

O Instituto dos Advogados de São Paulo também emitiu nota nesta quarta-feira (30/5), essa repudiando a atitude de Pastana. Segundo a nota, assinada pela presidente do instituto, Ivette Senise Ferreira, "descabe a alegação de que deveria ser fornecida obrigatoriamente ao acusado a defesa por parte do Estado, pois a relação é de escolha livre e de confiança".

A Ordem dos Advogados do Brasil já havia se posicionado ao lado de Thomaz Bastos. Na última terça-feira (29/5), o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, afirmou que "a partir do momento em que se imputa ao advogado a prática de crime por ele estar exercendo, dentro dos limites da lei, o direito de defesa, por óbvio se está a atentar contra as liberdades e contra o legal exercício de uma profissão, constitucionalmente protegida”.

O presidente da OAB paulista, Luiz Flávio Borges D’Urso, também saiu em defesa do ex-ministro. Antonio Ruiz Filho, presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB paulista, lembrou que o direito de defesa deve ser colocado no mesmo patamar da liberdade de imprensa. O criminalista Alberto Zacharias Toron, que iniciou a carreira no escritório de Thomas Bastos, também se mostrou indignado com a situação. 

A Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) divulgou nota sobre o caso. “Tal intento viola não apenas prerrogativa profissional do advogado, como os mais comezinhos princípios constitucionais que alicerçam o Estado Democrático de Direito, os quais garantem a todo e qualquer cidadão a presunção de inocência e o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório”, diz a nota.

Segundo ele, “medidas desvirtuadas e panfletárias como essa, que buscam intimidar e amordaçar a classe dos advogados, são típicas de estados totalitários e não são, e nunca serão, aceitas pelos cidadãos de nosso país, merecendo ostensivo e firme repúdio da advocacia e de todos os que acreditam que não é pela supressão dos meios de defesa dos acusados que se alcança a justiça”.

Agora, a ANPR sai em defesa do procurador, afirmando que a petição de Pastana “louva-se na aplicação da Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98), segundo a qual o recebimento de vultosa quantia de quem não tem renda lícita constitui crime de receptação culposa”.

Contrária aos argumentos de que a investigação dos recursos estimados em R$ 15 milhões representaria um cerceamento do direito a defesa, a associação encerra a nota explicando que sua postura “não representa, contudo, menosprezo à advocacia e ao exercício regular da ampla defesa e do contraditório, que os membros do Ministério Público Federal fazem questão de reverenciar como fundamental em um Estado de Direito”.

A assessoria de imprensa do próprio Pastana enviou uma nota à imprensa hoje, rebatendo as afirmações de que ele esteja tentando intimidar Thomaz Bastos ou cercear a defesa de Cachoeira. Pestana, diz a nota, quer apenas cumprir a Lei de Lavagem de Dinheiro, uma vez que "há indícios de crime de lavagem de dinheiro ou de receptação".

O questionamento sobre os honorários recebidos por Thomaz Bastos representa, segundo o procurador, "progresso no cumprimento da ordem jurídica".

Leia a nota de Pastana:
O Procurador Manoel Pastana, ao vislumbrar veracidade nas informações de que o advogado Márcio Thomaz Bastos teria cobrado R$ 15 milhões do acusado Carlinhos Cachoeira, para defendê-lo em processo criminal, que envolvem vários delitos, entre eles lavagem de dinheiro; por dever de ofício (art.236, inciso VII da LC 75/1993), representou para que seja apurada a origem dos recursos pagos a títulos de honorários.

O Dr. Pastana há quase duas décadas é procurador do Ministério Público Federal, atuando na área criminal; por isso, sabe que jamais conseguiria intimidar um advogado criminalista com a experiência de 60 anos. Ademais, nunca foi leviano e não tem interesse algum em prejudicar a defesa de quem quer que seja. Assim, causa espécie o tom da nota expedida pelo representado ao dizer: “Causa indignação, portanto, a tentativa leviana de intimidar o advogado, para cercear o direito de defesa de um cidadão.”

O exercício da advocacia não isenta o advogado, assim como qualquer profissional, de justificar que a renda recebida de seu trabalho provém de origem lícita. Não existe nenhum dispositivo legal que contemple o advogado com tal imunidade. Até porque, se houvesse, tornaria a Lei 9.613/98 (Lei de Lavagem de Dinheiro) letra morta, pois bastaria o criminoso celebrar um contrato milionário com o advogado. Este, sem ter que justificar a origem do dinheiro recebido a título de honorários, incluiria no seu patrimônio como renda lícita e, depois, poderia retornar mediante doação ao próprio infrator ou a quem ele indicasse. 

Dessa forma, longe de ser leviano ou de querer atrapalhar a defesa do cidadão Cachoeira, o Procurador Pastana tenciona apenas que a lei seja cumprida, pois como há indícios de crime de lavagem de dinheiro ou de receptação, uma vez que a Lei Penal, neste último caso, presume que o recebimento de vultosa quantia de quem não tem renda lícita constitui crime de receptação culposa, representou para que seja apurada a origem dos recursos.

Considerando que há presunção relativa de que o recebimento do dinheiro em tal situação constitui ilícito penal, basta que o representado prove que o recurso recebido no pagamento dos seus honorários não é de origem ilícita e o problema está resolvido. Isso porque o questionamento não diz respeito ao patrocínio advocatício, mas ao vultoso recurso vindo de quem não tem renda lícita para arcar com tal patrocínio. Se o pagamento foi realizado por terceiros, basta provar que os pagantes têm renda para tanto. 

Por fim, o fato de nunca ter sido questionado situação dessa natureza não impede que a lei seja cumprida neste caso, bem como não representa retrocesso, mas sim progresso no cumprimento da ordem jurídica. 

Leia a nota da ANPR:
"A ANPR vem a público manifestar apoio a seu associado, o procurador regional da República Manoel Pastana, que, ao vislumbrar verossimilhança nas informações de que o advogado Márcio Thomaz Bastos teria cobrado R$ 15 milhões do acusado Carlinhos Cachoeira, para defendê-lo em ação penal que lhe imputa vários delitos – entre eles lavagem de dinheiro -, apresentou petição ao MPF de Goiás para que seja apurada a origem dos recursos pagos a título de honorários.

A petição louva-se na aplicação da Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98), segundo a qual o recebimento de vultosa quantia de quem não tem renda lícita constitui crime de receptação culposa. É intuitivo que o advogado, assim como qualquer profissional, não está isento de justificar que a renda recebida de seu trabalho provém de origem lícita. Cuida-se de fazer com que a lei seja cumprida.

Vale lembrar que a análise da petição – de resto exercitável, também, como atributo da cidadania -, do ponto de vista de efetiva ação do Ministério Público Federal, caberá, a princípio, aos procuradores da República destinatários daquela, que detêm a inteira atribuição para agir como lhes parecer adequado sob o ditame da lei. Isto não representa, contudo, menosprezo à Advocacia e ao exercício regular da ampla defesa e do contraditório, que os membros do Ministério Público Federal fazem questão de reverenciar como fundamental em um Estado de Direito – tanto quanto o integral cumprimento da ordem jurídica."

Alexandre Camanho de Assis
Procurador Regional da República
Presidente da ANPR

Leia a nota do IASP:
Causa profunda preocupação a notícia de que um membro do Ministério Público Federal encaminhou pedido de investigação sobre a origem de dinheiro pago por alegado contraventor, em processo de repercussão nacional, a seu advogado. A alegação de que advogado não poderia receber honorários de seu cliente, acusado por suposta prática criminosa, não é nova, mas ganhou nova roupagem com a Lei de Lavagem de Dinheiro. No exterior o assunto já veio a tona em diversos países, questionando-se, justamente, o recebimento de honorários de origem suspeita.

O Instituto dos Advogados de São Paulo já debateu o tema em momento anterior e se posicionou pela garantia da ampla defesa e pela isenção do advogado em tais casos. Descabe a alegação de que deveria ser fornecida obrigatoriamente ao acusado a defesa por parte do Estado, pois a relação é de escolha livre e de confiança.

Tais predicados são alocados no contexto da ampla defesa, que não significa, simplesmente, a permissão de defesa técnica. A escolha dessa defesa, específica à realidade posta, é que é fundamental. A defensoria pública é competente, e disso ninguém duvida, mas ao réu deve caber, sempre, a possibilidade de escolha de seu patrono. As relações e situações cotidianas, como a do livre exercício profissional do advogado, por outro lado, não podem, de modo algum, ser confundidas com práticas criminosas. Trata-se, por assim dizer, de uma relação de adequação profissional, que escapa ao foco do Direito Penal. A defesa é escolhida e remunerada pelo seu trabalho, não podendo ser este confundido com suposto crime anterior, e ainda não provado, do acusado. 

Ivette Senise Ferreira
Presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP

Leia abaixo a nota da Aasp:

A Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) vem manifestar veemente repúdio contra a ignóbil tentativa de intimidar a advocacia, consubstanciada em representação elaborada por procurador da República buscando impedir um advogado de exercer livremente o seu nobre mister.

Segundo notícias amplamente divulgadas pela imprensa, pretende o representante do Ministério Público que a contratação do advogado Marcio Thomaz Bastos para exercer a defesa de um cidadão que se encontra sob investigação no âmbito penal seja considerada ilícita.

Tal intento viola não apenas prerrogativa profissional do advogado, como os mais comezinhos princípios constitucionais que alicerçam o Estado Democrático de Direito, os quais garantem a todo e qualquer cidadão a presunção de inocência e o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório.

Medidas desvirtuadas e panfletárias como essa, que buscam intimidar e amordaçar a classe dos advogados, são típicas de estados totalitários e não são, e nunca serão, aceitas pelos cidadãos de nosso país, merecendo ostensivo e firme repúdio da advocacia e de todos os que acreditam que não é pela supressão dos meios de defesa dos acusados que se alcança a justiça.

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